Debêntures: quais são os seus direitos em caso de calote da empresa?
Saiba o que pode acontecer com a sua aplicação caso a empresa peça recuperação judicial, vá à falência ou precise renegociar os títulos de dívida emitidos
Por Marília Almeida
Com balanços pressionados pela inflação e os juros altos, além de uma maior restrição de crédito concedido pelos bancos, cada vez mais empresas renegociam debêntures emitidas no mercado.
São nomes como CVC, que estendeu o prazo de suas debêntures em março, e Hermes Pardini, que antecipou o resgate de seus títulos de dívida na semana passada.
Os casos mais problemáticos, no entanto, são o da Americanas e a Light, que seguem gerando dúvidas para uma série de pequenos investidores que detêm os títulos das empresas.
Isso porque em ambos os casos as companhias buscaram a Justiça para suspender o pagamento dos rendimentos da aplicação aos credores. Ou seja, deram o calote na dívida.
Veja abaixo quais são os principais direitos das debêntures em caso de calote, os chamados “defaults”:
Quais são os direitos debêntures em caso de calote?
Caso a companhia não honre com suas obrigações junto aos investidores, e deixe de pagar os juros ou o principal da dívida após o prazo previsto em contrato, é possível acionar algumas garantias.
O objetivo é fazer com que o debenturista receba o pagamento da dívida que a companhia contraiu.
As garantias são classificadas como real (que pode ser qualquer bem da companhia) ou flutuante (que recai sobre o ativo total da empresa). Há também as emissões sem garantias, que podem ser quirografárias ou subordinadas.
O pagamento das debêntures deve vir do fluxo de caixa gerado com as operações da companhia. Portanto, a garantia de uma debênture só deve ser executada em caso de calote.
A exceção é o caso da Americanas, que está em recuperação judicial. Se a garantia das debêntures da varejista recair sobre ativos da companhia que forem essenciais ao negócio, ela poderá ser suspensa, salvo se houver autorização judicial.
Veja abaixo como funciona cada tipo de garantia, segundo classificação da Anbima:
- Garantia real – os bens e direitos garantidos pela empresa na emissão não podem ser comprometidos. Portanto só podem ser negociados com aprovação dos debenturistas
- Garantia flutuante – assegura o privilégio geral sobre o ativo da empresa emissora, mas não impede que ela negocie os bens vinculados à emissão sem autorização prévia dos debenturistas
- Quirografária – emissões sem garantia ou preferência ao investidor em caso de liquidação da companhia
- Subordinada – emissões sem garantia ao investidor. Neste caso, se houver liquidação da companhia, há preferência de pagamento aos debenturistas em relação aos acionistas
Esta é a ordem de prioridade de pagamento das garantias, segundo a lei: garantia real, garantia flutuante (que recai sobre todo o ativo da companhia), quirografária (sem preferência como a flutuante), e subordinada (abaixo da quirografária, estando somente à frente do capital dos acionistas).
Quais recursos podem ser usados para evitar o calote?
E quando a empresa ainda não pediu recuperação judicial ou foi à falência, mas está enfrentando dificuldades para renegociar suas dívidas?
Caso não consiga efetuar o pagamento da remuneração das debêntures aos investidores a empresa pode entrar em um acordo com os debenturistas para renegociar as condições do título, que é conhecida também como reperfilamento.
Para atingir o objetivo, é necessário que pelo menos 50% dos debenturistas aprovem as novas condições. Conforme o contrato, esse porcentual pode ser maior e chegar a 75%, explica Marcos Sader, advogado especializado em societário e regulatório de mercado de capitais.
Outro recurso, utilizado pelo Hermes Pardini, é o resgate antecipado facultativo dos títulos e posterior cancelamento das debêntures antes do vencimento previsto. Essa possibilidade de resgate deve estar prevista na escritura de emissão das debêntures.
“O resgate antecipado facultativo é uma prerrogativa da companhia emissora, que deve estar prevista na escritura da debênture. No caso de uma reestruturação de dívida, essa previsão pode ser utilizada para permitir o pagamento de dívidas mais caras ou mais curtas com recursos captados por outros instrumentos de dívida ou equity. Em caso de novas dívidas, é normal que o credor peça mais garantias ou a conversibilidade em ações para compensar o maior risco.”
Agente fiduciário: proteção aos investidores
Em caso de calote, quem comprou a debênture de forma direta fica menos protegido do que o investidor que optou por adquirir as debêntures via fundos? Não, graças à figura do agente fiduciário.
O agente fiduciário é uma empresa autorizada pela CVM responsável por defender os interesse dos debenturistas.
A figura está prevista em toda oferta, explica Sader. “Não importa o tamanho do investidor: ele irá defender seus interesses. Grandes debenturistas, contudo, não deixam apenas o agente fiduciário agir: também buscam contratar assessores para defender seus próprios interesses”.
O caso Light
O caso da Light consegue ser ainda mais problemático do que o da Americanas.
A varejista pediu recuperação judicial e agora tem obrigações a cumprir para conseguir concluir esse processo. Já a Light, como concessionária de serviço público, está impedida de pedir recuperação judicial. Ainda assim, vem obtendo decisões favoráveis na Justiça para que não pague a remuneração devida aos seus credores.
O advogado José Roberto Neves, do escritório FCDG, está assessorando uma parte dos debenturistas da concessionária de energia que atua no Rio de Janeiro.
“As decisões judiciais são liminares e vamos recorrer. O investidor aplica dinheiro em concessionárias públicas porque tem a segurança, por lei, de que ela não poderá recorrer à Justiça. A empresa não pode mudar a lei e criar uma insegurança para todos os investidores”.
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