Como o dólar se tornou a principal moeda do mundo e por que vai ser difícil superá-lo
Protagonismo do dólar não surgiu de forma imediata e foi resultado de um processo histórico que dura oito décadas
Por Victor Rabelo
O dólar dos Estados Unidos ocupa hoje uma posição de destaque no sistema econômico internacional, sendo a principal moeda de reserva e comércio global. Esse protagonismo, porém, não surgiu de forma imediata, mas foi resultado de um processo histórico que dura oito décadas e é marcado por fatores econômicos e geopolíticos.
“O dólar americano se tornou a principal moeda no comércio global devido à força econômica dos Estados Unidos, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial, quando eles emergiram como principal potência econômica e militar”, explica Carla Beni, economista e professora da FGV.
O ponto de virada para a hegemonia do dólar ocorreu em 1944, com os Acordos de Bretton Woods. Nessa conferência, mais de 40 países decidiram criar um sistema financeiro internacional em que o dólar seria a moeda central e vinculada ao ouro. Isso deu ao dólar uma credibilidade sem precedentes, tornando-o referência para o comércio e investimentos.
“Isso fez com que muitas nações mantivessem reservas em dólares para estabilizar suas moedas e facilitar o comércio mundial. Essa foi a transformação central do sistema financeiro global”, diz a economista.
Mesmo após o fim do chamado padrão-ouro em 1971, quando o então presidente norte-americano Richard Nixon suspendeu o lastro do dólar ao ouro, a moeda do Estados Unidos manteve seu protagonismo. Isso porque o país já havia consolidado a estabilidade de suas instituições e a liquidez no mercado financeiro.
Carla comenta que, além do estabelecimento do dólar como principal moeda do comércio global, os Acordos de Bretton Woods criaram uma estrutura financeira, composta pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), que acabou consolidando os Estados Unidos como potência econômica.
“No final das contas, em resumo, todos os países desde então passaram a acumular reservas internacionais em dólares e isso deu o grande peso e a grande estabilidade dessa moeda no cenário internacional até hoje”, complementa a professora.
A hegemonia do dólar está em risco?
Nos últimos meses, o dólar tem perdido valor. O DXY, indicador que mede o desempenho do dólar em relação a uma cesta de diversas moedas no mundo, tem queda de cerca de 10% neste ano. Ao mesmo tempo, o tarifaço imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem causado um efeito de aproximação comercial entre outros países, com o Brics, inclusive, discutindo alternativas ao dólar.
Apesar disso, a moeda norte-americana ainda representa a maior parte das reservas cambiais dos bancos centrais, domina os pagamentos internacionais e serve como ativo de reserva em períodos de instabilidade. “Por mais que estejamos vendo desvalorizações e instabilidades em relação ao dólar, é importante lembrar que o período de consolidação do dólar como reserva internacional é de 80 anos”, diz Carla.
“O dólar ainda domina como moeda de reserva global e o desequilíbrio dela também vai impactar as reservas dos outros países. Por isso, o processo é lento. Mas, sim, há um movimento em curso para que ele perca talvez um pouco da sua potência, não que ele seja totalmente substituído”, argumenta.
Para a economista, alguns fatores são necessários para que alguma outra moeda supere o dólar. Segundo ela, essa moeda precisa: de confiança generalizada na estabilidade econômica e política do país, ou bloco; de um mercado financeiro adaptado e com liquidez; de aceitação global nas transações; e, por fim, de uma integração com as infraestruturas, com todas as redes de pagamento operando com essa moeda.
“Há uma possibilidade de uma outra moeda entrar em jogo? Sim, mas ela vai precisar de um tempo considerável, não os mesmos 80 anos, pois o mundo está muito mais veloz, mas um tempo considerável para poder solidificar”, finaliza Carla Beni.
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