B3 traça estratégia para 2026 com foco em crescimento e diversificação
Perspectiva de redução de juros no Brasil, junto com realocação de investimentos globais em direção a mercados emergentes, pode favorecer a companhia
O ano de 2025 foi marcado por sucessivos recordes do Ibovespa B3, mesmo com a taxa Selic em 15% ao ano. Agora, com a perspectiva de redução da taxa básica de juros e um mercado de capitais mais maduro no Brasil, a B3 vê novas oportunidades para acelerar seu crescimento. Em evento realizado com investidores nesta terça-feira (16), os executivos da companhia detalharam sua visão para o futuro.
A estratégia para 2026 se resume a duas grandes vertentes: aproveitar os negócios pró-cíclicos, explorando o momento macroeconômico possivelmente mais favorável à renda variável, e fortalecer os negócios recorrentes.
Nos últimos dez anos, reforçou Gilson Finkelsztain, CEO da B3, tanto os negócios pró-cíclicos quanto os recorrentes apresentaram taxas de crescimento semelhantes, com avanço médio anualizado de 11%, “embora com comportamentos distintos em relação aos ciclos econômicos”.
“Nossa visão estratégica não mudou. Continuamos trabalhando para fortalecer e maximizar o core business e diversificar em atividades no entorno”, afirmou Finkelsztain. “O mercado de capitais no Brasil tem um potencial muito grande, seja em renda variável, renda fixa ou balcão”.
Negócios pró-cíclicos: preparação para o próximo ciclo
Os negócios pró-cíclicos, explica Gilson, são aqueles mais sensíveis às taxas de juros. “Quando falamos do mercado de renda variável, temos uma sensibilidade negativa à taxa de juros. É o mercado que que tem mais sensibilidade aos períodos de juros elevados no Brasil – e o que mais cresce em ciclos de afrouxamento monetário”, destaca o CEO.
A estratégia para esse segmento é se antecipar ao próximo ciclo de queda de juros. “Nosso desafio é garantir que continuemos a inovar para estarmos preparados para a mudança de cenário”, diz Finkelsztain. Segundo ele, isso passa por investimentos em tecnologia, fomento à liquidez e revisão de tarifação. “O objetivo é nos anteciparmos ao ciclo para ter todos os produtos já implementados e funcionando”.
Negócios recorrentes: resiliência e expansão
Os negócios recorrentes, afirma Gilson, são fundamentais para dar estabilidade à companhia em cenários desafiadores. São segmentos que “apresentam crescimento constante, de dois dígitos ao ano desde 2012, independentemente do cenário de taxa de juros”, explica Finkelsztain.
“Os negócios recorrentes apresentam crescimento constante e dão resiliência ao negócio em momentos de mercado contracíclico”, afirma. Para os próximos anos, a meta é ampliar esse peso: buscar novas fontes de receita recorrentes e expandir as existentes. “Quanto mais a gente conseguir colocar de receita recorrente no todo da companhia, menos expostos ficamos à taxa de juros”, resume o CEO.
Análise de sensibilidade aponta potencial de crescimento no mercado de ações
Gilson Finkelsztain apresentou também um exercício de análise de sensibilidade para avaliar possíveis cenários de evolução no mercado de renda variável, considerando dados atuais e a movimentação de indicadores. Segundo o estudo, pequenas mudanças no cenário poderiam gerar avanços relevantes no volume médio diário de negociações (ADTV) entre investidores pessoa física, estrangeiros e institucionais locais – perfis que, juntos, respondem por cerca de 70% das operações nesse mercado.
Atualmente, o volume médio diário (ADTV) do investidor pessoa física na B3 é de R$ 3 bilhões, com 30% de engajamento e um valor médio por CPF de R$ 1,8 mil. Se o ADTV por CPF subisse para R$ 3 mil, o ADTV alcançaria R$ 4,9 bilhões.
Entre investidores estrangeiros, Gilson destaca que a alocação em ações brasileiras está em um patamar historicamente baixo. “O investidor estrangeiro vai ser bem relevante. Existe uma agenda clara de flexibilização monetária lá fora, aliada ao enfraquecimento do dólar”, disse.
Já no caso dos investidores institucionais locais, as taxas de juros elevadas vêm impactando fundos de ações e multimercados há anos. Uma mudança de ciclo de juros, com investidores voltando a alocar nos multimercados e fundos de ações, pode trazer capital novo para o mercado de renda variável. Assim, a maior alocação em ações por parte dos fundos locais também pode representar aumento significativo no volume de negócios em produtos de renda variável.
Esse aumento do volume negociado pelos três diferentes perfis de investidor (pessoa física, estrangeiros e institucionais) tende a acontecer em conjunto, diz Gilson. “O ADTV, atualmente de R$ 24,6 bilhões, tem um potencial muito grande de passar por mudanças significativas. É muito provável que o ADTV da companhia, no momento dessa conjuntura mais favorável, suba de R$ 25 bilhões não para R$ 27 bilhões, e sim em direção a R$ 50, R$ 60, R$ 70 bilhões”.
