Elas optaram pelo divórcio e contam como ajustaram suas finanças
Veja três casos de mulheres que resolveram enfrentar uma separação, como elas reorganizaram o orçamento e o que têm a ensinar para quem passa pela mesma situação
Por Marília Almeida
Em 2021, último dado divulgado pelo IBGE, o número de divórcios judiciais concedidos em 1ª instância ou por escrituras extrajudiciais chegou a 386,8 mil, um crescimento de 16,8% frente a 2020, em plena pandemia. Foi o maior aumento percentual em relação ao ano anterior desde 2011 (45,4%). Segundo o IBGE, há dificuldade em coletar os dados. Portanto, é bem capaz de que ele esteja subestimado.
De 2010 para 2021, o tempo médio entre a data do casamento e a data da sentença ou escritura do divórcio caiu de 15,9 para 13,6 anos. Em relação ao tipo de arranjo familiar, a maior proporção (48,5%) das dissoluções ocorreu entre casais com filhos menores de idade. Em comparação a 2010, esse número cresceu 5,5 pontos percentuais.
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Uma separação nunca é confortável, ainda mais quando envolve filhos. E, definitivamente, não é uma decisão simples, porque na maioria das vezes diminui o padrão de vida da família. A estimativa é que o fim de um casamento reduza em até 70% a renda mensal.
Diante da diferença salarial existente entre homens e mulheres no país (elas ganham 22% menos, segundo o IBGE), e geralmente maior responsabilidade com o cuidado com filhos, são elas que costumam sofrer mais com as consequências financeiras de uma separação.
Veja abaixo três casos de mulheres que resolveram encarar o divórcio, como elas reorganizaram suas finanças e o que têm a ensinar para quem passa pela mesma situação:
Ajuste de finanças após um rompimento inesperado
O padrão de vida da arquiteta Carol Degen, 51 anos, mudou completamente após o divórcio. Antes, a família tinha uma renda mensal extremamente confortável para o sustento da família, mas a renda de seu ex-marido representava 90% do orçamento. Além disto, seu ex-marido contava com bônus semestrais que permitiam viagens luxuosas e custos extras de lazer. Ela era responsável apenas por controlar as finanças da casa, mas não as extraordinárias.
Para piorar o cenário, a separação aconteceu de uma forma muito inesperada, causada por uma avalanche de informações que apontavam que o rompimento seria inevitável. Contudo, o fato de viver numa vida de extremo conforto e contribuir financeiramente apenas com 10% a incomodava. Para viver em paz, ela sempre havia pensado em um plano B. Na hora da separação, seu maior desafio foi, portanto, transformar o plano B em realidade.
Uma vez que o plano se baseava em abrir mão do seu conforto e criar um novo padrão de vida fundamentado apenas na sua renda financeira, ele transformaria muito não só a sua vida, como a vida dos seus 3 filhos, enquanto estivessem com ela. “Hoje, considero que precisei ter muita coragem para executar tudo isto”.
Degen considero que o seu plano B foi justo. “Eu assumi que o casamento era desequilibrado financeiramente e que, com o divórcio, a minha vida não seguiria no mesmo padrão. Como consequência, os acordos foram viáveis e os custos para isto, dentro do esperado”.
Após a separação, a arquiteta passou a receber pensão, pois seus filhos foram morar com ela. Hoje, cada um deles contribui proporcionalmente com as despesas da casa. “Eles passaram a ter realidades bem diferentes entre a vida com a mãe e a vida com o pai, mas eu considero que isto foi uma oportunidade de aprendizado. Elevou a consciência deles sobre como a vida é de verdade”.
A solução para encarar a mudança foi organizar, em planilhas e mais planilhas, as entradas garantidas e as eventuais – uma vez que a renda do seu trabalho é inconstante, bem como as saídas, de forma a chegar numa boa solução. “Após a separação eu precisei encaixar tudo nas minhas planilhas de forma detalhada, sem deixar passar nada, para que a conta desse certo no final”.
Nesse processo, Degen é grata às pessoas que considera seu time de apoio, que inclui advogados, clientes e consultores financeiros. “Todos se tornaram meus verdadeiros amigos. Sem eles, eu não teria conseguido”.
Ajuste de finanças após um término planejado
Vitória (nome fictício) se separou aos 45 anos quando sua filha tinha 5. A decisão foi planejada. “Não houve um acontecimento único. O relacionamento estava desgastado e enxerguei que não era mais feliz”.
