Por que imprimir mais dinheiro não acaba com a crise
A ideia é tentadora, mas gera inflação, o que anularia seu benefício para a população. Entenda
O próximo governo eleito – seja ele qual for –, terá de encarar um orçamento bastante apertado. As contas públicas estão no vermelho. A prévia do Projeto de Lei Orçamentária estima que, em 2023, haverá um déficit de até R$ 40 bilhões nas contas do governo federal. Mas o rombo pode ser ainda maior.
Na prática, isso significa contar com menos dinheiro para investir em Saúde, Educação e Segurança, apenas para ficar em três temas sensíveis que, certamente, interessam a todos e estão no radar dos eleitores.
Mas por que, em vez de cortar despesas ou aumentar impostos, duas soluções clássicas e doloridas, o Banco Central não aproveita e simplesmente passa a imprimir dinheiro para pagar suas dívidas e aquecer a economia?
O principal motivo para evitar essa saída, que parece tão simples, é a inflação. Com mais recursos à disposição na praça, é de se esperar que pessoas físicas e empresas acabem topando pagar mais por produtos e serviços. Com valores subindo, puxados pela simples lógica da oferta e da procura, a inflação tende a sair do controle. Aí, por mais que você tenha mais dinheiro circulando, o valor dele diminui, anulando a vantagem que o consumidor tinha inicialmente.
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Apesar de essa ideia ser considerada absurda entre os economistas mais ortodoxos, saibam que a vontade de aumentar a circulação reais no Brasil ressurgiu no auge da pandemia de Covid-19, há cerca de dois anos.
Naquele momento, diversos especialistas, inclusive ex-presidentes do BC, sugeriram que o governo aproveitasse a situação, de grave desaquecimento econômico, para aumentar a base monetária – a quantidade de dinheiro em circulação –, sem correr tantos riscos assim de aumentar também a inflação. Porém, o medo de que os preços disparassem falou mais alto e o debate foi encerrado.
Imprimir dinheiro é a única maneira?
Ao contrário do que está no imaginário popular, o aumento da base monetária – que é a quantidade de recursos e moeda em circulação no mercado – provavelmente não aconteceria apenas por meio de emissão física de cédulas, com máquinas de fazer dinheiro trabalhando a todo vapor para tirar do forno notas quentinhas.
Caso a opção tivesse sido essa, o Banco Central turbinaria a economia de uma forma indireta. A autoridade monetária teria condições, por exemplo, de injetar recursos no sistema comprando títulos de instituições financeiras que, uma vez capitalizadas, poderiam ampliar empréstimos à sua base de clientes.
O governo também poderia atuar em outras duas frentes: comprando títulos de dívidas ou recebíveis de empresas ou ainda emitindo novos títulos públicos, por meio do Tesouro Nacional, para se financiar.
Fosse imprimindo dinheiro desenfreadamente ou por mecanismos de incentivo ao crédito, o risco de inflação é gigante – ainda mais num país que conviveu décadas com uma hiperinflação.
Sempre que se imprime dinheiro há inflação?
Se a injeção de novas cédulas não tiver o objetivo de ampliar a base monetária, não há como usar esse argumento para justificar a inflação. Aliás, como você já deve ter notado ao utilizar dinheiro físico, o BC, de tempos em tempos, encomenda à Casa da Moeda – que é uma empresa estatal – a fabricação de cédulas para substituir as antigas ainda em circulação.
O órgão que autoriza a emissão de cédulas no país é o Conselho Monetário Nacional (CMN). O volume de notas é calculado tendo como base, entre outros fatores, o ritmo da economia no momento. Em 2020, por exemplo, o BC antecipou a impressão de R$ 9 bilhões em dinheiro vivo por causa do “entesouramento” de notas no país. Como naquele momento, um dos picos da pandemia de Covid-19, muitas pessoas diminuíram as saídas de casa, o movimento físico do comércio caiu drasticamente devido às medidas de isolamento social e houve quem guardasse recursos recebidos em espécie. As notas pararam de trocar de mãos na velocidade habitual.
A produção extra de dinheiro, naquele mesmo ano, também foi uma medida de precaução que permitiu que mais de 60 milhões de pessoas vulneráveis tivessem acesso às notas necessárias para receber o auxílio de R$ 600, proporcionado pelo governo.
E a nota de R$ 200?
A produção de dinheiro físico novo também é necessária, claro, sempre que o país lança uma nova cédula. A última vez que isso aconteceu foi em setembro de 2020. Na ocasião, o Banco Central mandou imprimir 450 milhões de notas de R$ 200, cuja imagem homenageia o Lobo-Guará.
E por que um valor mais alto? De acordo com a autoridade monetária, a escolha possibilita saques maiores, com uma quantidade menor de cédulas, caso fosse necessário e houvesse aumento de demanda, durante a pandemia. Em março daquele ano, a quantidade de dinheiro em circulação era de aproximadamente R$ 260 bilhões. Já em agosto, o volume saltou para R$ 350 bilhões.
Outros caminhos para melhorar as contas do governo
Quando se trata de pouco dinheiro nas contas públicas, não há apenas uma receita de bolo a ser colocada em prática. Nem mesmo um único remédio, milagroso e infalível, com eficácia garantida.
Em geral, os economistas indicam duas saídas clássicas para esse tipo de problema. Uma delas – talvez a mais conhecida e mencionada – envolve o corte de despesas. Nessa hipótese, o desafio é saber o que cortar, já que muitos recursos são “carimbados”. Ou seja, já têm destinação certa, como pagamento de salários de funcionários públicos. Aqui, não há flexibilidade para poder usar o dinheiro em outra coisa.
Outra saída seria atacar o lado das receitas, aumentando os impostos para arrecadar um volume maior de dinheiro e, a partir daí, ter mais recursos para investir. O desafio aqui é político, uma vez que esse assunto costuma gerar desgastes do governo com o Legislativo, com determinadas categorias profissionais organizadas e, no limite, até mesmo com a população em geral.
Como no mundo dos investimentos, administrar as contas de um país é trabalhoso, exige estudos e requer bastante experiência para saber o que costuma funcionar ou dar errado para a economia.
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