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Ibovespa: por que entender a composição do índice é tão importante para o investidor

Por que o Ibovespa sobe ou cai? A resposta nem sempre está nas manchetes do dia, mas sim na estrutura do próprio índice. E é aí que estão as oportunidades


Einar Rivero. Foto: Divulgação

Einar Rivero

Einar Rivero é engenheiro e especialista em dados financeiros, com carreira dedicada à análise de informações econômicas e à geração de insights estratégicos para o mercado. Ao longo de mais de duas décadas, atuou em posições de liderança em grandes plataformas de dados, consolidando-se como referência em estudos e levantamentos sobre o mercado financeiro brasileiro, América Latina e EUA.


O Ibovespa é o principal termômetro da Bolsa brasileira. Quando ele sobe, investidores comemoram. Quando cai, o clima azeda. Mas o que poucos percebem é que, por trás desse número, existe uma composição concentrada em poucos setores e empresas, o que pode não refletir adequadamente o que está ocorrendo na economia.

Ibovespa, um índice concentrado

O Ibovespa é uma cesta com dezenas de ações. Assim como ocorre com uma cesta de compras, nem todos os produtos – as ações do índice – têm o mesmo peso. Algumas empresas e setores têm mais participação que outras. Isso acontece porque o índice é ponderado pelo valor de mercado e pela liquidez da ação. Ou seja, as empresas maiores com as ações mais negociadas na bolsa acabam dominando a carteira.

Segundo levantamento da Elos Ayta Consultoria, cinco setores concentram 62,03% do índice em agosto de 2025. Como a carteira do Ibovespa é recalibrada a cada quatro meses, exatamente para fazer frente às alterações na liquidez e no valor de mercado das empresas, essa participação varia ao redor do tempo. No ponto mais alto, essa concentração chegou a 64,98% em outubro de 2023. Na prática, significa que quase dois terços do desempenho do Ibovespa dependem de apenas cinco áreas da economia.

Os destaques de agosto de 2025 são:

  • 💳 Intermediários financeiros (bancos, seguradoras): 19,24%
  • 🛢️ Petróleo, gás e biocombustíveis: 15,16%
  • Energia elétrica: 12,08%
  • ⛏️ Mineração: 11,69%
  • 💧 Água e saneamento: 3,86%

Vale lembrar: o setor de petróleo chegou a representar quase 20% do índice em abril de 2024, quando a Petrobras disparou com a valorização internacional do petróleo. Já a mineração (leia-se Vale) chegou ao pico de 19,22% em novembro de 2022, reflexo da alta do minério e da demanda chinesa naquele momento.

A armadilha das múltiplas ações: uma empresa, dois papéis

Outro ponto que merece atenção é que algumas empresas têm mais de uma ação dentro do índice. A Petrobras, por exemplo, aparece com as ações ON (PETR3) e PN (PETR4). O mesmo ocorre com Bradesco e Eletrobras.

Se o investidor observar o índice apenas pela lista de ativos, pode ter a falsa impressão de que há uma boa diversificação. Mas ao consolidar por empresa, a realidade muda.

Veja o exemplo:

  • Em agosto de 2025, a Vale, com uma única ação (VALE3), tem 11,11%
  • Petrobras representa 10,08% do Ibovespa (soma das ações ON e PN)
  • O Itaú Unibanco, com apenas a ação PN (ITUB4), representa 8,44%

Essas três empresas sozinhas respondem por praticamente 30% do índice. É por isso que, quando uma delas publica resultado ruim ou enfrenta turbulência política (caso da Petrobras), o impacto sobre o Ibovespa é imediato e relevante.

Empresas dominantes e o efeito “arrasto”

O gráfico elaborado pela Elos Ayta Consultoria revela um comportamento consistente ao longo dos últimos 60 meses: o Ibovespa é sistematicamente influenciado por poucas empresas e setores.

Concentração por setor: tendência estrutural de alta

A linha verde do gráfico mostra a concentração dos cinco maiores setores do índice. A série apresenta uma tendência de crescimento estrutural entre 2020 e 2023. Em abril de 2021, essa concentração atingiu seu ponto mais baixo: 54,64%. Desde então, subiu continuamente até alcançar o pico de 64,98% em outubro de 2023, um salto de mais de 10 pontos percentuais.

