Devo resgatar meu título do Tesouro Direto com prejuízo e reinvestir?
Entenda a marcação a mercado e saiba como gerenciar seus investimentos no Tesouro Direto
Que atire a primeira pedra quem nunca se surpreendeu ao descobrir que a renda fixa, na verdade, varia. Muitos investidores se assustam ao entrar no aplicativo de seu banco ou corretora e ver que um título do Tesouro Direto ou outro ativo de crédito está registrado com prejuízos. Isso acontece por causa da marcação a mercado (você vai ler mais sobre isso à frente). Mesmo depois de entender esse mecanismo, ainda pode ficar a dúvida: o que fazer com o título comprado no passado que está dando prejuízo hoje? O Bora Investir conversou com especialistas para explicar. Confira!
Diferentes tipos de renda fixa
Um dos pontos principais para se entender a marcação a mercado é saber que existem diferentes tipos de renda fixa. São três modelos principais:
– Os pós-fixados, que acompanham algum índice de mercado (os mais comuns são CDI e Selic). Você verá esses investimentos com uma notação como: 100% do CDI, CDI+3% ao ano, 97% do CDI.
– Os prefixados, que já informam ao investidor, antes mesmo da compra do título, qual será o rendimento, por exemplo, 9% ao ano.
– Os híbridos, que têm uma parcela prefixada e uma pós-fixada. Geralmente, eles acompanham algum índice de inflação (como o IPCA) na taxa pós-fixada, e oferecem uma rentabilidade prefixada além desse indicador. Você verá esses títulos com notações como: IPCA + 5% ao ano, IPCA + 6,5% ao ano.
A renda fixa varia: entenda a marcação a mercado
A renda oferecida pelo emissor no momento em que o título é criado não muda e será paga ao final do contrato de renda fixa, mas o preço do título pode mudar até o seu vencimento. Fica mais fácil entender usando como exemplo os títulos prefixados do Tesouro Direto.
Os títulos prefixados do Tesouro são desenhados de forma a pagar, no vencimento, R$ 1.000 por unidade. Na data de hoje (10/07/2024), um título prefixado no Tesouro Direto com vencimento para 01/01/2027 oferece a rentabilidade de 11,26% ao ano. Assim, o preço do título hoje é calculado a partir dessas duas variáveis: qual o valor que, atualizado por essa taxa para esse prazo, resulta em R$ 1.000 no vencimento. Esse preço (também considerando o dia de hoje) é de R$ 768,46. Ou seja: quem comprar esse título receberá, no vencimento, o valor de R$ 768,46 mais uma taxa de juros de 11,26% ao ano, o que resulta em R$ 1.000 na data de vencimento.
Vale dizer que esses títulos sempre valem R$ 1.000 por unidade, na data do vencimento. A taxa de 11,26% é calculada de acordo com o que o mercado demanda a cada dia, para esse prazo. No entanto, as condições de mercado podem mudar. Suponhamos que daqui a uma semana, o mercado demanda uma taxa mais alta para esse prazo, de 13%. O título comprado hoje ainda valerá, no dia 01/01/2027, os mesmos R$ 1.000 acordados no momento da compra. Mas se o investidor que comprou esse título hoje quiser vendê-lo na semana que vem, terá de ir para o chamado mercado secundário, e vender seu título a outro investidor.
Acontece que, na semana que vem, esse outro investidor está demandando uma rentabilidade maior, de 13%. Esse “ajuste” necessário na taxa vem no preço do título, que acaba se desvalorizando em relação ao preço pago na data de entrada.
O contrário também é verdadeiro: se a taxa de mercado cair a 9%, o título irá se apreciar e pode ser vendido no mercado secundário com ágio.
A regra de ouro aqui é: quando as taxas sobem, o preço dos títulos cai. E quando as taxas caem, o preço dos títulos sobe.
Essa variação no preço dos títulos é a chamada marcação a mercado. As oscilações são maiores justamente nos títulos que têm uma taxa prefixada, sejam os prefixados puros ou os híbridos. Outro ponto importante é que quanto mais longe o vencimento do título, mais fortes são as oscilações.
Atualmente, os preços dos títulos de renda fixa que os investidores têm em suas carteiras aparecem nos aplicativos de investimentos pela marcação a mercado. Por isso, é possível entrar e ver um título de renda fixa com variação negativa.
Isso não quer dizer, entretanto, que o investidor está com prejuízo, necessariamente. Se ele mantiver em carteira o papel, receberá exatamente a rentabilidade prometida no momento da compra.
Devo vender meu título do Tesouro Direto com prejuízo?
Entrar no aplicativo de investimentos e ver alguns de seus títulos negociados abaixo do que você pagou por eles não é razão de desespero. Atualmente, as taxas prefixadas oferecidas no Tesouro Direto estão acima da média histórica, e muitos investidores que fizeram aportes no começo do ano, quando as taxas estavam mais baixas, podem estar nessa situação. Antes de vendê-los e realizar o prejuízo, é preciso avaliar o momento de mercado.
“O deságio significa que a venda ocorrerá com um preço menor, logo o investidor vendedor terá perda de juros e possivelmente de principal. Essa estratégia só seria factível numa emergência ou se a perspectiva for de uma alta ainda maior da Selic (ou seja, a perspectiva é que o título perca ainda mais valor no futuro) e o deságio for pequeno”, diz Elaine Borges, professora doutora de Finanças da USP.
Luciana Ikedo, planejadora financeira CFP, explica que é preciso fazer alguns cálculos para tomar essa decisão. Em primeiro lugar, é preciso avaliar qual o prejuízo e qual o valor que você teria se vendesse o título hoje. Depois disso, precisa calcular qual seria o valor total a ser resgatado no futuro, com a taxa oferecida hoje.
Assim, o investidor entende qual seria o ganho efetivo se fizesse essa troca. “Por exemplo, digamos que eu tenho um título com vencimento em 2030 que, para trazer a valor presente, de imediato, já tenho um prejuízo de R$ 2 mil. Mas, comprando o novo título, com uma taxa nova, de repente eu vou ter um ganho adicional R$ 5 mil em relação ao anterior”, explica.
No entanto, a planejadora alerta que, dada sua experiência recente, a troca não tem valido a pena para os investidores. “Às vezes o lado emocional fica baqueado, porque o investidor de renda fixa, na maioria das vezes, não está preparado para ver sua conta negativa”, comenta.
Isso enfatiza ainda mais, segundo ela, a importância de entender os objetivos de longo prazo da carteira. “Muitas vezes a pessoa faz uma conta e vê que, considerando a inflação acumulada nos últimos 12 meses, os rendimentos dos títulos IPCA+ ficaram abaixo do que se teria se estivesse com 100% do CDI”, diz ela. “Mas é preciso olhar a perspectiva do horizonte, e não só o olhar do retrovisor. É preciso fazer uma projeção do cenário, olhar quais são as tendências para frente”.
E vender com ágio, vale a pena?
Se, por outro lado, a taxa de mercado atual estiver menor do que a contratada e o título estiver sendo negociado no mercado secundário, vale a pena vender? “Tudo vai depender da sua perspectiva. Se você acredita que a taxa de juros não vai cair mais, é hora de vender sim para aproveitar o ágio”, diz Elaine Borges. “Agora se a perspectiva e de continuação da queda da taxa, vale esperar mais um pouco”.
“Mas toda vez que a taxa de juros cair e houver a oportunidade de vender um título de renda fixa com ágio, essa é a melhor decisão, pois você está incrementando sua rentabilidade dadas as condições de mercado. E essa oportunidade pode sumir de uma hora pra outra se o mercado se inverter”, diz Elaine.
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