Por que a Hedge quer trazer investidores estrangeiros para o mercado de FIIs
Gestora tem trabalhado para incluir fundos imobiliários em índices globais de REITs
O mercado brasileiro de fundos imobiliários tem uma forte presença dos investidores pessoa física, que atualmente detém cerca de 75% do volume investido em FIIs. A facilidade no aporte, combinada ao apelo da renda constante (grande parte dos fundos distribui dividendos mensalmente) e o gosto dos investidores pelo mercado de imóveis são alguns dos fatores que ajudam a explicar isso.
Mas há uma movimentação nesse mercado para que isso comece a mudar. A gestora Hedge Investimentos quer colocar o Brasil no radar dos grandes investidores internacionais, ao trabalhar para incluir mais FIIs em índices globais de REITs — os Real Estate Investment Trusts, veículos que reúnem investimentos imobiliários ao redor do mundo. Em entrevista ao B3 Bora Investir, o diretor de distribuição Felipe Freitas e o analista Nicolas Correa explicam por que esse movimento pode profissionalizar o setor e aumentar a liquidez dos FIIs no país.
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Confira a entrevista completa:
Bora Investir: Os fundos imobiliários e os REITs têm algumas diferenças. Vocês tiveram que fazer alguma mudança, alguma adequação para que os fundos da Hedge fossem incluídos nos índices globais de REITs?
Nicolas Correa: Realmente, essa empreitada surgiu em 2023. Foi quando uma leva grande de fundos imobiliários começou a entrar nos índices da FTSE, que foi a primeira casa que reconheceu os FIIs como REITs mundialmente. Nessa leva, nosso maior fundo, o HGBS, entrou no FTSE Global Equity Index Series. E dessa forma a gente se questionou por que estava entrando, quais eram as premissas que precisávamos preencher para entrar em índices internacionais. A gente foi investigando mais e percebeu que, naquele momento, só a FTSE reconhecia os FIIs brasileiros como REITs.
Bora Investir: E as outras casas de índices?
Nicolas Correa: Então a gente começou a procurar as outras casas que realmente não reconheciam os FIIs como REITs, e entender por que não reconheciam. As três maiores do mercado são a FTSE, a S&P e a MSCI. Fizemos contato com S&P e MSCI e fomos entender que houve interpretações não tão aprofundadas no passado que deixou os FIIs de fora. Desde 2023 até agora, trabalhamos com essas duas casas, fazendo um trabalho de consultoria para que entendessem a parte regulatória e operacional dos FIIs, para traçar paralelos para que vissem que se fazia sentido identificar os FIIs como REITs tanto nos índices da MSCI quanto do S&P.
Bora Investir: Então não foi necessário fazer nenhuma mudança nos fundos aqui? Foi só uma conversa para mostrar os processos e similaridades?
Felipe Freitas: Cada país tem sua estrutura regulatória, e há muitos veículos de investimento em imóveis, com características diferentes. No nosso caso, os fundos compram imóveis ou títulos de dívida que estão ligados ao setor imobiliário diretamente. Lá fora, os REITs se assemelham a empresas. Então, têm uma estrutura um pouco mais sofisticada. O problema aqui no Brasil não era que nossos fundos não se enquadravam em critérios objetivos. O que acontecia é que a nossa indústria era interpretada por eles como closed-end funds, ou seja, fundos fechados, e não eram classificados como fundos de natureza imobiliária.
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Nosso trabalho inicial foi esclarecer que a indústria brasileira de fundos imobiliários tem muitas semelhanças com a deles. Portanto, deveria ser considerada investível dentro de um índice global que busca ter investimentos em imóveis ao redor do mundo. Há índices globais, com participação de vários países, e o Brasil acabava ficando de fora. Quando conseguimos mudar a classificação, o Hedge Brasil Shopping passou a ser enquadrado para participar.
Nicolas Correa: Esse ponto é excelente porque, nesse meio tempo, entre sermos aceitos como REIT pela S&P e MSCI, já tínhamos essa conversa com a FTSE. Em 2023, entramos no Global Equity Index da FTSE, que inclui todas as equities. Os REITs são uma subclasse ali. Só que esse índice inclui também empresas ligadas ao setor imobiliário.
Bora Investir: E como eles olhavam os FIIs?
