Entrevistas

Otimismo em tempos de incerteza: por que o cenário atual pode ser uma oportunidade para investir pensando em dividendos

Para Fábio Baroni, sócio-fundador da AGF, a queda dos preços das ações é oportunidade para aumentar sua participação nas companhias – e turbinar o recebimento de dividendos

Em um cenário de instabilidade econômica e oscilações do mercado, muitos investidores se veem diante de decisões difíceis. A performance das ações na bolsa não tem sido das melhores. Do outro lado, as taxas de juros elevadas têm incentivado uma migração para a renda fixa. No entanto, Fábio Baroni, sócio-fundador da AGF, tem uma visão diferente – e bem mais otimista.

Seguindo o foco da AGF, de construir uma carteira de ações que possa render dividendos ao investidor, Baroni vê a queda nas cotações como uma oportunidade. Mas para seguir essa estratégia, inspirada no megainvestidor Luiz Barsi, é preciso estar de olho no longo prazo.

“A gente passa para as pessoas a ideia de que o longo prazo realmente é uma força magnífica, mas o que a gente tem que colocar na cabeça delas é que elas têm que sobreviver ao longo prazo.” E essa sobrevivência, segundo ele, está diretamente ligada à escolha de ações que oferecem pagamentos frequentes. “O dividendo acaba sendo um combustível pra que você continue na jornada”, completa.

Baroni acredita que o investimento deve proporcionar tranquilidade. “A pessoa tem que dormir bem sabendo os ativos que ela tem. Se você compra um ativo em que confia, que paga bons dividendos, se o preço cai pela metade por conta de algum fator externo, tudo que você vai querer é comprar mais.” Nessa visão, explorar as oportunidades do mercado acionário, mesmo em tempos desafiadores, pode ser a chave para um futuro financeiro sólido e sustentável. Fábio Baroni conversou com o Bora Investir sobre o cenário atual e a estratégia defendida pela AGF. Confira os principais pontos da entrevista.

Bora Investir: Estamos em um momento difícil para os investimentos de renda variável, com muita gente indo para a renda fixa. Mas eu sei que vocês na AGF olham de uma forma um pouco diferente para o investimento em ações. Por que vocês consideram que esse é um bom momento para investir em ações, pensando em longo prazo?

Fábio Baroni: Nosso trabalho é muito ingrato em vários sentidos. Um deles, e eu acho que é o principal, é que quando está todo mundo falando para você sair da bolsa, começar a dolarizar, comprar bitcoin, a gente está falando o contrário. A gente está falando para você comprar ações de boas empresas pagadoras de dividendos.

O Brasil sempre foi muito turbulento e a gente acredita que vai continuar sendo assim pelos próximos 100 anos. Historicamente sempre foi assim. Mas historicamente também há empresas que prosperaram e vão continuar prosperando. Com certeza estamos vivendo um cenário de incertezas. Esse cenário é o que faz com que as ações caiam. Mas hoje existem empresas que continuam lucrando, e até batendo recorde de lucros. Hoje, quem tem visão de longo prazo consegue comprar cada vez mais ações dessas empresas, se tornando cada vez mais parceiro, ganhando um dividendo muito bom, acima de dois dígitos inclusive.

E o dividendo é líquido de imposto, é corrigido por inflação e ainda você pode fazer o que nós chamamos de efeito bola de neve, que nada mais é do que comprar mais ações. E esse processo fica cada vez melhor conforme, infelizmente, as crises se aproximam. Porque o mercado antecipa o que está por vir, e as ações estarem caindo hoje significa que o mercado tem uma desconfiança em relação aos rumos da economia. Mas nós, investidores de longo prazo, olhamos de uma maneira muito mais tranquila, porque a gente sabe que está comprando cada vez mais barato empresas que são multicentenárias.

A gente tem que se manter alheio às turbulências, no sentido de focar em número de ações de empresas que são pagadoras de dividendos, e que muito possivelmente vão sobreviver aos próximos cenários, às próximas crises.

Bora Investir: Mas estamos em um cenário de Selic elevada e ainda em trajetória de alta. Isso não pode atrapalhar a performance das empresas?

