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COP 27: momento decisivo no combate ao aquecimento global

Marcella Ungaretti, Head de Research ESG da XP, explica os três pontos principais da conferência: créditos de carbono, financiamento climático e obstáculos geopolíticos

O mundo chega à 27ª conferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP 27, em um momento decisivo no combate ao aquecimento global. Os cientistas são unânimes em afirmar que limitar o aumento da temperatura abaixo de 2ºC é crucial para evitar um colapso do planeta. As negociações na cidade de Sharm El Sheikh, no Egito, serão centralizadas em três pontos principais: créditos de carbono, financiamento climático e obstáculos geopolíticos.

Os créditos de carbono voltam à mesa de negociação para que sejam definidos mecanismos de regulamentação. São as regras de como os países podem usar esses créditos em planos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.

financiamento para perdas e danos – aqueles fenômenos climáticos que não são mais possíveis de evitar – passam pela garantia de recursos no valor de US$ 100 bilhões anuais dos países mais ricos aos em desenvolvimento. Entram nessa conta também os investimentos na transição energética para fontes renováveis. Os obstáculos geopolíticos transitam entre as consequências da invasão da Rússia à Ucrânia e chegam aos riscos de uma recessão econômica mundial.

Ontem, terceiro dia da conferência, foi marcado pelos primeiros apelos de líderes para uma compensação financeira aos países pobres que mais sofrem com as consequências do aquecimento global. O anfitrião da COP 27, o Egito, anunciou um plano para ajudar esses países a resistir aos impactos – com metas a serem cumpridas até 2030, arrecadando US$ 300 bilhões por ano em investimentos. Os próximos dias vão mostrar se a ideia vai ou não para frente.

Em entrevista ao B3 Bora InvestirMarcella Ungaretti, Head de Research ESG da XP, dá um panorama sobre a COP 27, explica os principais entraves para um acordo global e comenta o papel do Brasil na conferência.

B3: Os temas da COP 27 podem ser divididos em três núcleos principais: créditos de carbono, financiamento climático e obstáculos geopolíticos. A partir do primeiro ponto, o que podemos esperar de resultados na Conferência do Clima?

Marcela: A respeito dos três pontos, é importante lembrar o que já saiu na COP 26. Porque muito do que a gente espera ver agora tem respaldo no ano passado. O artigo 6 do Acordo de Paris – que são as diretrizes básicas para um mercado de carbono regulado – foi aprovado na conferência passada, mas esperamos que continue sendo discutido. É preciso criar definições maiores em relação a mecanismos de atuação desse mercado. Uma potencial dificuldade – que já começou a ser discutida na COP 27 – é que hoje o mercado de crédito de carbono tem preços diferentes entre os países. Então, se você olhar a Europa, a gente encontra valores diferentes dos negociados nos Estados Unidos. E aí, se por um lado tem um interesse de unificar e ter um preço único, global, outros defendem que esse preço deve sim ser diferente entre os países. O argumento é que esse preço deve refletir o custo de se poluir nos diferentes países, o custo é diferente. Essa é uma das grandes discussões que a gente deve ter ao longo dos próximos dias.

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B3: Como fica para o Brasil essa discussão dos créditos de carbono?

Marcela: Esse é um tema bastante importante para o país, dado que temos um espaço interessante para desfrutar desse mercado – apesar de ser ainda bastante incipiente. Temos a possibilidade de ter créditos de diferentes produtos, tanto em termos de créditos de carbono de vegetação nativa até o que vem beneficiar a geração de energia renovável. Mas é preciso primeiro entender como que o Brasil vai fazer para estar de acordo com as definições globais de atuação, que ainda não estão 100% batidas. A COP 27 deve atuar no sentido de trazer mais transparência em relação às regras de negociação. E aí vai ser preciso entender como que o Brasil vai se adaptar, se adequar a essas regras em relação ao mercado internacional. Se por um lado a gente entende que ainda tem muito a ser definido em termos de dinâmica global, por outro o decreto brasileiro publicado para definir o funcionamento desse mercado já foi um avanço. É justamente aí o foco da COP 27, o reconhecimento do potencial brasileiro nesse mercado e como os créditos de carbono podem ajudar os países a atingirem as metas de redução das emissões.

B3: Indo agora para o financiamento climático. É um ponto crucial?

Marcela: Na COP 26, ficou bastante claro a definição desse compromisso, por parte dos países desenvolvidos, de US$ 100 bilhões anuais em financiamento climático para os países em desenvolvimento, o que não foi cumprido. Agora para a COP 27 tem dois pontos. O positivo que vai ser a cobrança dessa meta – exigindo também uma maior transparência do que os países em desenvolvimento, de fato, devem implementar. Justamente, acho que muito do que veio do passado desse não cumprimento, faz com que esse pedido de maior transparência venha com mais empenho, para que de fato os países se comprometam em definir metas claras. O segundo tópico: detalhar melhor a inclusão do financiamento de dados – a agenda chamada de perdas e danos. A gente espera que das discussões tragam cliques positivos e sempre críveis nessa questão da transparência.

B3: Indo ao último ponto: obstáculos geopolíticos. São desafios complementares?

Marcela: Todo o cenário geopolítico, principalmente frente à invasão da Rússia à Ucrânia, coloca um desafio adicional em relação a quanto que os países desenvolvidos vão conseguir ajudar no financiamento aos países em desenvolvimento – dado esse cenário geopolítico mais instável. Esse cenário ele adiciona desafios às negociações, mas também deixa bastante claro que agora, mais do que nunca, os países vão precisar cooperar e colaborar. Terão de atuar em conjunto para conseguir progredir e cumprir o Acordo de Paris – no sentido de limitar o aumento da temperatura global 1,5º C a até 2ºC. Ao longo dos próximos dias a gente deve ter muito mais visibilidade em relação a esses três temas, vale a pena monitorar de perto.

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B3: O secretário-geral da ONU, António Guterres, foi muito duro no início da semana e afirmou: “é cooperar ou morrer”. Você acredita que a COP 27 é a última chance?

Marcela: A grande verdade é que o cenário tem ficado cada vez mais alarmante. O que fica evidente é que, ano após ano, existem gargalos. Tanto no cumprimento das metas de redução de emissões, quanto na promessa de financiamento. O que acaba levando a uma necessidade de ação urgente. É preciso que nessa COP a gente saia com ações mais abertas, que os países assumam compromissos e que fique mais claro o caminho para que essas metas sejam atingidas. Para que não se chegue em um ponto de não retorno – que é um ponto onde não se consegue mais implementar essa agenda.

B3: O que esperar do Brasil na COP 27?

Marcela: Eu destacaria dois principais temas de discussão para o Brasil. A preservação das florestas e a questão do crédito de carbono (que falei no início) e que o país tem um mercado interessante.

B3: Você acredita em um final positivo para a Conferência do Clima?

Marcela: As expectativas são de avanços importantes tanto em compromissos dos países, quanto em maior transparência em relação ao que de fato vai ser feito. Com um passo a passo, com um método mais claro. Não tem outro caminho senão os países cooperarem. É preciso que os países diminuam a dependência energética – em uma transição dos combustíveis fósseis para energias renováveis. Essa é uma das razões da crise. Para a Agência Internacional de Energia, o uso de carvão e petróleo precisa começar a diminuir para as energias renováveis. Essa é uma narrativa que a gente também espera que seja reforçada na COP 27. Seria um desfecho importante a ser feito e que a gente espera, de fato, que seja bastante positivo.

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