Investir melhor
A conta que ninguém te conta na liberdade financeira
Mas a vida real não é uma planilha. É uma sequência de escolhas, de imprevistos, de disciplina (ou falta dela). A matemática é só metade da equação. A outra metade está no comportamento

Yolanda Fordelone
Planejadora financeira com certificação CEA (Anbima), Yo Fordelone é formada em economia e jornalismo. Investidora qualificada, alcançou a sua independência financeira aos 36 anos. Em seu Instagram, ajuda outras pessoas a conseguirem mais tempo e liberdade.
Se você investir R$ 5 mil por mês a uma taxa de 10% ao ano, em 10 anos você terá R$ 1 milhão. Todo mundo já viu uma conta desse tipo circulando nas redes, uma fórmula simples e exata do passo a passo para chegar lá. Parece até uma receita de bolo.
A conta que ninguém te conta aparece na jornada da independência financeira e vai além dos números. Poupar R$ 5 mil por mês não é trivial. Mas nos anos até chegar à minha liberdade financeira, posso afirmar que o custo invisível pesou mais e envolveu estilo de vida, resiliência e muito comportamento.
Resolvi inaugurar a minha coluna falando justamente dessas “contas invisíveis” que quase nunca entram nas simulações, mas que determinam se o sonho de acumular patrimônio vira realidade ou não.
A primeira delas é a da inflação. Esse R$ 1 milhão do futuro, daqui a dez anos, não vai ter o mesmo valor que o R$ 1 milhão de hoje. Essa é uma verdade, mas também uma desculpa. Quem nunca se deparou com alguém que usa esse fato para falar que não adianta poupar e investir, afinal “lá na frente o dinheiro não vai valer nada”.
Se a inflação média for de 4% ao ano, o poder de compra do seu milhão será reduzido em cerca de 30%, para R$ 675 mil. Se a alta de preços for maior, de 6% ao ano, esse valor cai para cerca de R$ 558 mil de hoje (perda de quase 45%).
Ou seja, no futuro, o primeiro milhão comprará muito menos do que você imagina, mas ainda comprará algo. Algum poder de escolha você terá.
O melhor mesmo é colocar a inflação no cálculo. Ignorá-la é como subir uma escada rolante que desce: se você parar de andar, volta para trás.
A segunda conta é a da constância. A simulação assume que você vai investir, sem falhar, todos os meses ao longo de 10 anos.
Parece fácil na planilha, mas na vida real aparecem imprevistos: perda de emprego, emergências médicas, viagens, ou simplesmente desorganização. Pular alguns meses pode atrasar em anos a chegada ao tão sonhado milhão.
Se sair da rota, o importante é voltar o mais rápido possível para a estrada.
A terceira conta é a do comportamento nas crises. O cálculo mágico do R$ 1 milhão parte do pressuposto de que você vai segurar firme mesmo quando os mercados estiverem em queda. Sabemos que a economia vive de ciclos de alta e baixa. Quando nosso dinheiro está em jogo, porém, parece que ignoramos o processo.
O pânico é um inimigo poderoso. Vender na baixa ou seguindo alguma manada é um atalho para destruir anos de disciplina.
Por isso, não é só sobre saber investir — é sobre aguentar emocionalmente os solavancos do caminho e seguir firme na tese.
A quarta conta é a dos “juros invisíveis da vida”. A jornada pela liberdade financeira é longa e, na prática, a vida acontece. No meio do caminho podem surgir trocas de carro, viagens, tentações de consumo entre outros gastos.
Tudo isso parece inofensivo, mas são juros negativos que corroem sua capacidade de aportar. Muitas vezes, a pessoa até tem bons investimentos, mas nunca acumula de fato porque cada conquista financeira é imediatamente acompanhada de um novo gasto. Aliás, estilo de vida também entra na lista.
A quinta conta é a do padrão de vida que cresce junto com a renda. Esse é talvez o obstáculo mais silencioso. Quando você começa a ganhar mais, pensamos que vamos investir mais e acelerar o plano. Porém, a tendência natural é gastar mais.
Surge o apartamento maior, em um bairro melhor, o carro mais caro e o restaurante mais disputado. O problema é que, em vez de acelerar a corrida rumo à liberdade financeira, você cria “algemas de ouro”: um estilo de vida confortável demais para abrir mão, mas caro demais para sustentar sem continuar preso ao trabalho.
Essa conta é traiçoeira, porque não aparece em planilhas de investimento, mas aprisiona muita gente.
No fim, juntar R$ 1 milhão em 10 anos com 10% ao ano é matematicamente possível. A planilha mostra. Mas a vida real não é uma planilha. É uma sequência de escolhas, de imprevistos, de disciplina (ou falta dela). A matemática é só metade da equação. A outra metade está no comportamento.
E é justamente aí que mora a conta que ninguém te conta.
*As opiniões contidas nessa coluna não refletem necessariamente a opinião da B3
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