Cenário global turbulento pode favorecer Brasil, mas reforça a importância da diversificação
Mercado brasileiro tem se beneficiado com investidores internacionais reduzindo alocação nos EUA, mas cenário global incerto exige cautela
O Brasil tem chamado atenção dos investidores internacionais em meio ao cenário global mais incerto. Com os Estados Unidos em meio a mudanças na política tarifária e desequilíbrios fiscais, e outras economias emergentes lidando com diferentes desafios, o Brasil surge como alternativa. Assim, investidores internacionais têm visto no país oportunidades de alocar o capital – não à toa, o Ibovespa B3 foi impulsionado por esse fluxo de capital estrangeiro e bateu sucessivos recordes nas últimas semanas. Isso não significa, no entanto, que é hora de abandonar a diversificação internacional e apostar todas as fichas em uma única classe de ativos. Essas foram algumas das conclusões de especialistas durante ó Fin4She Summit 2025, evento que reúne lideranças femininas no setor financeiro e tem a B3 como patrocinadora.
“A incerteza global aumentou por conta da mudança de governo nos EUA e da mudança na política tarifária. Os investidores internacionais estão olhando para o Brasil, porque o Brasil acabou se saindo um pouco menos pior. E digo menos pior porque quando se fala em incerteza global não tem ganhadores”, diz Ana Madeira, economista chefe para o Brasil do Morgan Stanley.
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Segundo ela, o Brasil é uma economia muito grande, mas relativamente fechada, o que ajuda a proteger o país, pelo menos em parte, da queda de crescimento da economia global. “Outro fator é que, quando a gente viu a imposição de tarifas, o Brasil virou um mercado de substituição, já que muitos produtos exportados pelos EUA são exportados pelo Brasil também. Muitos países estão diminuindo a demanda dos EUA e desviando essa demanda para cá. E temos o potencial, até certo ponto, de aumentar essa oferta”, completa.
Esse movimento de atenção ao Brasil, que começou ainda no fim de 2023, foi sentido também por quem está dentro das empresas. “Vimos investidores saindo do risco e levando dinheiro para fora no pós-pandemia, mas fim do ano passado e no início deste, ano houve uma virada”, conta Marilia Nogueira, diretora de RI da PetroReconcavo. “Todo o mundo estava muito alocado em EUA, e em abril vimos investidores buscando alocar em outros mercados. Só que a China estava no meio do problema [guerra tarifária com EUA], a Rússia está em guerra, a Índia está cara. Então, o investidor começou a olhar para Brasil e México”.
E esse interesse estrangeiro vem a despeito das taxas de juros elevadas no Brasil, destaca Ana Madeira. “Quando a gente saiu da pandemia, o Brasil começou a surpreender para cima em termos de crescimento, já são 4 anos surpreendendo para cima. Uma explicação foram as várias reformas estruturais que aconteceram desde 2016. Outra coisa que explica que o PIB esteja tão resiliente apesar dos juros a 15% é o aumento das transferências sociais”, diz.
Para Natalie Victal, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, esse histórico de resiliência é fruto de um processo longo de amadurecimento institucional. “Quando a gente tem um macro minimamente estável, tem muito do potencial do Brasil. Se a gente pensa no Brasil de uma forma contínua, a gente vem fazendo reformas há bastante tempo, desde o governo FHC, do primeiro governo Lula. Quando inflação mais baixa e juro baixo, o setor privado brilha. Já brilha com juro a 15%”.
Mas apesar dos benefícios ao Brasil, as transformações e turbulências no cenário global reforçam a importância da diversificação dos investimentos.
“O investidor naturalmente tem efeito retrovisor. Mas, quando se olha um período de cinco ou dez anos, nenhuma classe de ativos vence sozinha”, disse Ana Carolina Shibata, superintendente do Itaú. “A diversificação entre classes é fundamental. O cenário mudou muito nesses primeiros seis meses de 2025. A gente começou o ano muito otimista quanto à economia americana, e hoje, dada a volatilidade e todas as idas e vindas da política tarifária, a gente talvez esteja falando do fim do excepcionalismo americano”.
Essa transformação global também traz, segundo Francisca Brasileiro, sócia da TAG Investimentos, a oportunidade de rever a forma como os brasileiros constroem seus portfólios. “A construção de portfólio é o tema menos claro no processo de investimento, principalmente aqui no Brasil. Primeiro, pelo nosso histórico de juros elevados. Não tem nada mais destruidor para o mercado financeiro do que ativo livre de risco pagando 1% ao mês. Mas a gente sabe que você não constrói um portfólio olhando para o curto prazo. É fácil na teoria, mas difícil quando você conversa com o investidor. Diante de tanta incerteza vejo que o ponto principal é essa desconfiança com o que vai acontecer”.
Mas a internacionalização ainda enfrenta resistências. A primeira delas é o próprio CDI. “Com taxas orbitando em 14%, 15%, muitas famílias acabam postergando esse processo”, conta Ana Carolina, do Itaú.
A segunda é o câmbio. “A volatilidade do dólar assusta. É possível fazer hedge, mas há um custo, e o investidor precisa separar os riscos: não é só uma questão de alocar dólar, é uma questão de estar exposto a empresas de fora do Brasil, com outras dinâmicas e oportunidades”, disse Francisca.
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