Investir melhor

O mais importante para o investidor


Estela Borgheri, colunista do Bora Investir

Estela Borgheri

Planejadora Financeira e co-fundadora da empresa Vínea Gestão de Capital, Estela é formada em Administração de Empresas e pós-graduada em Business Administration pelo Insper. Possui a certificação CFP® e é Consultora CVM


Semana passada estive na Expert XP, um evento de investimentos que acontece anualmente e traz grandes nomes do mercado financeiro e empresarial do Brasil e do mundo para compartilhar suas experiências, percepções e debater os temas mais relevantes e atuais do universo da economia e da tecnologia. Além da parte financeira, o evento também aborda outros assuntos, como negócios, inovação, disciplina.

O evento desse ano aconteceu em meio a um cenário de discussão das tarifas do Trump, com o Brasil saindo de um cenário de tarifa mais branda para uma das maiores entre os países (50%), taxa básica de juros alta e “insustentável” segundo os próprios painelistas e antecipação do debate político.

Muito conteúdo, bom saber um pouco do que se passa na cabeça dos gestores que estão gerindo os fundos onde investimos, dos políticos que estão governando nosso país e dos empresários que fazem girar a economia.

Mas o que fica claro ano a ano (peguei minhas anotações da Expert 2024 para relembrar) é que o futuro é uma caixinha de surpresas. Falava-se de taxa de juros a 8% no final de 2024 na Expert do ano passado. Ninguém sequer imaginava que o Trump poderia propor um tarifaço nesse nível.

A preparação para um ambiente incerto, investindo com consistência, diversificação e orientação de especialistas é a única coisa que está em nossas mãos. Investir de forma a priorizar a manutenção de patrimônio e não só pensando em ganhos estratosféricos.

Esse evento me fez lembrar de um livro muito famoso no mercado financeiro, chamado “O mais importante para o investidor”, de Howard Marks.

O livro é leitura obrigatória para os investidores ou aspirantes a investidor que queiram sair da superficialidade e do senso comum quando o assunto é o mercado financeiro.

“Estar consciente dos limites de nosso conhecimento sobre o futuro é um componente essencial de minha abordagem de investimentos” – Marks ressalta. E vindo dele, investidor com tamanho sucesso, devo admitir que tem seu valor. Ele mostra que é preciso ser humilde para ser um bom investidor e que pensar que sabe tudo sobre o mercado ou sobre previsões só atrapalha.

O prefácio é escrito por Henrique Bredda, sócio da gestora Alaska Asset Management, que tem um dos fundos mais populares (e apimentados) do país. Ele diz: “Muitos temas que aparecem no livro já foram exaustivamente estudados por outros investidores, mas foi na explicação sobre Ciclos de Mercado que encontrei a maior novidade.”

Howard Marks é um megainvestidor americano, sócio fundador e vice-presidente da Oaktree Capital Management, maior empresa de private equity do mundo (fundos que investem capital diretamente nas empresas).

Além de ser um grande escritor, Marks é conhecido também por seus relatórios sobre o mercado, os “memorandos para os clientes Oaktree”. Suas opiniões sobre o mercado financeiro são acompanhadas mundialmente levando até mesmo o Oráculo de Omaha, Warren Buffett, a acompanhar todas as publicações feitas por ele.

Autoridade em investimentos, Marks se destaca por sua leitura e visão do mercado financeiro – seu domínio sobre o assunto fez com que o Governo dos Estados Unidos pedisse sua ajuda para superar a crise de 2008. Atualmente, a Oaktree faz a gestão de cerca de US$ 210 bilhões, teve sua IPO realizada em 2012 levantando R$ 380 bilhões.

Costumo dividir o livro basicamente em dois pontos principais, totalmente relacionados e divididos em 20 capítulos (ou 20 lições):

  1. Pensamento de segundo nível: é preciso ir além das fórmulas prontas que se encontra no mercado financeiro, algo que ele chama de ter um “pensamento mais perceptivo”. Ele cita: “Percepção, intuição, senso psicológico de valor e a consciência excelentes que são necessários para se obter resultados que estejam consistentemente acima da média. Para isso é necessário pensamento de segundo nível”
  2. Gestão do risco: é preciso compreender que o controle de risco deve ser prioridade. Ele ressalta: “Notem que passo mais tempo discutindo risco e as formas de limitá-lo do que como obter retorno dos investimentos. A meu ver, o aspecto mais interessante, desafiador e essencial de um investimento é o risco.”

É o segundo ponto que acredito ser o mais importante: entendimento e gestão do risco e ter consciência de que o mercado é volátil. Não pelo fato de eu acreditar que o primeiro ponto não seja importante, pelo contrário. Acho muito válido que o investidor tente entender e, acima de tudo, exercite o “pensamento de segundo nível”. Porém, ele é muito complexo para o investidor comum.

Marks afirma que o investidor com pensamento de segundo nível – sofisticado – sabe identificar as ineficiências do mercado, criar uma “lista de candidatos” a investimentos que atendam a seus critérios mínimos (ou seja, ele precisa ter elaborado critérios em um primeiro momento), dos ativos listados, escolher as melhores pechinchas, que em geral “fundamentam-se na irracionalidade ou em alguma compreensão incompleta”, como ele menciona.

Perceberam a complexidade envolvida nesse pensamento de segundo nível? Não é algo que o investidor comum facilmente terá. Por isso, comentei mais acima que o segundo ponto, gestão de risco, é o mais importante a meu ver.

Marks ressalta a importância de se manter no jogo: “é mais importante garantir a sobrevivência durante o período de resultados negativos do que garantir o máximo de retornos em períodos desfavoráveis” e deixa claro no decorrer do livro todo que ele é muito mais favorável ao investidor mais defensivo evitando perdas ao longo do tempo.

No trecho: “nosso objetivo é ter um desempenho igual ao mercado quando ele vai bem e melhor do que o mercado quando ele vai mal. À primeira vista isso pode soar como um objetivo modesto, mas é realmente muito ambicioso” – ele deixa claro quão defensiva é a estratégia da sua gestora e o quanto isso é valioso.

Esse processo de gestão de risco parece estar muito mais acessível para o investidor comum do que o pensamento de segundo nível, quando consideramos que deve funcionar seguindo algumas regras básicas:

  • Não investir no que não conhece;
  • Saber o básico sobre alguns indicadores: tentar identificar se a promessa de ganho é muito alta e questionar quem está te oferecendo, perguntar qual o parâmetro de comparação desse ganho (CDI, IBOV, IPCA etc.);
  • Se está ainda na fase de construção do patrimônio, ter paciência e ir com calma nos ativos de risco – se conhecer primeiro como investidor. A gente não constrói uma casa começando pelo teto;
  • Diversificar: esse é um grande fator de redução de risco nos investimentos;
  • Não subestimar nunca o poder das influências psicológicas nas suas decisões – “nenhum de nós deve achar que é imune” – nas palavras de Howard.

“Sobrevivência em circunstâncias adversas” – é isso que nos mantém no jogo dos investimentos. E para isso precisamos ser humildes e entender que nada sabemos sobre previsões.

As opiniões contidas nessa coluna não refletem necessariamente a opinião da B3

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