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Selic precisa subir? Veja os argumentos a favor e contra

Copom se reúne na próxima semana para determinar a Selic

A partir de amanhã, o Comitê de Política Monetária (Copom) se reunirá em um cenário de incertezas e expectativas. O filme é o seguinte: o comitê iniciou em agosto do ano passado um movimento de afrouxamento monetário, que levou a Selic de 13,75% para 10,50% nesse ano. Os cortes foram pausados nas últimas reuniões, em junho e julho. Agora, no entanto, o mercado e os próprios dirigentes do Copom levantam a possibilidade de um novo ciclo de altas ser necessário. A decisão será anunciada na quarta-feira (18/09), mesmo dia em que o Fed toma sua decisão sobre a taxa de juros nos EUA.

Mas o que mudou no cenário da última reunião até agora que explica essa necessidade de novo aperto? O Bora Investir conversou com economistas para entender. Confira os argumentos:

Atividade econômica aquecida

Para Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos, o crescimento forte da demanda interna é um vetor significativo de inflação. No início de setembro, o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre surpreendeu ao mostrar crescimento de 1,4% – acima da mediana das estimativas, que indicava uma elevação de 0,9%, e perto do teto das projeções de analistas, que iam de 0,4% a 1,6%.

“A principal mensagem do PIB é que a demanda interna está muito aquecida”, explica Sobral. Segundo ele, tanto o consumo das famílias e o gasto do governo têm impulsionado o crescimento a um nível incompatível com a queda da inflação.

Outro indicador que aponta uma economia mais forte e que pode pressionar a inflação para cima é o desemprego, que está no menor patamar da última década. Quando o desemprego está baixo, há maior demanda por bens e serviços, o que pode pressionar os preços para cima, alimentando a inflação.

Nesse sentido, se o Copom optasse por uma elevação da taxa Selic, estaria mostrando uma postura pró-ativa no combate à inflação.

Expectativas ainda desancoradas

A desancoragem das expectativas de inflação é um dos argumentos mais fortes para aqueles que defendem uma alta da Selic, destaca Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital. “As expectativas seguem desancoradas, o que tem sido um desconforto para o Banco Central”, afirma Damico. Apesar de haver sinais de uma inflexão nas projeções de inflação de mais longo prazo nos últimos meses, ela destaca que o BC continua observando o comportamento das expectativas com cautela.

Na última segunda-feira (09/09), a mediana das expectativas dos analistas ouvidos pelo relatório Focus indicava uma inflação de 3,92% em 2025 e de 3,60% em 2026 – ambos acima do centro da meta, de 3%.

O modelo do BC

Para Andrea Damico, um dos fortes argumentos contra a elevação da Selic é justamente o modelo do Banco Central para o horizonte relevante, que é do início de 2026. “[Na última reunião,] o BC divulgou, no cenário que tem juros estáveis, uma projeção de inflação de 3,2% e disse que está acima da meta [de 3%]”, diz ela.

“O que a gente viu da comunicação depois, principalmente pelo Galípolo, é que 3,1% seria considerado ‘ao redor da meta’. E geralmente, quanto a projeção indica uma inflação ao redor da meta, a autoridade monetária não mexe na política monetária”, afirma a economista. “É uma linha muito tênue, está muito próximo, se estivesse 3,4% ou 3,5%, ninguém teria dúvida de que tem que subir”.

Ainda segundo ela, mesmo atualizando o modelo do BC com as novidades desde a última reunião – como o fortalecimento do dólar e a surpresa positiva do PIB – há um componente que compensa esses fatores: os preços das commodities. “O petróleo caiu mais de 10% entre uma reunião e outra, e isso tem um peso grande na inflação pelo modelo do BC”, diz.

Inflação corrente

A avaliação de economistas sobre os dados correntes de inflação é mista. Em agosto, o IPCA mostrou uma leve deflação de 0,02%.

Para Andrea Damico, o cenário de inflação corrente é mais favorável do que o esperado. aponta que o IPCA mais recente veio melhor, o que poderia dar ao BC uma margem para manter a Selic inalterada. Ou seja, ainda que exista um possível risco de maior inflação por causa do mercado de trabalho apertado e economia aquecida, esse risco não está se materializando, pelo menos por enquanto.

Sobral, no entanto, discorda que esse alívio seja sustentável. Ele menciona que a queda nos preços de alimentos e nas tarifas de energia elétrica foram fatores temporários, que não se repetirão nos próximos meses. “A energia elétrica já reverte em setembro”, alerta ele, com a determinação da bandeira vermelha de energia.

Além disso, Sobral argumenta que a inflação de serviços, um componente sensível à política monetária, continua elevada e acelerando. “Estamos vendo a inflação de serviços rodar a 5% nos últimos 12 meses, o que é bem alto”, completa.

Troca de comando no Banco Central

O mandato do atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, se encerra no fim deste ano, e o governo já indicou Gabriel Galípolo como seu sucessor. Embora a nomeação ainda precise passar pelo crivo do Congresso, muito se especula que ele esteja buscando uma elevação da Selic para conquistar credibilidade no mercado.

E desde a última reunião, o dirigente tem adotado um tom mais duro em suas falas. “Galípolo se posicionou de forma mais dura e acabou se colocando numa situação que o mercado precificou, e agora vai ser difícil voltar atrás”, diz Marco Bismarchi, da TAG Investimentos. Ou seja, agora, que a maior parte do mercado acredita na alta, uma manutenção da taxa poderia assustar.

Sobral sugere que a decisão de elevar os juros já estava, em parte, precificada: “No início parecia que o principal elemento por trás da alta era uma tentativa do novo presidente ganhar um pouco de credibilidade, mas depois ficou mais consensual.”

Possível apreciação do real

Um fator que pode influenciar a decisão do Copom são as perspectivas para o câmbio. E a relação entre real e dólar pode mudar justamente por causa das decisões de política monetária da próxima semana.

Isso porque, se confirmado o movimento para cima da Selic e para baixo dos juros nos EUA, aumenta o diferencial de juros entre os dois países – o que tende a atrair investimentos para cá.

“A gente está vendo o real voltando a ser de longe a moeda que mais paga juros no mundo”, comenta Sobral. Embora essa apreciação ainda não tenha se materializado, ele sugere que, caso aconteça, poderia facilitar o trabalho do Banco Central no controle da inflação.

Para Bismarchi, isso pode ser um importante vetor de desinflação no Brasil e pode fazer com que, mesmo confirmado o ciclo de elevação da Selic, o movimento seja mais sutil.

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