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Vendas no varejo caíram em junho. Entenda o que isso significa

Aprenda a interpretar os indicadores do comércio para não cometer erros na hora de decidir seus investimentos

Crédito apertado, inflação e juros elevados formam um contexto econômico nocivo às vendas do varejo no Brasil. Segundo os dados divulgados nesta semana pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), junho registrou uma contração de 1,4% nas vendas, a maior queda mensal desde dezembro do ano passado (-2,9%). 

Mas antes que você abra mão de todos os investimentos atrelados ao desempenho deste setor, entenda que esse cenário, segundo as projeções dos economistas, deve melhorar no segundo semestre, quando o comércio sentir os efeitos da injeção de capital dada pelo governo federal. Os benefícios sociais e fiscais para a população foram garantidos pela aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que derrubou limites impostos pela legislação eleitoral em um ano de campanha. 

O “pacote de bondades”, como vem sendo chamado, inclui o aumento em R$ 200 para todos os inscritos no Auxílio Brasil, uma ajuda de custo de R$ 1 mil aos caminhoneiros, além do vale gás de cozinha, parcelas de R$ 200 para taxistas, gratuidade no transporte coletivo de idosos e compensação de ICMS para os Estados que repassarem o subsídio adiante, reduzindo o preço de algumas mercadorias 

Significa, então, que é o momento de investir em ações de companhias varejistas, em fundos imobiliários cujas carteiras tenham lojas e shopping centers, ou, talvez, em títulos de crédito privado de empresas que vendem direto para o consumidor final e demais ativos influenciados por um aquecimento do comércio?

Antes de construir posições em papéis com esse perfil, lembre-se de que as medidas da PEC dos Benefícios se encerram em dezembro. Para 2023, os auxílios acabam e, se as condições macroeconômicas do País não estiverem favoráveis – inflação e juros altos e baixo crescimento –, as vendas tendem a cair novamente, afetando a indústria e o comércio deste setor.

No ano que vem, contudo, o governo – que será escolhido na eleição, em outubro – deve negociar outro pacote de incentivo à recuperação da economia, com possível redução de impostos para a linha branca (eletrodomésticos) ou para o segmento automotivo, por exemplo. A política monetária pode se tornar menos austera, permitindo uma redução mais rápida dos juros. Como saber?

Não há como prever. A essa altura, você já percebeu que – na impossibilidade de saber o que acontecerá com os indicadores do varejo no atual cenário – a principal recomendação é pensar no longo prazo. Isso implica um horizonte de, no mínimo, dois ou três anos, pensando no  Brasil.

O que significa a deflação de julho para os seus investimentos

A partir deste raciocínio, é possível analisar com calma o que querem dizer os resultados da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE. No acumulado do ano, o índice revela uma alta de 1,4% no primeiro semestre frente ao mesmo período de 2021. A receita nominal do setor também tem alta tanto no acumulado de 2022 (+16,9%), como nos últimos 12 meses (+13,5%).

Outro ponto a se observar no indicador são as oito atividades analisadas:

Pesquisa mensal do comércio – IBGEJunhoJun 2022/
Jun2021
Acumulado do ano12 meses
Varejo (total)-1,4


-0,31,4-0,9
1 – Combustíveis e lubrificantes-1,1


7,850,9
2 – Híper, Supermercados, Produtos Alimentícios, Bebidas e Fumo-0,5


1,50,4-1,1
3 – Tecidos, vestuário e calçados-5,4


2,217,29,3
4 – Móveis e eletrodomésticos-0,7

-14,7-9,3-15
5 – Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria1,3


118,46,4
6 – Livros, jornais, revistas e papelaria-3,8


2,618,44
7 – Equipamentos e materiais de escritório, informática e comunicação-1,7


1,40,7-4,3
8 – Outros artigos de uso pessoal e doméstico-1,3


-11,4-2,8-0,8


Atenção aos detalhes

Repare que os segmentos apresentaram variações bastante diferentes, o que comprova o risco de tomar decisões por impulso, sem apurar melhor como o IBGE analisa o varejo e relacionar esses resultados ao perfil de cada investimento. Por exemplo: enquanto o vestuário registrou a maior queda no mês de junho (- 5,4%), nos últimos 12 meses (+ 9,3%) e no acumulado de 2022, ele obteve um dos melhores desempenhos no índice (+ 17,2%).

O segmento de artigos farmacêuticos também apresentou boa performance de vendas em junho, com 11% de aumento na comparação com o mesmo período no ano passado e alta de 8,4% no acumulado do ano. Trata-se de uma boa notícia para quem mantém ações ou títulos privados desses dois setores, indicando a resiliência desses dois comércios, mesmo em tempos de inflação, quando há perda do poder de compra dos brasileiros.

Por outro lado, as receitas dos varejistas de móveis e eletrodomésticos, apesar de terem evitado que o índice despencasse ladeira abaixo agora em junho, vêm apresentando um desempenho negativo no acumulado de 12 meses.

A pesquisa do IBGE ainda desmembra os dados de comércio de materiais de construção, que teve queda nas vendas em junho (- 1,0%), na comparação deste mês com junho de 2021 (- 11,4%) e no acumulado de 2022 ( – 7,3%). Aqui, a interpretação é que a disposição do brasileiro em reformar a casa, vista nos primeiros dois anos de pandemia, caiu agora que a população voltou ao local de trabalho. 

Parte da retração das atividades mais dependentes do acesso ao crédito – compra de móveis, eletrodomésticos e material de construção – pode ser explicada pelo aumento na taxa de juros. Assim, do mesmo modo que a manutenção da Selic acima de 10% favorece os investimentos em renda fixa atrelados aos juros, o aperto da política monetária pelo Banco Central atrapalha os ativos relacionados a empresas de segmentos com vendas financiadas.

Embora o mercado acredite que o BC não precisará fazer novos reajustes nos juros, não existe uma bola de cristal para afirmar que o ciclo de alta da Selic já chegou ao fim. A recomendação aos investidores é, portanto, redobrar os cuidados antes de julgar como positivas ou negativas as notícias sobre indicadores econômicos – além de sempre pensar nas aplicações com objetivos de longo prazo.