Entrevistas

“Copom teria espaço hoje para encerrar o ciclo de alta”, diz Rafaela Vitória

Economista-chefe do Inter explica sua avaliação do cenário atual e suas projeções para a Selic até o fim do ano

O mercado está dividido quanto às expectativas para a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) desta quarta-feira (18). De acordo com as posições de investidores nas opções de Copom, há quem acredite em uma elevação da Selic em 0,25 ponto porcentual, para 15%, há quem espere uma manutenção da taxa em 14,75%, e até uma minoria que se posiciona para uma alta de 0,50 ponto.

Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter, espera uma manutenção. Entre os motivos, a inflação em queda, a desaceleração da atividade e um cenário externo que, apesar de incerto, ainda pesa contra a inflação. Rafaela também cita o nível historicamente alto da Selic: “há 20 anos a gente não via uma taxa tão alta. Temos uma inflação que tem sim um desvio grande da meta, mas não é tão alta como a gente viu no passado. Nos últimos picos de política monetária, vimos um pico de inflação bem maior do que a gente tem hoje”, diz.

Em entrevista ao Bora Investir, Rafaela explicou sua avaliação do cenário atual e suas projeções até o fim do ano. Confira a entrevista completa:

Bora Investir: O que você espera da decisão desta quarta-feira do Copom?

Rafaela Vitória: A gente está esperando que o Copom mantenha os juros em 14,75% ao ano. Já estávamos com essa expectativa desde a última reunião, quando o comunicado indicou a flexibilização.

A gente entendeu que a flexibilização já poderia indicar essa pausa e de lá para cá os dados corroboram com um cenário mais benigno para a inflação. A gente viu dados de inflação, principalmente de maio, mostrando uma desaceleração, um pouco melhor do que se esperava, tanto pelo lado de alimentos e bens industriais, influenciados pelo câmbio mais favorável, mas também na parte qualitativa de serviços e nas medidas de núcleo.

Por fim, as expectativas de inflação também já dão sinais de queda. Nessa semana tivemos uma importante revisão no Focus, ainda que concentrado no curto prazo.

Mas pela nossa avaliação desse cenário como um todo, o Copom teria espaço hoje para encerrar o ciclo de alta.

Bora Investir: E esse patamar seria mantido até o fim do ano?

Rafaela Vitória: Não, a gente tem uma [expectativa de] queda em dezembro, mas ela vai depender do equilíbrio fiscal. Acho que o fiscal ainda traz alguma incerteza para esse ano. O relatório bimestral de maio mostrou uma revisão forte pelo lado das despesas. O governo vem tentando buscar receita. Então, dependendo de como for a execução orçamentária até o final do ano, a gente pode ter um processo de desinflação melhor. E aí permite queda já em dezembro. Mas se o governo continuar acelerando os gastos, a inflação pode continuar um pouco mais alta e o cenário de queda de juros fica mais para 2026.

Bora Investir: Nas últimas semanas, o noticiário sobre fiscal foi agitado. Como isso afeta a percepção de risco?

Rafaela Vitória: O risco fiscal não é explicitamente colocado no balanço de riscos da inflação do BC, mas ele sempre menciona a questão da incerteza fiscal que prejudica a desancoragem mais longa e prejudica também a potência da política monetária. Você tem um monetário bastante restritivo, contra um fiscal expansionista, o que acaba impedindo a atividade de desacelerar e a inflação de cair mais. Acho que o Copom vai continuar mantendo esse risco fiscal na sua avaliação. Ainda que fora do balanço de riscos, o fiscal continua ali como um ponto de atenção.

Bora Investir: Se a Selic for mantida, como vocês estão imaginando, quais são os riscos olhando para frente?

Rafaela Vitória: A gente tem um cenário hoje de Selic bastante restritiva. Há 20 anos a gente não via uma taxa tão alta. Temos uma inflação que tem sim um desvio grande da meta, mas não é tão alta como a gente viu no passado. Nos últimos picos de política monetária, vimos um pico de inflação bem maior do que a gente tem hoje.

Um dos riscos que a gente vê no cenário é ter uma desaceleração de crédito mais significativa à frente. O PIB continua crescendo, os primeiros indicadores do segundo trimestre ainda apontam um crescimento positivo. Acho que o que não está no radar hoje é uma desaceleração mais forte, até mesmo uma retração da economia por conta de um aperto monetário maior.

Bora Investir: Olhando para o cenário externo, os últimos meses foram marcados pela discussão sobre tarifas nos Estados Unidos e, mais recentemente, pelo conflito no Oriente Médio. Como você acha que o Copom vai ler esse cenário e se ele deve se posicionar sobre isso?

Rafaela Vitória: O cenário externo ainda é de incerteza. Você tem várias partes se movendo nesse momento. Há uma preocupação com relação ao rumo da política monetária nos Estados Unidos, que é bastante relevante. O Fed ainda está em pausa. A expectativa de corte existe, mas [o mercado aponta para] dois cortes no segundo semestre, também com muita incerteza.

E a volatilidade no preço do petróleo traz também uma preocupação, muita incerteza. Então acho que o Copom vai manter no seu balanço de riscos essa incerteza que vem de fora.

Mas em linhas gerais o que a gente vê de fora ainda é uma pressão baixista para a inflação, tanto via câmbio quanto commodities, apesar do petróleo ter voltado para cima de US$ 70 o barril. A guerra tarifária implica em uma sobreoferta de produção industrial, ou seja, uma pressão baixista de preços de bens industriais globais. Então, acho que o Banco Central vai reconhecer que, apesar de marginalmente o cenário externo ter contribuído para o risco de baixa da nossa inflação, ainda traz muita incerteza por conta dos conflitos e do desenrolar das tarifas. Então, a gente ainda não tem muita clareza de como a economia global vai se comportar no segundo semestre.

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