Renda fixa

Tesouro Direto ou ETF de renda fixa: qual a diferença?

Entenda o que muda em termos de tributação, operação e liquidez

Com o recente vencimento de R$ 260 bilhões em títulos do Tesouro IPCA+, muitos investidores que não tinham um destino planejado para esse dinheiro tiveram de realocar seus recursos. Entre as diversas sugestões das casas de análise e plataformas, os ETFs de renda fixa se destacaram. Esses produtos são fundos de investimento, cujas cotas são negociadas na bolsa de valores e que seguem algum índice de referência, como o IMA-B (um dos índices mais conhecidos da renda fixa brasileira). Mas isso trouxe diversas dúvidas aos investidores. Afinal, os ETFs são muitas vezes entendidos como produtos de renda variável. Então, como funciona esse investimento quando a carteira do fundo é composta por ativos de renda fixa? O Bora Investir conversou com especialistas para explicar.

O que são ETFs de renda fixa

ETFs, ou exchange-traded funds, são fundos de investimentos cujas cotas são negociadas na bolsa de valores. Quem compra uma cota (o que é feito da mesma forma como a aquisição de uma ação) está comprando uma parte da carteira desse fundo de investimento.

Existem ETFs focados em ações, em commodities, em criptomoedas, e os focados na renda fixa. Ou seja, as carteiras dos ETFs de renda fixa são compostas por ativos de renda fixa. A maioria dos fundos desse tipo disponíveis hoje na B3 compra títulos do governo, ou seja, em papéis do Tesouro Direto.

Então, mesmo que a “casca” do produto (o ETF) seja de renda variável, os ativos que estão dentro dele são de renda fixa.

Como variam as cotas dos ETFs de renda fixa?

De uma forma similar à variação dos preços dos títulos de renda fixa: pela marcação a mercado. Quando um investidor compra um título do Tesouro Prefixado ou IPCA+, a rentabilidade que aparece na plataforma só é garantida caso mantenha o dinheiro investido até o vencimento do título. Entre a data da compra e o vencimento, no entanto, o preço do título pode mudar, e isso é a marcação a mercado.

Quer um exemplo? Os títulos prefixados do Tesouro são desenhados de forma a pagar, no vencimento, R$ 1.000 por unidade. Na data de hoje (28/08/2024), um título prefixado no Tesouro Direto com vencimento para 01/01/2027 oferece a rentabilidade de 11,53% ao ano. Assim, o preço do título hoje é calculado a partir dessas duas variáveis: qual o valor que, atualizado por essa taxa para esse prazo, resulta em R$ 1.000 no vencimento. Esse preço (também considerando o dia de hoje) é de R$ 775,54. Ou seja: quem comprar esse título receberá, no vencimento, o valor de R$ 775,54 mais uma taxa de juros de 11,53% ao ano, o que resulta em R$ 1.000 na data de vencimento.

A taxa, no entanto, é calculada de acordo com o que o mercado demanda naquele dia para esse prazo. E o importante para entender a marcação a mercado é saber que as condições de mercado podem mudar. Suponhamos que daqui a uma semana, o mercado demanda uma taxa mais alta para esse prazo, de 13%. O título comprado hoje ainda valerá, no dia 01/01/2027, os mesmos R$ 1.000 acordados no momento da compra. Mas se o investidor que comprou esse título hoje quiser vendê-lo na semana que vem, terá de ir para o chamado mercado secundário, e vender seu título a outro investidor.

Acontece que, na semana que vem, esse outro investidor está demandando uma rentabilidade maior, de 13%. Esse “ajuste” necessário na taxa é feito no preço do título, que acaba se desvalorizando em relação ao preço pago na data de entrada. O contrário também é verdadeiro: se a taxa de mercado cair a 9%, o título irá se apreciar e pode ser vendido no mercado secundário com ágio (lucro).

A regra de ouro aqui é: quando as taxas sobem, o preço dos títulos cai. E quando as taxas caem, o preço dos títulos sobe.

Um ponto importante é que quanto mais longe o vencimento do título, mais fortes são as oscilações.

Da mesma forma como um título único (no exemplo, o Tesouro Prefixado para 2027) sofre a marcação a mercado, os preços das cotas dos ETFs de renda fixa também variam. Nesse caso, a marcação a mercado da cota do fundo vai considerar os preços atualizados de todos os títulos que compõem esse fundo.

