Para gestores macro, cenário global é de valorização do dólar
Movimentações dos EUA estão no centro das discussões sobre a economia global
“Os Estados Unidos claramente são o grande tema do cenário global”. Essa foi a primeira frase, de Rodrigo Azevedo, fundador e gestor das estratégias macro da Ibiuna Investimentos, em um dos painéis sobre macroeconomia do LAIC 2025, evento organizado pelo UBS e que acontece em São Paulo nesta terça-feira.
Essa fala não foi importante apenas por ser a primeira, mas porque resume muitas das discussões entre Azevedo, Carlos Viana de Carvalho, Head de Research da Kapitalo Investimentos, e Bruno Serra, Portfolio Manager do Itaú Janeiro.
Mas a centralidade dos EUA na discussão não é novidade. Há um ano e meio, a maior economia do mundo concentrava as atenções porque o mercado esperava ansioso pelos movimentos de política monetária: primeiro, sobre até quando os juros iam subir, depois quando começariam a cair, e até quanto. No segundo semestre, mais pacificada a discussão sobre os caminhos do Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos), as atenções se voltaram para a eleição presidencial.
“É importante ver o que estava acontecendo antes da eleição de [Donald] Trump. Os EUA estavam crescendo de maneira muito resiliente, apesar do aperto monetário”, lembrou Azevedo. “Na quinta-feira teremos os dados sobre o PIB, e a economia vem mostrando uma resiliência muito forte. Em paralelo, a taxa de inflação está longe da meta, não está voltando para aqueles 2%. O mercado de trabalho está super apertado, em pleno emprego. Não é um ambiente em que os juros iriam cair muito”, detalhou.
As propostas do republicano Donald Trump reforçam ainda mais essa ideia de que os juros não devem ser reduzidos de forma importante. Ideias como redução de impostos, desregulamentação, aumento das tarifas de importação e controle da imigração tendem a levar a um crescimento maior da economia no curto prazo e mais inflação. “É um cenário que no curto prazo é muito bom para os EUA, e que vai atrair recursos para lá”, resume Azevedo.
Há, entretanto, espaço para incertezas. Em primeiro lugar, existem dúvidas sobre como será implementada na prática a política de tarifas de Trump. Além disso, apesar da expectativa de inflação e dólar mais forte no curto prazo, desenhar o que vai acontecer no médio prazo é mais difícil.
Carlos Viana de Carvalho, da Kapitalo Investimentos, enfatiza essa incerteza. “A forma como Trump toma decisões e as comunica é algo novo”, disse. “Há ainda a conjuntura específica de países onde economia desacelerou e inflação caiu, casos como do Canadá, Suíça e zona do Euro. Então há esse elemento de uma perda de sincronia dos ciclos monetários”, afirmou.
Nesse contexto, entender o que levou a essa exceção do caso americano é fundamental, afirmou Serra, do Itaú. “Houve um crescimento de produtividade acima do G10 e maioria dos emergentes. Apesar da alta do PIB desde a pandemia, o desemprego aumentou. Ou seja, todo o crescimento veio de produtividade. Isso ilustra a força da economia americana e como ela se tornou esse aspirador de sugar dólar para o país”.
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Brasil
Os ex-diretores do BC também discutiram suas perspectivas para o Brasil. Entre eles, é consenso que a economia brasileira deve desacelerar em razão da elevada taxa de juros, e para eles é um processo necessário para levar a inflação mais perto da meta.
“Mas o Brasil vem surpreendendo em termos de crescimento há alguns anos. Dá um certo medo de fazer um call de que economia vai desacelerar, eu errei esse call seguidamente desde 2022”, comentou Carlos Viana de Carvalho. Mesmo assim, ele diz acreditar em um aperto das condições de crédito que vai levar a uma desaceleração da economia. “E o grande tema nesse cenário são impactos políticos dessa mudança”, disse.
Serra, do Itaú, destacou o nível do aperto monetário atual. “Esse nível de juro real a gente não vê desde antes do período que o Rodrigo [Azevedo] esteve no BC, tem que voltar 20 anos na história para ver juro real tão alto”, lembrou. “O crescimento econômico é o que me preocupa mais. A gente tem uma escolha a fazer. A gente vai permitir que desaceleração traga a inflação para baixo ou não? É escolha que o governo vai fazer”.
Rodrigo Azevedo lembrou ainda que a desancoragem das expectativas de inflação é algo que preocupa. “Houve um descolamento da meta muito relevante, muito consistente e muito grande”, disse. O problema disso, segundo ele, é que dificulta ainda mais o trabalho do BC em levar a inflação à meta. “Existe uma relação entre desinflação e desaceleração da economia ou recessão. Só que esse parâmetro depende muito da expectativa de inflação. Se a expectativa está desancorada, o tamanho da desaceleração necessária para trazer a inflação para baixo é muito grande”, disse.
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