Como juros, inflação e dólar afetam diferentes setores da Bolsa?
Indicadores macroeconômicos afetam ações de formas distintas, e saber interpretá-los pode ajudar na tomada de decisão de investimento
Por Maeli Prado
Taxa de juros, inflação, dólar. Quem investe na Bolsa com certa frequência sabe que esses indicadores macroeconômicos impactam de forma diferente as ações de setores específicos.
Saber interpretá-los pode ajudar a traçar um pano de fundo coerente para as escolhas do investidor, ao lado, é claro, das análises específicas sobre o desempenho esperado para cada empresa.
O Bora Investir conversou com especialistas sobre as principais dicas para quem quer aprimorar suas decisões de investimento com base nesses indicadores. Confira abaixo.
Taxa de juros
O sobe e desce dos juros futuros tem impacto sobre todas as ações, já que o valor que será gerado futuramente por uma empresa (seu fluxo de caixa) em geral é descontado por uma taxa de juros de longo prazo.
Esse desconto é um prêmio pelo risco assumido pelo investidor, que decide investir em uma ação em vez de alocar seus recursos em renda fixa. O “valor justo” de uma empresa é determinado pela soma dos fluxos de caixa projetados. Quanto maior a taxa de desconto, menor será o valor dessas receitas no presente.
“Setores nos quais os fluxos de caixa das empresas são mais representativos no futuro do que no presente sofrem mais, dado o efeito da taxa de desconto nesses fluxos”, explica Jonas Scorza Floriani, sócio e analista buy-side da Fundamenta Investimentos.
Ou seja, se o valor de uma empresa está muito atrelado a receitas futuras, como no caso das chamadas “empresas de crescimento” (como e-commerce, fintechs e bancos digitais), ela tende a ser mais impactada por variações nas taxas de juros.
“Setores defensivos, como energia e saneamento, sofrem menos, já que possuem fluxos de caixa mais previsíveis”, diz Floriani.
Os juros também afetam o desempenho operacional de algumas empresas. No caso de varejistas e empresas do setor imobiliário, o impacto costuma ser maior, já que o crédito mais barato facilita o consumo.
“Os juros são o custo do dinheiro no tempo, e portanto afetam tanto a capacidade da empresa de financiar novos projetos como de refinanciar suas dívidas. Afetam também toda a cadeia de fornecedores e clientes”, lembra Gustavo Akamine, sócio e gestor de portfólio da Constância Investimentos.
É preciso levar em conta também o custo de capital. Muitas empresas tomam empréstimos para financiar suas operações, e taxas de juros mais altas ou mais baixas aumentam ou reduzem o custo desses financiamentos.
Nesse caso, é importante ficar de olho no nível de endividamento da companhia: quanto mais alavancada, mais suscetível a aumentos nos juros, por exemplo.
Por outro lado, há companhias que podem ser beneficiadas por taxas de juros mais altas. Esse é o caso de empresas cujas receitas vêm de fontes financeiras, como bancos.
As seguradoras também podem ser impactadas positivamente, já que a Susep (Superintendência de Seguros Privados) exige que essas empresas mantenham reservas financeiras para cobrir sinistros.
Há ainda o efeito sobre as decisões de investimento. “Com juros mais altos, os investidores tendem a alocar seus recursos em instrumentos de renda fixa e diminuir em renda variável”, esclarece Floriani. “Em contrapartida, com juros mais baixos ou expectativas de juros mais baixos, investidores tendem a aumentar suas exposições em Bolsa”, completa.
Inflação
Os indicadores de inflação também possuem um efeito bastante importante sobre o valor das empresas negociadas em Bolsa. Afinal de contas, quando o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) dispara, o poder de compra da população diminui, especialmente entre as famílias de menor renda. E vice-versa.
Nesse contexto, as varejistas e empresas de consumo em geral, por exemplo, tendem a sofrer mais em momentos de alta da inflação, já que este movimento afeta o poder de compra da população.
“A inflação, direta ou indiretamente, afeta todos os setores da economia, mas setores específicos, como o financeiro e o de consumo, tendem a sentir o impacto mais rapidamente”, diz Floriani.
Segundo ele, no setor financeiro, uma inflação mais elevada tende a levar a ajustes nas taxas de juros, afetando a demanda por empréstimos e margens.
“No setor de consumo, destacamos que uma inflação mais alta afeta o poder de consumo das famílias, com impacto direto nos produtos consumidos. Aqui, produtos não essenciais são os primeiros a sofrerem com o aumento da inflação.”
Akamine lembra que os setores com mais dívidas em reais acabam sendo especialmente afetados pela inflação.
“Os setores com mais alavancagem financeira, ou seja, aqueles que tem dívidas em reais, são os mais influenciados, como as empresas de consumo discricionário, como vestuário, e de incorporação imobiliária”, diz. “Um dado de inflação diferente da expectativa afeta a curva de juros futura, que tipicamente reage para corrigir a diferença dessa expectativa.”
Ele lembra ainda que o comportamento específico de produtos dentro do IPCA costuma afetar segmentos de forma distinta. “Por exemplo, a inflação de alimentos que costuma favorecer o setor de supermercados”, diz Akamine.
Por outro lado, há empresas que podem oferecer certa proteção contra a alta dos preços, como companhias de concessões rodoviárias e de energia elétrica, cujas tarifas são ajustadas conforme a inflação.
Dólar
Já as altas e baixas do dólar afetam principalmente as companhias com volume elevado de exportações, ou com uma proporção importante de custos na moeda americana.
Por isso, ao analisar o impacto do câmbio sobre ações, é importante avaliar em qual moeda uma empresa tem receitas e custos.
Em especial, se uma companhia possui custos em dólar e receitas em real – caso das companhias aéreas e farmacêuticas – a tendência é que sejam mais prejudicadas por um câmbio desfavorável.
“Empresas de commodities cotadas em dólar, como a Vale e a Petrobras, são tipicamente favorecidas por um câmbio mais alto. Já empresas que possuem custos em dólar, como as que vendem eletrônicos ou vestuário, costumam sofrer mais neste período”, afirma Akamine.
O setor automotivo também tende a sofrer com a alta do dólar, aponta Rafael Leuzinger, especialista em investimentos do Grupo Fractal. “O setor automotivo, que depende da importação de peças e de componentes essenciais para a fabricação de veículos, também sofre com o aumento dos custos, uma vez que o encarecimento das matérias-primas e componentes importados eleva os custos de produção.”
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