Diferenças entre comprar ETFs de renda fixa e ativos de renda fixa diretamente

Operacional

Quem defende os ETFs de renda fixa normalmente cita o fato de o cliente não precisar reinvestir o dinheiro depois que o título vence. “É mais fácil para quem quer investir de forma regular e perene”, diz Raquel Zucchi, head de research da Investo. Além de não precisar reinvestir, se a pessoa faz pequenos aportes a cada mês, ela não precisa se preocupar em escolher o vencimento do Tesouro Direto que está disponível. Basta comprar mais cotas do ETF escolhido.

Por outro lado, a dinâmica da compra das cotas dos ETFs é diferente a compra de um título de renda fixa. O investidor precisa acessar a área do home broker de sua corretora ou banco, e emitir uma ordem de compra para aquele fundo. Quem compra ações, por exemplo, já está acostumado com essa mecânica, mas pode ser uma novidade para os novatos.

Disponibilidade de papéis

“A grande maioria dos ETFs [de renda fixa] tem uma vantagem, que é a disponibilidade de determinados títulos que não existem para as pessoas físicas. Um ETF pode, por exemplo, ter uma alocação majoritária nas NTN-Bs [Tesouro IPCA+] com vencimentos em 2025, 2026 e 2027. Hoje, se o investidor procura uma NTN-B curta, a primeira é para 2029”, complementa Yuri Alves, economista da Guide Investimentos. Isso importa porque quanto maior o prazo do título (ou a chamada duration da carteira ou do título individual), maior a volatilidade dos preços.

Tributação

Uma diferença importante entre as duas opções é quanto aos impostos. Os títulos de renda fixa são tributados de acordo com a tabela regressiva do imposto de renda. Nesse caso, a alíquota cobrada varia de acordo com o tempo em que o dinheiro ficou investido: quanto maior o prazo, menor a alíquota.

  • Até 180 dias – 22,5% sobre os rendimentos
  • De 181 a 360 dias – 20% sobre os rendimentos
  • De 361 dias a 720 dias – 17,5% sobre os rendimentos
  • Acima de 720 dias – 15% sobre os rendimentos

Já nos ETFs de renda fixa, a alíquota é sempre de 15%, independente do prazo. Em ambos os casos, o imposto de renda é retido na fonte. Assim, o cliente recebe o valor já descontado o tributo, sem a necessidade de fazer um pagamento ao fisco.

Liquidez

Tanto nos ETFs quanto nos títulos do Tesouro Direto, o investidor pode fazer o resgate do capital a qualquer dia útil. No caso de outros títulos de renda fixa, como debêntures, Certificados de Depósitos Bancários (CDBs), Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), é preciso avaliar caso a caso. Há papéis que permitem esse resgate a qualquer momento (a chamada liquidez diária), mas outros só devolvem ao investidor os valores na data de vencimento.

Gestão dos ativos x seleção dos ativos

“Eu acho que uma coisa extremamente vantajosa do ETF é a reponderação da carteira, ou seja, a reciclagem”, diz Alves, da Guide. Ele exemplifica: imagine um investidor que comprou um título IPCA+ com taxa de 6,30% ao ano. Se a taxa cai para 6,10%, esse investidor pode ter um lucro se vender o título. No entanto, muitas vezes não faz isso por não saber se vale a pena. Num ETF, o gestor tem esse papel.

Elaine Borges, professora doutora de Finanças da USP, também cita como benefício do ETF essa gestão. “Um ETF conta com um profissional especialista, que está acompanhando os títulos e tem condição de fazer as melhores escolhas. É um trabalho que tem um valor”, diz. No entanto, isso tem um preço: as taxas. Elas costumam ser mais baixas nos ETFs do que em fundos abertos, mas vale sempre a pena observar antes de investir.

Por outro lado, quem optar pelo ETF não tem como escolher exatamente os papéis que terá naquela carteira. Quem compra os ativos diretamente “tem a liberdade de tomar essa decisão de maneira alinhada com as suas preferências” e objetivos financeiros, lembra Alves.

Garantia da taxa contratada

Segundo Raquel, comprar diretamente o título é uma boa opção quando a pessoa quer garantir a taxa oferecida no momento da compra até o vencimento. Se você tem um destino certo para aquele capital (com a compra de uma casa, por exemplo), e encontrar um título com vencimento perto do prazo que você tem, comprar o papel diretamente pode ser uma boa opção.

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