Portanto, as eventuais dificuldades financeiras que teria foram bem analisadas. “Eu teria de sair da casa onde morava, além de enfrentar toda dificuldade de cuidar da minha filha sozinha. Essa preparação, até mesmo psicológica, foi benéfica inclusive financeiramente”.
Desde muito cedo trabalhando como empresária, Vitória tinha uma carreira, sua própria empresa e investimentos e patrimônio que geravam rendimentos. “Sabia que teria de trabalhar e me dedicar mais para manter o meu padrão de vida, e encarei isso. Mas eu já arcava sozinha com gastos de lazer com a minha filha há muito tempo. Então, não foi difícil incluir algumas contas no orçamento”.
A negociação da pensão foi “muito difícil”. “Não foi um divórcio litigioso, mas tive de ter muitas reuniões, e foi bastante desgastante”. No final, ela conseguiu garantir a participação do pai nos custos de escola da sua filha e do condomínio onde vivem. “Obtive um valor que era equivalente ao que ele contribuía em casa. Portanto, consegui equalizar a situação financeira”.
Se tivesse de dar um conselho para mulheres que passam por situação semelhante, ela aponta que abrir mão da pensão, mesmo que isso seja possível naquele momento, pode causar arrependimento no futuro. “Vejo muitas mulheres que pecam nisso. Eu poderia ter aberto mão para evitar estresse. Mas depois, se você ver o cara pagando muita coisa para a namorada nova, e pouco para seus filho, pensará duas vezes. Além disso, nunca sabemos o dia de amanhã. Precisamos garantir a participação do pai na vida do filho. É uma obrigação deles, e isso não nos deixa mais fracas. Não podemos ser taxadas de interesseiras e coitadas por conta disso”.
Incluir pequenos gastos escolares no pedido de pensão, que possam parecer mesquinhos em um primeiro momento, é necessário, pois farão diferença depois, aponta. “Muita mulher se sente mal por fazer uma lista, mas se deixar para depois há grandes chances de o processo se tornar litigioso. Ninguém fará isso de bom grado depois de muito tempo. A hora de negociar é quando a separação, de fato, acontece. Não pode se sentir culpada por tomar a decisão”.
Vitória conta que a decisão de se separar a empoderou como mulher. “Muitas não têm coragem de terminar uma relação porque não têm uma profissão, recursos ou família que apoia, e até mesmo se vê apenas com amigas casadas e teme preconceito. Muitas são acomodadas também”.
Ajuste de finanças após término em uma situação difícil
A separação, para Sofia (nome fictício), 40 anos, foi, e continua sendo, difícil. “Eu já queria me separar antes da pandemia, e quando ela estourou, o caos aumentou”. Quando propôs o divórcio, seu ex-marido não aceitou. Contudo, ela já estava muito cansada. “Fiquei muito tempo com ele para conseguir sustentar meu filho e minha filha”.
Sofia trabalhava como oficial de saúde e ganhava quase R$ 2 mil por mês. Sempre trabalhei, mas foi difícil porque tínhamos um financiamento de imóvel juntos, compartilhávamos despesas e eu precisava sustentar dois filhos”.
Com raiva, ele resolveu sair da casa onde moravam, e não quis mais pagar a prestação, que era de R$ 2,5 mil. “Tive sorte porque na pandemia houve uma renegociação maior com o banco, pois podia ter sido despejada há muito tempo”.
Para conseguir arcar com as despesas, Sofia pediu empréstimos, que está pagando até hoje. O fato de ser funcionária pública ajudou. “Senão, teria de trabalhar em três empregos. Perdi meu cargo e estou trabalhando em dois. Com apenas um salário, não consigo manter minha família. Minha filha começou a trabalhar e me ajuda”.
A ajuda de amigos e familiares foi essencial no processo, conta. “Meu melhor amigo, que é advogado, está cobrando o mínimo para me ajudar. Não houve acordo com o meu ex-marido. Ele joga o dinheiro que quer na conta e acha que está certo. Já tentei negociar com ele, mas ele tem muita raiva”.
A casa em que Sofia vive com os filhos foi retomada pelo banco, apesar dos esforços. “Coloquei à venda, mas por conta da pandemia ninguém quis comprar. Agora, busca na Justiça a pensão para o seu filho e ficar com parte dos lucros do banco.
“Irei negociar ao máximo o tempo que poderei ficar em casa para ter tempo de me planejar e passar a pagar aluguel. Só fé e muita força de vontade para encarar esse pesadelo. Mas estou satisfeita que me livrei de um relacionamento ruim para mim”.