Felipe Freitas: Eles olhavam o fundo imobiliário da mesma forma que olhavam uma empresa. Isso não significa que ele não possa entrar — ele pode estar nos dois índices. A questão não era tirar o fundo do índice de equities, mas sim permitir que também fosse reconhecido como REIT. Porque faz sentido se enquadrar nos dois.
Bora Investir: E qual foi a solução?
Felipe Freitas: A gente percebeu que, como indústria, não estávamos fazendo o dever de casa de transmitir as informações em inglês. Então traduzimos tudo: demonstrativos financeiros auditados, site, relatórios, documentos do fundo. E mais, fizemos uma divisão de receita e de custos para mostrar que a receita do FII era realmente imobiliária. Alguns fundos compram cotas de outros FIIs, e a receita pode parecer financeira, mas é imobiliária. Então tivemos que fazer essa modificação para que isso ficasse claro.
Bora Investir: Qual a importância de ter mais FIIs, além do HGBS, em índices globais de REITs? Como vocês estão buscando engajar outras gestoras?
Felipe Freitas: A gente acha que isso não deve ser uma vantagem exclusiva nossa, mas algo que beneficie o setor inteiro. Mesmo compartilhando, muitos ainda não conseguiram entrar. Participamos de uma série de eventos organizados pela própria FTSE, pela S&P e pela XP. Nosso público nesses eventos eram outras gestoras. Fizemos apresentações explicando o procedimento, o passo a passo, para que eles também pudessem entrar no índice.
Bora Investir: Por que isso é importante para vocês?
Felipe Freitas: Porque não tem tanto valor ser o único fundo brasileiro no índice. O investidor estrangeiro precisa enxergar a nossa indústria como um todo. Quanto mais fundos brasileiros estiverem nesse esforço, mais o Brasil entra no radar internacional, e maior o volume de recursos que conseguimos atrair. Forma-se uma massa crítica. Acredita que vamos captar mais investimento no nosso fundo se tiver mais gente junto.
Bora Investir: Quais as vantagens de atrair mais investidores estrangeiros para o mercado de FIIs?
Nicolas Correa: Uma vantagem seria a profissionalização do mercado. O mercado de FIIs sempre foi estruturado ao redor das pessoas físicas. Mas como a pessoa física vê como um produto de renda, às vezes esquece o fundamento em alguns momentos do mercado. Quando você inclui os investidores institucionais, eles conseguem dar liquidez e fazer arbitragem em um mercado que não está arbitrado hoje em dia. Assim, pode fazer os preços refletirem razoavelmente melhor o preço real de um ativo imobiliário, do que está sendo precificado hoje.
A gente acha que esse ponto pode ser bem interessante. Primeiro entrariam os estrangeiros, mas um player muito importante que hoje não atua nesse mercado, que poderia começar a atuar são multimercados, Family offices, outros institucionais do Brasil que podem ver esse movimento dos estrangeiros como atrativo também para entrarem. E aumentaria ainda mais a liquidez. A liquidez é muito importante para o segmento.
Bora Investir: Desde que o HGBS entrou no índice global de REITs, houve mudanças como aumento de liquidez ou maior interesse dos estrangeiros?
Felipe Freitas: Sim. Existem dois impactos: o passivo e o ativo. O passivo é que entrou um novo investidor representativo — os gestores de ETF. Mas pegamos uma janela de mercado em que o dólar e as cotações não estavam tão atrativos, então o volume também não foi gritante, mas houve um impacto passivo.
Bora Investir: E o impacto ativo?
Felipe Freitas: Estamos fazendo uma prospecção ativa de investidores internacionais. Nos associamos às principais entidades estrangeiras. Viramos membros da Nareit, a associação norte-americana de REITs. Somos o único membro brasileiro. Vamos participar do congresso deles em Nova York este ano, com apresentação do HGBS. Também vamos nos associar à EPRA, associação europeia de real estate, e vamos ao congresso deles em Estocolmo, em setembro, participar de um painel junto com outros investidores de mercados emergentes.
Bora Investir: Qual a participação de outros mercados emergentes em índices globais de investimento imobiliário?
Nicolas Correa: Quando olhamos o benchmarking, vemos muitos mercados menores que o Brasil recebendo mais investimento estrangeiro — como Arábia Saudita, México, Chile. E o Brasil, que é maior, com mais massa crítica, ainda fica para trás.
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