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De Animal Crossing a EVE: conheça games que se sofisticaram ao lidar com o mundo financeiro

Eles simulam o mercado financeiro, têm Banco Central - e até cortam juros

Jogos como Animal Crossing: New Horizons EVE Online se espelharam em aspectos da vida real para criar seu próprio sistema financeiro. Outros, como Tibia, têm sua economia virtual prejudicada por consequências do mundo real.

Pois bem, videogames crescem cada vez mais entre os brasileiros. De acordo com a pesquisa Game Brasil 2022, 74,5% da população joga algum tipo de game, desde o novo lançamento de grandes estúdios ao joguinho de foguete.

Assim, games e economia são ingredientes que parecem separados por uma realidade virtual, mas misturá-los pode levar o player a gastar mais tempo jogando.

Para criar um game, os desenvolvedores precisam tornar esse sistema atrativo. Afinal, o jogo ganha ou perde valor com base na quantidade de tempo que players passam dentro dele.

E uma boa economia pode ajudar nisso.

Economia da vida real pode inspirar games

A economia na vida real é um assunto bastante complicado. Investimentos, finançasjurosinflação: tudo isso nos afeta de alguma forma todos os dias. Mas um videogame pode simular a vida real em muitos aspectos.

Se esse trabalho é cumprido de forma engenhosa, é graças ao trabalho de desenvolvedores, como Rennan Gonçalves.

Rennan lida com a economia nos videogames e afirmou à Inteligência Financeira que alguns jogos têm um sistema muito parecido com o do mundo real.

Ele tem sua própria marca de jogos de tabuleiro, a Maloca Games, que produz games com temáticas voltadas para a cultura de matriz africana e da periferia.

“Acho que é importante a gente entender que, quando falamos da economia de um jogo, não necessariamente ela simula o mundo real”, diz o dev.

Contudo, há economias desenvolvidas para os jogos onde vários players jogam no mesmo mundo. Esses são os jogos chamados de MMOs (Massivos de Multijogador Online, na sigla em inglês).

Inflação, profissões e salário no videogame

Um desses jogos é o EVE Online, um MMO RPG no qual os players procuram ganhar a vida no espaço. A humanidade busca os melhores planetas para estabelecer colônias dentro da Via Láctea, e o jogador pode viajar dentro deste universo.

Assim como na vida real, o mundo do game tem uma economia com inflação e variação de preços por oferta e demanda.

“O preço de um determinado recurso é influenciado pelo local onde ele é vendido, e na quantidade de pessoas que estão lá comprando”, afirma Rennan.

Nesse caso, ao player é oferecido um dilema: ou ele arrisca pagar mais caro ou mais barato em outra região, ou ele se rende ao preço local.

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É, como destaca o desenvolvedor, um processo de risco e recompensa, uma isca para que o player aprenda mais sobre o jogo e como ele pode gastar seu XP.

Outro destaque que torna o mundo de EVE Online diferente de outros games é que as pessoas têm, literalmente, profissões.

Trabalho mesmo, onde você ganha dinheiro por cumprir um papel dentro da sociedade.

É possível, por exemplo, trabalhar como um operário para produzir naves espaciais. Dá para assumir uma carreira militar e ser capitão de uma fragata espacial. Tudo isso remunerado.

Mercado de renda variável com dividendos em… nabos?

Era uma vez um game para os jovens que simulava investimentos no mercado de renda variável!

Parece complicado. Mas a Nintendo, estúdio de games japonês responsável pelo famoso encanador italiano Mario, botou essa ideia para funcionar.

Já o Animal Crossing: New Horizons, lançado em março de 2020, é um game com uma economia baseada no mercado financeiro.

No jogo, você faz parte de uma comunidade de animais falantes (a princípio parece simples), mas pode guardar dinheiro no banco e investir usando… nabos. Sim, nabo, o vegetal que você coloca – ou deveria colocar – na salada.

O game usa uma lógica do mercado financeiro de vender um ativo em alta ou em baixa.

Funciona assim: no domingo de manhã (no horário do Nintendo Switch do jogador), o player encontrará em sua ilha uma vendedora de nabos.

A partir da compra dos nabos, a Nintendo elaborou um sistema de oscilação da “commodity”.