Baroni: Pode, principalmente as empresas que têm uma dívida um pouco maior. Essas dívidas geralmente são indexadas a Selic, e isso pode fazer com que elas reduzam o pagamento de dividendos temporariamente. Mas o que geralmente acontece? As empresas começam a cair tanto de valor, que quanto mais elas caem de valor, mais você consegue comprar, em número de ações dessas empresas. E geralmente elas caem mais de valor do que os próprios lucros.

Se você comprava uma ação a R$ 20, que pagava R$ 2 em dividendos, e o preço do papel cai para R$ 10, não necessariamente ela vai começar a pagar R$ 1 de dividendos. Às vezes ela diminui de R$ 2 para R$ 1, 80. Então eu acho que esse cenário acaba sendo bastante favorável, mas o investidor precisa ter estômago.

E existem empresas que, mesmo com esse cenário, acabam lucrando até mais. Boas empresas geralmente conseguem se beneficiar de qualquer cenário. A gente sempre cita os setores BESST (Bancos, Energia, Seguros, Saneamento e Telecom), que têm empresas que se beneficiam independente do cenário. Claro que algumas delas podem ter uma dificuldade aqui ou ali, mas a queda nos preços acaba criando oportunidades e fazendo com que você multiplique seus dividendos.

Basicamente, essas empresas conseguem repassar a inflação, e se adaptar a taxas de juros maiores. A gente diz aqui no nosso método que o investidor deve sempre focar no aumento de número de ações. Quando o mercado está preocupado, o preço dessas ações costuma cair de maneira substancial e você consegue aumentar o número de ações na sua carteira.

E aí a gente tenta fazer com que as pessoas se sintam mais confortáveis, porque elas estão comprando bons ativos. Ativos que são vitais para a economia e que vão continuar remunerando muito bem os investidores. Só que você tem que ter disciplina, paciência e consistência para fazer isso. Que é o mais difícil.

Bora Investir: A gente está falando sobre como esse momento é uma oportunidade para comprar ações dessas empresas, mas do outro lado, as pessoas que já compraram essas ações anos atrás estão vendo seu patrimônio diminuir. Ainda que o dividendo não tenha diminuído tanto, como explicar para essa pessoa que ela deve continuar investindo?

Baroni: Primeiro de tudo, se essa pessoa tem uma filosofia de longo prazo, estamos pressupondo que ela comprou boas ações. Então eu sugiro que essas pessoas não olhem para o patrimônio que elas têm, porque isso fica oscilando o dia inteiro. O que eu mais indico é olhar o número de ações que elas têm. Olhe para o número de ações que você tem e foque exclusivamente nele. Você tem 10 mil ações de uma belíssima empresa, a R$ 10. Se o preço cair para R$ 5, quantas ações você tem? As mesmas 10 mil ações.

Quando você começa a focar em número de ações que você tem no seu portfólio, a relação muda completamente. Ver o patrimônio diminuir vai causar um desconforto, mas se você tiver uma meta estabelecida de que quer viver com R$ x de dividendos, vai calcular que precisa de x mil ações. E quando o preço cai, você consegue comprar mais ações, e fica mais perto do seu objetivo.

A gente gosta de sugerir para as pessoas que elas pensem em dividendos. Para pensar em dividendos, automaticamente você tem que pensar em número de ações que você tem. É com os dividendos que você paga os boletos.

Bora Investir: Vocês falam muito dos setores BESST, mas os investidores devem entender isso como um filtro inicial, certo? Não é qualquer empresa dentro desses setores que vai valer a pena.

Baroni: Quando a gente fala de BESST, não é simplesmente pegar todas as empresas que estão dentro dessa nomenclatura e sair comprando. Eu acho que uma boa métrica para um investidor começar a avaliar e de fato começar a colocar na carteira algumas ações é justamente olhar o histórico de dividendos dessas empresas em diferentes períodos, inclusive aqueles que foram péssimos para a economia.

Geralmente essas empresas que continuaram pagando dividendos em períodos desafiadores e continuaram aumentando a distribuição são empresas que possuem barreira de entrada, que já estão estabelecidas no mercado. E existem empresas fora do BESST que nós também olhamos.

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