Esse movimento pode ser explicado pela valorização simultânea de setores como:

  • Petróleo e gás (Petrobras em alta com o petróleo acima de US$ 90)
  • Mineração (Vale impulsionada pela retomada chinesa)
  • Bancos (alta dos juros beneficiando margens financeiras)

Apesar de uma leve retração em 2024, a concentração se mantém elevada, encerrando agosto de 2025 em 62,03%, o que sugere uma persistente dependência de poucos setores para o desempenho do índice.

Concentração por empresa: volatilidade, mas sem ruptura

Já a linha preta mostra a concentração das cinco maiores empresas do Ibovespa. Embora o patamar médio permaneça acima dos 40%, a trajetória é menos estável do que a dos setores. O menor valor da série ocorreu em abril de 2025 (37,54%), e o maior, novamente, em outubro de 2023, com 43,52%, exatamente o mesmo mês do pico setorial, o que reforça o efeito “arrasto”.

Essa sincronia entre as curvas ilustra como o desempenho de poucas empresas pode amplificar movimentos do índice. Quando as ações de Petrobras, Vale, Itaú, Bradesco e Ambev andam juntas, o Ibovespa voa (ou despenca).

A oscilação também pode sinalizar movimentos de rotação entre empresas dominantes. A queda na concentração em 2025 pode refletir uma diversificação forçada, impulsionada por IPOs recentes, crescimento de mid caps ou uma redução no peso relativo de gigantes como Petrobras e Vale.

O que o gráfico nos ensina?

  1. A concentração amplia a volatilidade: tanto setores quanto empresas concentram uma fatia expressiva do índice. Isso reduz a capacidade do Ibovespa de refletir a “economia real” ou a diversidade do mercado de capitais brasileiro.
  2. Há pouca folga para surpresas: se uma ou duas dessas empresas tiverem resultados abaixo do esperado, o impacto no índice pode ser brutal, mesmo que o restante da carteira vá bem.
  3. A diversificação dentro do Ibovespa é relativa: ao analisar os dados por ativo, o investidor pode imaginar uma pulverização saudável. Mas ao consolidar por empresa ou setor, a realidade é outra, o Ibovespa é um índice com poucos condutores reais.

O que aprendemos com os últimos 60 meses?

Olhando os dados de 5 anos, surgem alguns insights valiosos:

✅ 1. O Ibovespa é sensível a commodities

Petrobras e Vale ainda são os dois pesos-pesados. Portanto, oscilações no petróleo ou minério de ferro mexem diretamente com o índice.

✅ 2. Bancos continuam relevantes

Mesmo com o avanço das fintechs e o crescimento de novos setores, o setor financeiro segue dominante, representando quase 1/5 do índice.

✅ 3. Energia elétrica e saneamento ganham espaço

Setores tradicionalmente defensivos, como energia elétrica e saneamento, aumentaram sua participação. Energia, por exemplo, saltou de 5,19% em agosto de 2020 para 12,08% em agosto de 2025.

✅ 4. O Ibovespa é mais concentrado que parece

A ideia de que o índice reflete o “mercado brasileiro como um todo” perde força diante desses dados. A concentração setorial e empresarial reforça a necessidade de cautela ao usar o Ibovespa como referência de diversificação.

Concentração: risco ou oportunidade?

Como a maioria dos fatos do mercado, a concentração pode ser tanto um risco quanto uma oportunidade. Para o investidor que entende esses pesos, a concentração pode ajudar a antecipar movimentos. Quem aposta em Petrobras, por exemplo, indiretamente está influenciando o índice. Mas para quem busca diversificação e proteção, essa concentração aumenta o risco, já que poucos ativos puxam a carteira para cima, ou para baixo.

Conclusão: Ibovespa exige leitura crítica

Usar o Ibovespa como referência sem entender sua composição é como analisar um cardápio sem saber o que tem no prato. O investidor que olha apenas o número final não enxerga o impacto da concentração de poucos setores e empresas. E como mostram os últimos 60 meses, essa concentração pode influenciar bastante a oscilação do índice.

*As opiniões contidas nessa coluna não refletem necessariamente a opinião da B3

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