Existem as oscilações pequenas, cuja variação pode ser de 90% a 140%. Essa fase dura nos primeiros dias após a compra dos nabos.

Cerca de três dias depois, vem a fase mais animada, a “big spike”. Ela garante retorno de 200% a 600% do preço inicial dos nabos.

Animal Crossing tem um Banco Central – e já cortou a Selic

Animal Crossing: New Horizons também tem um sistema financeiro que inclusive conta com seu próprio Banco Central. No caso, o Bank of Nook é a autoridade financeira do game, e ele já fez cortes na taxa de juros do jogo.

Explico o porquê: jogadores estavam guardando muito dinheiro na conta bancária do Bank of Nook. Ou seja, não estavam gastando na economia do jogo, engajando o sistema… Seja comprando nabos ou pegando empréstimos para financiar suas casinhas.

Então, em uma decisão que afetou milhares de jogadores, a Nintendo — ou melhor, o BoN — cortou a taxa de juros para estimular a economia.

Os juros pagos aos jogadores por depósito caiu de 0,5% para 0,05%. Essa manobra do estúdio de games foi destaque até no Financial Times, um dos jornais de economia mais respeitado do mundo.

O vilão da economia nos games também é a inflação

Videogames mais complexos criam suas economias com influência do que acontece para além da tela. Mas essa economia no mundo dos games pode, às vezes, ser alvo de trapaças por jogadores.

Tal como na economia brasileira, um dos principais vilões de uma economia de videogame é a inflação.

“Uma má organização no gotejamento dos recursos, ou então uma má simulação ou análise pode gerar um problema de inflação”, explica Rennan.

A oscilação de preço pode acontecer quando a economia do jogo disputa com a economia do mundo real. São casos de jogos com um “mercado paralelo”.

Em Tibia, um MMO RPG de 1997, alguns players criaram uma inflação do gold, a moeda do jogo, por venderem itens raros por bitcoin.

Foi descoberto pela Bloomberg que a venda de itens dentro do Tibia pela criptomoeda era feita principalmente por jogadores venezuelanos. Isso porque, desta forma, eles obtém uma renda extra para aguentarem a inflação da própria Venezuela, acima de 300% ao ano.

“Esse tipo de problema é basicamente inevitável. Por mais que talvez não seja possível vender o recurso diretamente para uma pessoa, o jogador pode vender a conta. Isso inflaciona a economia de forma absurda, pois foge da experiência e da expectativa do que foi planejado pelos desenvolvedores. Talvez ela não suporte o impacto, e daí, com certeza vai falhar”, pondera Rennan.

Dá para aprender economia jogando videogame?

Ô se dá. Existe uma categoria de games voltada para o jogador que apenas gosta de gerir recursos e criar sua própria civilização.

Todos os jogos acima replicam a economia do mundo real. Mesmo sem um pingo de conhecimento sobre o mercado de ações, o jogador de Animal Crossing sabe o princípio de compra e venda — o mesmo que guia o investidor em meio à oscilação dos papéis na bolsa de valores.

+ “Conseguimos aprender economia até em jogos que não têm finanças tão arrojadas. Porque o sistema depende de um conceito: o custo de oportunidade. Isso tem a ver com escassez e valor. Jogos obrigam o player a avaliar o que que é mais vantajoso.” Rennan Gonçalves, desenvolvedor de jogos

Nesse sentido, os videogames são uma forma mais intrínseca de aplicar o conhecimento em economia — por maior ou menor que seja — de uma forma empírica, opina Rennan.

Você não vai sair do sofá ou cadeira gamer sabendo os macetes do day trade, mas vai entender melhor como funciona o preço de algum produto que consome no dia a dia.

Fizemos uma lista para os amantes de finanças e gerenciamento com cinco jogos que podem ensinar bastante sobre economia:

  • Animal Crossing: New Horizons (Nintendo) – a partir de R$ 289,99 (Shopee)
  • Sid Meyer’s Civilization VI (Firaxis Games – R$ 129 (Steam)
  • Offworld Trading Company (Mohawk Games) – R$ 23,19 (Steam)
  • EVE Online (CCP) – gratuito (Steam)
  • Frost Punk – a partir de R$ 14,99 (Steam, Xbox One, PS4)