Herança: Filhos podem ser excluídos da divisão do patrimônio?
Há formas na justiça de retirar filhos da herança, mas o planejamento sucessório é sempre indicado
Com a morte do locutor e apresentador Cid Moreira, aos 97 anos, voltou à tona uma questão familiar bastante comum em brigas judiciais por herança. Os filhos – herdeiros necessários – podem ser excluídos da divisão do patrimônio?
Em 2021, os filhos do apresentador moveram uma ação judicial para investigar a esposa de Cid, Fátima Moreira, que, segundo eles, estaria desviando parte do patrimônio do jornalista, cerca de R$ 40 milhões, fruto da venda de imóveis de forma ilegal, aproveitando-se da senilidade do locutor. Cid, então, provou na Justiça sua sanidade mental e declarou que pretendia deserdar os dois filhos – Roger e Rodrigo Moreira.
Por fazerem parte dos chamados ‘herdeiros necessários’, para quem a lei assegura o repasse de pelo menos 50% do patrimônio, existem dois caminhos a seguir para excluí-los do testamento.
Meios de excluir filhos da herança
De acordo com a advogada Bianca Lavorato Filizzola, membro do Núcleo de Direito de Família e Sucessões e de Planejamento Patrimonial da Nelson Wilians Advogados, para a legislação brasileira, há duas sanções previstas para excluir filhos, ou outros herdeiros necessários da herança. São eles: a indignidade e a deserdação.
A indignidade, regulada nos artigos 1.814 a 1.816 do Código Civil, aplica-se a herdeiros que tenham cometido atos graves contra o autor da herança, como homicídio ou ofensas à sua honra. Nesses casos, a exclusão pode ser requerida judicialmente por qualquer interessado, sem a necessidade de testamento, e deverá ser declarada por sentença judicial.
Já a deserdação, prevista nos artigos 1.962 e 1.963 do Código Civil, exige que o testador manifeste expressamente, em testamento, a sua intenção de excluir o herdeiro, fundamentando-a em motivos legais. A deserdação também pode ser aplicada em casos de ofensas físicas, abandono ou injúrias graves. “Nesses casos, o herdeiro deserdado pode contestar a exclusão, que será decidida pelo Judiciário”, afirma Filizzola.
Planejamento sucessório e patrimonial como alternativa
Para Camila Monzani Gozzi, associada da Pinheiro Neto Advogados e professora de Direito da Família pela PUC, o processo de deserdação é desgastante e pode gerar desconfortos, além da insegurança jurídica.
“Como a deserdação demanda também uma ação, um processo judicial, para confirmar que aconteça, ela gera um tanto de insegurança jurídica para o testador que está deixando essa cláusula, porque ele não vai estar aqui para ver se isso vai acontecer”, aponta
Outro ponto é que o testador precisará nomear alguém que tome a iniciativa de ajuizar a ação contra o herdeiro, que muitas vezes são pessoas próximas. “Então, na hora de fazer isso, precisa de fato pensar quem vai ser o responsável, se tem alguma relação que pode ser desgastada, e se essa pessoa realmente vai querer se indispor de alguma forma com esse outro herdeiro”, destaca ela.
Por isso, ela afirma que a deserdação no testamento não quer dizer que necessariamente esse herdeiro vai ser afastado. O que pode ser feito para manobrar esses pontos é o planejamento patrimonial e sucessório.
“Por exemplo, se eu tenho dois filhos, que são os meus herdeiros, e com um filho tenho uma relação super desgastada, e o outro é de fato meu sucessor nos negócios, o que eu posso fazer no testamento é, na parte que sou livre, indicar todo o patrimônio para este filho próximo, e na parte que sou obrigado a dividir entre os herdeiros necessários, escolher quais bens deixo para cada”, explica ela.
Assim, o testador poderia deixar 25% de seu patrimônio para o filho mais distante, podendo deixar para ele bens de menor importância ou que não prejudicariam os seus desejos.
Importância do planejamento sucessório
Segundo a associada do Pinheiro Neto Advogados, a pessoa que tem patrimônio não vai conseguir garantir 100% o que vai acontecer com a herança depois que ela não estiver mais aqui. Mas isso pode ser minimizado com planejamento.
“Ele é importante emocionalmente, inclusive, no primeiro momento, porque traz um conforto de que essa pessoa tem algum controle do que vai acontecer ou da oportunidade de exprimir a vontade dela do que ela quer que aconteça. E isso deve ser sempre respeitado, já que o Código Civil fala que a vontade do testador tem que ser levada como prioridade”, ressalta Gozzi.
Para ela, todo bom planejamento sucessório começa com a comunicação. Por isso, a família deve conversar e organizar o que existe de patrimônio quando possível, porque isso diminui muito o nível de discussão depois.
“Se alguém ficar descontente com o testamento ou a divisão, se sentir alguma mágoa, se sentir preterido por qualquer razão, vai dar confusão, e no fim irá para a Justiça e haverá mais dificuldade de resolver”, aponta.
“Essas conversas não são fáceis, mas toda conversa de planejamento prévio é muito importante e já diminui muito o risco desse planejamento não ser cumprido”, completa.
Para conhecer mais sobre finanças pessoais e investimentos, confira os conteúdos gratuitos na Plataforma de Cursos da B3. Se já é investidor e quer analisar todos os seus investimentos, gratuitamente, em um só lugar, acesse a Área do Investidor.