Entrevistas

“A história do ETF no Brasil ainda é tímida, mas com um potencial gigantesco”, diz Eleuterio, da Bradesco Asset

Gestora trabalha para lançar no Brasil ETFs ligados a índices acionários da China

A Bradesco Asset está traçando novos caminhos para investidores em busca de diversificação internacional. Com R$ 930 bilhões em ativos sob gestão, a gestora trabalha para dar acesso ao investidor brasileiro, pela B3, a estratégias de investimento em renda variável na China. Em paralelo, também busca dar aos investidores da Ásia a oportunidade de alocar no Brasil via fundos listados, também conhecidos como ETFs. O trilho para isso é o ETF Connect, um acordo firmado entre a B3 e as bolsas de valores de Xangai e de Shenzhen, na China, para permitir a conectividade de ETFs entre os dois países.

A Bradesco Asset pretende listar dois ETFs chineses na B3: um que replica um índice amplo de 300 ações, e outro que segue um índice acionário focado no mercado de tecnologia. “A gente tem sido cada vez mais vocal sobre a oportunidade de diversificação internacional. Acho que, olhando o objetivo do investidor, tem que ter um pedaço de exterior na carteira”, diz Ricardo Eleuterio, diretor da Bradesco Asset. “E olhando para a China em particular, a gente vê novas empresas surgindo, tanto no campo de tecnologia e outros campos também, é uma narrativa muito interessante para diversificação”, complementa.

Na via contrária, Ricardo também diz ver boas oportunidades. “Existe uma disposição do investidor chinês em diversificar. A gente não vê ainda um fluxo de forma avassaladora para Brasil. Mas existe sim uma predisposição do chinês olhar para cá com mais cuidado. É da Ásia que a gente sente o interesse em olhar o Brasil com mais detalhes”, afirma.

Em entrevista ao Bora Investir, Ricardo comentou ainda a perspectiva de crescimento do mercado de ETFs no Brasil. “A história do ETF no Brasil ainda é tímida, mas com um potencial gigantesco. A gente costuma olhar o que aconteceu com os ETFs fora do Brasil.  O mercado de ETFs no mundo bateu US$ 13 trilhões.  E só o mercado americano está na casa dos US$ 9 trilhões. Realmente, parece um caminho sem volta”, diz ele.

Bora Investir: Como foi esse movimento de trazer novos produtos para que investidores brasileiros possam alocar em ativos listados nas bolsas da China?

Ricardo Eleuterio: A Bradesco Asset atingiu R$ 930 bilhões em ativos sob gestão. Boa parte desse AuM vem de investidores locais. E a gente tem cada vez mais buscado investidores fora do Brasil. 

Um exemplo disso foi que, em outubro do ano passado, inauguramos nossa asset em Miami, para ser um hub da Bradesco Asset. A ideia é atrair e mostrar para os investidores globais as estratégias de Brasil. Estamos trabalhando o caminho inverso também, de cada vez mais falar de diversificação internacional para investidores locais, utilizando nossas estratégias. E quando falo de ativos fora do país, não é só Estados Unidos, mas Europa e por que não Ásia.

Falando do ETF Connect, temos um escritório em Hong Kong desde 2011 e isso está nos ajudando muito. Estamos trabalhando para trazer um ETF vinculado a um índice amplo de 300 ações e outro ligado a um índice específico de tecnologia. Eu acho que faz todo sentido ter esses produtos no mercado brasileiro. Por outro lado, como gente está falando de listagem cruzada, vamos lançar o nosso ETF de Ibovespa, nosso BOVB11, nas bolsas de Xangai e Shenzhen. 

Esse acordo vai além do produto, prevê um intercâmbio de conhecimentos.  Existe uma agenda de levar especialistas de Brasil para a China, para falar das empresas, falar do ETF, de fundos no Brasil, e o contrário também, de especialistas que vêm para falar do mercado chinês.

Bora Investir: Você falou do escritório da Bradesco Asset em Miami. Como vocês têm visto o interesse dos estrangeiros para o mercado brasileiro?

