Entrevistas

Da renda fixa à bolsa: Vitor Duarte, da Suno, explica onde ainda há boas oportunidades – e onde é hora de cautela

Com juros ainda elevados e um mercado de crédito muito demandado, diretor de investimentos da Suno Asset, avalia que a renda variável pode voltar ao radar

Mesmo com a Selic em dois dígitos, o mercado financeiro já se prepara para um início de queda de juros em 2026. Apesar dos riscos, isso pode recolocar a renda variável no mapa de oportunidades para os investidores brasileiros. Para Vitor Duarte, diretor de investimentos da Suno Asset, a alocação de investidores locais está em níveis historicamente baixas atualmente. “A bolsa está batendo recorde por fluxo externo, mas o investidor local ainda não voltou. Os fundos multimercados estão machucados, os fundos de ações não têm dinheiro, e o apetite a risco é baixo”, explica.

Enquanto isso, o movimento contrário acontece na renda fixa. O excesso de demanda por debêntures incentivadas, por exemplo, vem comprimindo os prêmios e criando distorções de preço. “Tem empresa grande emitindo papel pagando menos que o Tesouro”, afirma Duarte. Para o investidor, o cenário reforça a importância de olhar com cuidado onde ainda há espaço para retorno – e onde o risco já não compensa o ganho.

Vitor Duarte, diretor de investimentos da Suno Asset

Bora Investir: Queria começar falando um pouco do cenário macro aqui de Brasil. Sem a aprovação da MP 1303, o governo agora busca soluções para a questão fiscal. A Selic ainda está em 15%. Como você avalia o cenário nesse momento?

Vitor Duarte: Com os gastos insistentemente altos, o governo busca novas fontes de financiamento. O resultado é uma inflação resiliente. É por isso que o Banco Central, que tem mantido sua independência, não vai baixar a taxa de juros agora em dezembro. A Selic vai ficar mais alta por um pouco mais tempo do que poderia. E eu acho que o movimento de queda vai ser um movimento mais suave. De qualquer forma, é um movimento de queda de taxa de juros.

Isso ajuda os investidores a olhar de novo para o mercado de renda variável, que está abandonado. A bolsa está batendo recorde por questões de fluxo externo, mas ninguém está comemorando porque ninguém tem ação. Os fundos multimercados não têm ação, os fundos de ações não têm dinheiro, porque sofreram bilhões de resgate

Bora Investir: O que é preciso para que o investidor brasileiro volte para a renda variável?

Vitor Duarte: A taxa de juros cair efetivamente. Se você olhar a curva de juros, o DI para janeiro de 2028, daqui a dois anos e pouco, está apontando para uma média de 13%. Se hoje a gente tem a Selic 15%, isso significa que o mercado precifica que em algum momento a taxa vai bater 12% e alguma coisa, e ficar por muito tempo, ou demorar para cair e bater 11%. Os grandes investidores, que operam esse mercado, olham para isso. Mas a população em geral, que compra CDB de grandes bancos, não sabe que a taxa vai cair. O que faz o investidor de varejo mudar a posição é a taxa Selic spot, a taxa Selic do momento.

Bora Investir: Mas mesmo os grandes investidores locais estão com baixa alocação em bolsa, como você comentou, os fundos multimercados, por exemplo, estão com baixa posição em renda variável. O que pode fazer essa alocação mudar?

Vitor Duarte: Os multimercados estão muito machucados. Muitos não conseguiram superar o CDI. Foi uma indústria que acertou pouco nas suas convicções. E tomou muito resgate nos últimos anos.  Isso faz com que a tolerância a risco desse pessoal esteja menor.  Poucos vão querer tomar o risco e comprar bolsa agora pensando que, lá na frente, a bolsa vai valorizar. Eles vão querer entrar no instante anterior que for começar a festa. Eles não querem ficar lá esperando, porque se você compra bolsa e demora três meses para subir, são três meses de CDI que você perdeu. Então, eles também não estão muito com apetite a risco. Estão tentando preservar capital ao máximo para poder proteger o business, para não tomar resgate. Esse é o comprador que poderia tomar risco mas decidiu não tomar risco. 

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Bora Investir: Você comentou que a Suno hoje tem, em todas as verticais que atua, versões de fundo de crédito. Como que está esse mercado? Se falamos que o mercado de ações está sem dinheiro, é porque, em parte, esse dinheiro foi para a renda fixa, e grande parte, em crédito privado.

Vitor Duarte: O mercado de crédito tem suas divisões também. O mercado para debênture incentivada está bizarramente muito demandado. Tem dinheiro sobrando, saindo pelo ladrão. E isso pressiona o preço dos ativos. Vi recentemente uma debênture incentivada de uma grande empresa pagando remuneração 1% menor que o título público: o título público está a IPCA+8%, a debênture estava a IPCA+7%, não faz o menor sentido.

Então, está difícil achar algum papel no spread positivo gordinho. Isso porque teve muito uma injeção de recursos muito, muito forte. 

Agora, não tem dinheiro para imobiliário nem para agro. Os fundos imobiliários há muito tempo não fazem follow on, não crescem. E no caso dos Fiagros, depois da sacudida do último um ano e meio, nenhum fez follow on. Então não tem dinheiro novo para CRA.

Bora Investir: No caso dos fundos imobiliários, por que acontece essa retração dos investidores?

Vitor Duarte: Eu acho que os fundos imobiliários, de maneira geral, estão saudáveis, porque eles não fazem só obra. Fazem BTS (Built to Suit), um crédito corporativo, tem outras coisas. Então, o problema que eles enfrentam não está no ativo, está passivo. E por que não tem dinheiro entrando nos fundos imobiliários? Porque [as cotas dos] fundos imobiliários caíram. De maneira geral, estão abaixo do valor patrimonial, e por isso não fazem follow on. É um cenário complicado para esse mercado captar.  E por isso que as taxas estão altas. Quando não tem dinheiro novo, o tomador tem que pagar mais caro. Que é o melhor momento para você investir.

Bora Investir: Queria falar também do cenário externo. A gente vê bolsas americanas batendo máximas e há expectativas de queda de juros nos Estados Unidos também. Você vê espaço para bolsa americana subir mais?

Vitor Duarte: Aqui na Suno, a gente é muito aqui do stock picking, do bottom up, para a selecionar ativo por ativo. Tem ativos nos Estados Unidos que são muito caros, a gente não tem coragem de comprar.  Mas ainda existem algumas oportunidades. Nas nossas carteiras, por exemplo, a gente carrega algumas empresas. De maneira geral, o múltiplo está realmente bastante esticado, mas como a perspectiva de taxa de juros é caminhar para 3% a 3,25%, ainda tem algum espaço para subida. O problema dos Estados Unidos é que a política comercial do Trump é uma política de enfraquecimento do dólar. Então, se você compra uma ação de uma empresa americana e ela sobe 10%, o dólar pode cair 10%. Acho que o risco da Bolsa americana é esse, é o risco da dolarização. Talvez o investidor possa escolher empresas mais internacionalizadas. O Google é um bom exemplo, é uma empresa que tem receita em euro, tem receita em dólar, tem receita em iene, tem receita em lira turca, tem receita em real.

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