Juros sobem no Brasil e caem nos EUA? Jakurski, Xavier e Stuhlberger debatem
Gestores se encontraram no BTG Macro Day e debateram o cenário econômico dos dois países
Há mais de um ano, as discussões sobre macroeconomia no Brasil e nos Estados Unidos se concentram em um tópico: juros. As últimas semanas colocaram esse tema ainda mais no centro. Chegou-se a cogitar que o Federal Reserve, o banco central americano, poderia chamar uma reunião extraordinária para reduzir os juros por lá de forma emergencial. Por aqui, o debate foi na direção contrária, com alguns agentes do mercado levantando a possibilidade de que o BC terá de elevar a Selic na reunião de setembro, o que desencadeou uma série de declarações dos membros do Copom. No painel já tradicional do BTG Macro Day que reuniu Rogério Xavier, sócio-fundador da SPX Capital, André Jakurski, sócio-fundador da JGP, e Luis Stuhlberger, sócio-fundador da Verde Asset, os gestores discutiram essas questões, com a moderação de André Esteves, chairman e sócio do BTG Pactual.
André Esteves iniciou a discussão refletindo sobre a volatilidade nas expectativas em relação à política monetária dos Estados Unidos. “Começamos o ano pensando que o Fed reduziria os juros em março”, lembrou ele. O cenário mudou logo nas primeiras semanas do ano. “E até 45 dias atrás, estávamos pensando que o corte só viria no ano que vem. Mas há duas semanas, começamos a discutir uma reunião extraordinária do Fed para reduzir juros de forma emergencial, porque a economia estaria à beira de uma recessão. Hoje, o mercado já vai para uma redução mais suave, começando em setembro com 25 basis points”, disse. Apesar dessa volatilidade nas expectativas, a economia americana segue em uma desaceleração gradual, “mais ou menos esperada”. Esteves então questionou qual a razão para mudanças tão drásticas de opinião em tão pouco tempo?
Na avaliação de André Jakurski, a economia americana continua trabalhando acima de seu potencial. Ele entretanto não nega a tendência de uma desaceleração. “O grande debate, imaginando que vai ter desaceleração, é o ritmo, se ela será suave ou mais agressiva”, disse. Apesar da expectativa de desaceleração Jakurski não vê urgência em que o Fed inicie o corte de juros.
“O problema dos EUA é orçamentário. A dívida precisa ser absorvida domesticamente, o que tende a manter os juros mais altos e consumir uma parte significativa do orçamento público. O gasto com juros já é equivalente ao gasto militar,” destacou.
Sobre a mudança de postura do mercado, Luis Stuhlberger defendeu que, em dezembro de 2023, o mercado estava otimista com cortes de juros de 175 pontos este ano, mas o Fed nunca deu a entender que faria cortes dessa magnitude Fed. “Hoje, eu diria que o mercado está mais racional, prevendo cortes, mas são cortes imensos e rápidos,” explicou Stuhlberger. Ele observou que, após mais de uma década de políticas monetárias frouxas, o “novo normal” para o juro neutro poderia se estabelecer em torno de 1,5%.
Com uma visão divergente, Rogério Xavier argumentou que o Federal Reserve foi sim responsável pelas expectativas otimistas com os cortes de juros a partir de março de 2024. “Quem colocou no mercado a expectativa de corte foi o [Jerome] Powell [presidente do Fed], em uma fala de dezembro para janeiro,” comentou Xavier.
Ele expressou ceticismo em relação à saúde da economia americana: “A ideia de que a economia dos EUA está bem não é inteiramente verdadeira. Há uma desaceleração clara, com o crescimento caindo de 3% no ano passado para 2% este ano, e o desemprego subindo mês a mês.”
Xavier também chamou a atenção para a fragilidade do mercado de habitação nos Estados Unidos, que ele descreveu como “anêmico” devido às altas taxas de juros. Sobre os mais recentes balanços das empresas norte-americanas, o gestor da SPX argumentou que os resultados estão bons, mas que o chamado guidance, que mostra as perspectivas das empresas para o futuro, são “preocupantes com relação à sustentação da demanda à frente”.
Ele também ressaltou que o cenário global, com economias em desaceleração na China e na Europa, não justifica o otimismo de que a economia americana permanecerá resiliente.
Além disso, o mercado tem reagido a diversos fatores geopolíticos, como o fortalecimento militar da China e a fragilidade econômica do país, e o que Jakurski chamou de “o novo eixo do mal” – China, Rússia, Irã e Coreia do Norte. Stuhlberger concordou, e defendeu que hoje o mercado não precifica corretamente as incertezas geopolíticas do cenário atual.
Soma-se a esse cenário de incertezas a eleição nos Estados Unidos. Segundo o gestor da JGP, uma vitória de Donald Trump ou de Kamala Harris traria diferentes impactos para a economia. Para Xavier, independente de quem for o candidato vitorioso, a eleição tem o efeito de “paralisia”. A incerteza sobre qual será o presidente no ano que vem, diz ele, faz com que empresas e pessoas físicas restrinjam seus investimentos.
Como ficam os juros no Brasil
Ao ser questionado sobre a avaliação que faz sobre o cenário doméstico, Jakurski destacou que “o Brasil está crescendo muito bem”, impulsionado pelo déficit fiscal elevado e pelo aumento da renda do trabalho. Ele mencionou que uma série de desembolsos, como o pagamento de precatórios, tem sustentado a economia.
Já Stuhlberger comentou a perda de credibilidade que o governo brasileiro teve ao divulgar a proposta de orçamento para o ano que vem, com base em premissas que chamou de otimistas para a arrecadação. Isso levou a uma turbulência no mercado doméstico e deu força à valorização do dólar. Foi nesse momento, diz o gestor, que o governo reagiu para conquistar a credibilidade, o que foi feito tanto nas comunicações do Banco Central quanto nos movimentos do executivo para controlar o déficit fiscal. “Eu não acho que o BC subiria o juro somente pela inflação estar fora da meta, mas ele ficou num corner [ficou encurralado]”, disse.
O gestor da Verde defendeu ainda que o déficit fiscal, considerando também as contas que estão fora do arcabouço, deve girar em torno de R$ 120 bilhões a R$ 130 bilhões, ou seja, perto de 1% do PIB. “É um País em que o governo está gastando 20,3% do PIB. Considerando as três esferas do governo, é mais de 37% do PIB”, disse. “Como a gente tem uma dívida que daqui a pouco vai estar perto de 90% do PIB, só para estabilizar, precisaríamos de um superávit de 2,5%”.
Ainda sobre a possibilidade de o BC elevar os juros na próxima reunião, Xavier pontuou que a troca de comando na autoridade monetária, com o fim do mandato de Roberto Campos Neto como presidente, também desempenha um papel relevante. Segundo ele, todos os presidentes do Banco Central precisam conquistar credibilidade ao assumir o cargo, o que geralmente leva a um aumento dos juros. Ele diz acreditar que Galípolo está em uma posição confortável para fazer esse movimento, já que a inflação ainda está acima da meta e a economia está crescendo acima do potencial. Segundo Xavier, essa é uma “oportunidade única” para o Banco Central elevar os juros, o que poderia permitir cortes futuros sem prejudicar a credibilidade da instituição.
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