Tokenizadora B3
Outro tema de destaque no B3 Day foi a tecnologia. Segundo Viviane Basso, vice-presidente de Operações na B3, toda a companhia tem passado por um processo de modernização em suas infraestruturas. “A gente tem implementado inteligência artificial e estamos trabalhando conceitos de uso de DLT [Distributed Ledger Technology, a tecnologia por trás do blockchain] e tokenização”, afirmou.
“Muito se ouviu que essas tecnologias iriam substituir nossas atividades, mas não foi o que vimos. Nesse momento, trabalhamos com ativos tokenizados em paralelo com a chamada trad-fi [finanças tradicionais], até chegarmos num ponto com a tecnologia totalmente tokenizada”, completou.
Luiz Masagão, vice-presidente de Produtos e Clientes da B3, completou que em 2026 a B3 deve lançar uma tokenizadora para ativos tradicionais – a começar pelo mercado de ações. Um ponto importante da solução é a possibilidade de convivência entre os ecossistemas tradicionais de negociação de ativos com o ecossistema tokenizado. “Grande valor da gente ter essa tokenizadora conectada com o ecossistema tradicional é que ativos são fungíveis”, disse. Isso garante liquidez para os ativos tokenizados e fluidez para os participantes. “O comprador de token não vai saber que está comprando de um vendedor de ação tradicional. Isso permite uma transição suave, com os dois usufruindo da mesma liquidez”.
Um ponto enfatizado por Masagão foi a importância da colaboração entre B3 e outros participantes do mercado para construir soluções baseadas na tecnologia. “Nós vamos trabalhar alguns casos de uso, mas o principal valor é criar uma plataforma para que fintechs e outras instituições utilizem nossa infraestrutura para desenvolver inovação”, afirmou Masagão.
“Também vamos lançar uma stablecoin da B3, que será uma ferramenta viabilizadora da negociação em tokens”, completou.
Novos produtos e contratos de eventos
Masagão também falou sobre a aceleração da agenda de lançamento de novos produtos financeiros. Em 2025, foram 19 lançamentos em derivativos pela companhia. Para o pipeline 2026/2027, estão previstos 22 produtos como opções semanais com vencimento diário de dólar, Ethereum e Solana, além de contratos futuros de petróleo, opções semanais de Bitcoin em dólar, entre outros.
Um dos principais lançamentos previstos são os Contratos de Eventos. A B3 já conta, há seis anos, com as opções de Copom, contratos em que os investidores podem se posicionar sobre se esperam uma manutenção, aumento ou redução dos juros pela autoridade monetária. “Lançamos nessa segunda-feira mais três contratos de eventos: [sobre decisões de política monetária do] Fed, Banco do México e Banco Central Europeu”, contou Masagão.
A expectativa agora é ampliar escopo de contrato de eventos financeiros, com contratos sobre preço de fechamento de Bitcoin, Ethereum, Solana, dólar e Ibovespa B3. Há ainda a perspectiva de criar contratos de eventos sobre dados macroeconômicos (IPCA mensal e PIB). “Esses produtos já foram submetidos à CVM para aprovação”, afirmou o vice-presidente.
“Acompanhamos o que está acontecendo nos mercados internacionais e estamos em conversas muito próximas com o regulador e com participantes para entender qual vai ser o futuro desse mercado e se esse ele vai se desenvolver no Brasil”, completou.
Evolução dos mercados de ETFs, BDRs e FIIs
Outra avenida de crescimento esperada para os próximos anos é em produtos como ETFs, BDRs e FIIs. “No ano de 2025, tivemos uma consolidação do mercado de ETFs. Foram mais de 60 novos ETFs listados, mais de 1 por semana”, disse Masagão. “Nosso foco era ampliar as classes de ativos que podiam ser negociados via ETF. Queríamos que consultores e alocadores conseguissem construir carteiras de seus clientes em diferentes classes via ETF”, disse o vice-presidente.
Novas listagens e agenda de IPOs
Viviane Basso, vice-presidente de Operações na B3, destacou que, mesmo no desafiador contexto macroeconômico dos últimos anos, a empresa tem trabalhado em produtos e experiencia tanto para PMEs como para grandes empresas. “Vemos hoje mil empresas com potencial para listagem, sendo que 54 são companhias que já possuem registro e estão aguardando o momento mais propício para realização dos IPOs”, afirmou Viviane.
Ela afirmou ainda o novo regime regulatório da CVM, o FÁCIL. “Esse regime cria novas regras que tornam o processo de listagem mais barato e mais fácil. A B3 está 100% preparada para o início desse novo regime, com sistemas, processos e times adequados e em conversas com algumas companhias”, disse.