Ricardo Eleuterio: O escritório em Miami não serve apenas ao investidor americano, mas ao investidor global. É de lá que atendemos os investidores da América Latina, por exemplo. A gente já viveu um momento muito bom de Brasil, já tivemos uma participação maior nos índices de mercados emergentes, o Brasil já teve grau de investimento no passado e já foi mais relevante. O fato é que hoje, inclusive com toda a turbulência que a gente está vendo no global, está mais difícil vender estratégias de renda fixa ou de ações para o estrangeiro. Mas é importante estar lá, porque a gente conhece bem esse mercado, se o otimismo vira com relação ao Brasil, a gente tem que estar presente.  Mas o fato é que hoje, todo mundo ainda está com freio de mão puxado em relação ao Brasil. Você tem um carrego [taxa de juros] de 15%, mas tem uma volatilidade de câmbio também que pode deixar tudo na mesa. Mas a gente vê interesses de investidores institucionais, principalmente. Hoje nosso grande volume de clientes não-residentes está no institucional, em fundos de pensão e seguradoras globais.

Bora Investir: Com a turbulência que estamos vendo nos EUA, medo de recessão por lá, muitos gestores têm alertado que o mundo está sobrealocado em Estados Unidos, e que essa nova conjuntura pode alterar isso. Você vê parte desse fluxo saindo dos Estados Unidos vindo para cá? Ou a maior parte está indo para outras geografias, ou mesmo para outras classes de ativos, como ouro?

Ricardo Eleuterio: Eu estive na China em setembro do ano passado. Existe uma disposição do investidor chinês de olhar Brasil. Existe uma disposição em diversificar, nesse contexto de olhar para novas geografias. Esse é um pouco do meu sentimento em Shangai e Shen Zhen, as principais bolsas de valores de lá.

Existe sim interesse. A gente não vê ainda um fluxo de forma avassaladora para Brasil. Mas existe sim uma predisposição do chinês olhar para cá com mais cuidado. Na América Latina também existe o interesse, mas de forma mais tímida, os investidores estão esperando o melhor momento para entrar. É da Ásia que a gente sente o interesse em olhar o Brasil com mais detalhes. E aí é superinteressante estamos levando ETFs daqui para lá, você dá um caminho para esse capital.

Bora Investir: E no sentido contrário, você vê interesse de investidores brasileiros em alocar na China nesse momento? Quais as perspectivas?

Ricardo Eleuterio: Acho que gente tem um mercado muito particular. Quando você olha para o investidor brasileiro, talvez o maior movimento de diversificação ou de procura por outros ativos e outras geografias tenha sido o período da menor Selic da história, de 2%. Mas, no meio dessa volatilidade toda, a renda fixa passa a ser protagonista de novo. Então, acho que o mercado brasileiro ainda continua muito focado em ativos locais. O crédito privado se transformou nos últimos anos. Hoje existe gestão ativa de crédito privado.

Mas a gente tem sido cada vez mais vocal sobre a oportunidade de diversificação.  Acho que olhando o objetivo do investidor, tem que ter um pedaço de exterior na carteira.

E olhando para a China em particular, a gente vê novas empresas surgindo, tanto no campo de tecnologia e outros campos também, é uma narrativa muito interessante para diversificação. Mas eu tenho que assumir que, com taxa de juros [no Brasil] nesse nível, a renda fixa tem sido protagonista. Mas tem esse desafio de diversificar.

A gente tem boas expectativas, já tivemos um avanço de diversificação internacional dos brasileiros nos últimos anos. Com a bolsa americana andando muito, acho que acaba que muita gente começou a olhar para essa oportunidade, para essa necessidade de colocar o dinheiro não só em real.

Bora Investir: Você comentou que o mercado de crédito privado mudou muito nos últimos anos e que também tem atraído muito interesse dos investidores. Mas esse cenário não pode ser negativo, pressionando demais os spreads, ainda mais em um momento de Selic elevada e ainda em alta?

Ricardo Eleuterio: Concordo, os spreads estão muito realmente baixos, principalmente das emissões de empresas de boa qualidade. Eu não tenho dúvida que, com uma Selic nesse nível de juros, há uma pressão sobre as despesas financeiras dessas empresas. Nesse ambiente, a seleção dos ativos que compõem o portfólio de crédito privado é muito relevante. 

Agora tem uma dinâmica que eu escuto pouco falar no mundo de crédito. Há cinco anos, a realidade do gestor de crédito é que você comprava um papel e levava até o vencimento. No ano passado, movimentamos R$ 45 bilhões só no mercado secundário, é muito relevante, considerando que é um mercado que quase não existia. Hoje, como há um mercado secundário mais ativo, o gestor consegue fazer a gestão ativa desse portfólio. O que significa? Quando você achar que o spread de um papel não está valendo a pena por alguma razão, simplesmente sai no secundário, carrega mais caixa. Então isso gera uma dinâmica muito diferente no mercado de crédito.

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