Aumento da inadimplência na terceira idade; como lidar?
Questões econômicas e comportamentais podem estar ligadas à disparada da inadimplência entre idosos no Brasil
Chegar na terceira idade e curtir a aposentadoria, comendo em bons lugares e participando de várias excursões de viagens pelo mundo, enquanto aproveita de uma vida financeira equilibrada e tranquila parece um sonho — e é para a grande maioria das pessoas do Brasil desta faixa etária.
Um levantamento do Serasa divulgado em maio mostrou que o número de inadimplentes na terceira idade no país vem crescendo mais rápido que nas outras faixas etárias. São aproximadamente 13 milhões de pessoas com mais de 60 anos com dívidas atrasadas, número que saltou 33% nos últimos quatro anos e que avançou quase três vezes mais que a inadimplência média da população.
O que pode explicar o aumento da inadimplência e como sair dela? É o que mostramos a seguir.
Por que a terceira idade está mais inadimplente?
Segundo especialistas, idosos, assim como todo o país, vêm sofrendo com o momento econômico complicado desde a pandemia, com a alta da inflação sendo o principal fator. Isso pois, muitas pessoas tiveram problemas para sustentar as mudanças dos últimos anos no orçamento familiar.
Segundo Fernando Lamounier, educador financeiro e diretor de novos negócios da Multimarcas Consórcios, os idosos podem sim ser mais afetados que a média porque tendem a ter menos possibilidade de se realocar no mercado de trabalho e assim aumentar a renda. Por isso, podem ser mais propensos a inadimplência como forma de manter um padrão de vida que tinham no passado.
Tay Rodrigues, especialista em finanças pessoais da Guide Investimentos, lembra que muitos idosos dependem de rendas fixas, que muitas vezes não são suficientes para cobrir o acúmulo de dívidas. Assim como custos médicos mais altos que o normais.
Não saber dizer não
Para Diogo Angioleti, especialista em finanças e comportamento do Sistema Ailos, todos temos o desejo social de fazer parte de um grupo e de ser aceito, necessidade básica de um ser humano. No caso de pessoas da terceira idade, o assédio da família, que muitas vezes vem como um pedido de ajuda, pesam.
“Pessoas olham as matriarcas e patriarcas de uma família como alguém que precisa apoiar os mais novos e há uma pressão psicológica que por vezes é injusta e velada em algumas famílias. Muitos idosos endividados em excesso relatam que seu comprometimento de renda não é para ele mesmo, há um abuso de uso do recurso do idoso, e da dificuldade de dizer ‘não’ para filhos, netos e parentes. Todo esse contexto fragiliza e expõe essas pessoas”, afirma o especialista.
De acordo com dados do Disque 100, foram mais de 11.240 denúncias de Violações de Abuso Financeiro contra idosos em todo o país. Nesta estatística, mais de 80% dos casos de prática de violência contra idosos têm a própria casa da vítima o local com maior evidência de violação de direitos.
Dados mais recentes do canal também apontam que, apenas os casos de violência patrimonial contra a pessoa idosa, tiveram um aumento de 19%. No entanto, desde 2020, com o isolamento social imposto pela pandemia, a situação tornou-se cada vez mais crítica.
“Dificilmente um idoso negará um pedido de apoio pois existe um apelo emocional e um comportamento de querer ser aceito, sentir-se útil ou até porque há uma boa vontade de ajudar. É preciso consciência da família de que o recurso do idoso é dele, além do cuidado com uso do dinheiro que precisa ser destinado ao bem-estar deles mesmos”, ressalta Angioleti.
Facilidade de crédito
Outro ponto levantado pelo especialista do Ailos que pode estar provocando o aumento na inadimplência é a facilidade excessiva aos créditos sem o devido cuidado das instituições no olhar de orientar e se sensibilizar com o alto comprometimento de renda.
“A responsabilidade é mútua. As instituições financeiras têm acesso ao endividamento dos cidadãos”, destaca.
Como lidar com a inadimplência na terceira idade?
Para lidar com a inadimplência, a primeira ação que deve ser tomada é realizar o controle de gastos desnecessários. Fazer uma reorganização financeira e estabelecer para onde vai a sua renda ajudam a estabelecer as prioridades, diz Lamounier.
O educador financeiro ainda acrescenta que ter uma visão clara da movimentação do seu dinheiro ajuda a conseguir identificar os excessos, as carências e quais pontos de mudança são necessários.
“Como dito anteriormente, a questão é organizar suas dívidas para priorizar as que têm juros mais baixos, diferente do cartão de crédito, ou negociar descontos e parcelamentos”, destaca.
O especialista em finanças e comportamento ressalta que é importante focar no que ainda há por vir. “Foque no futuro, passado é aprendizado”.
Disciplina
Analise sua planilha de gastos para entender se há algo supérfluo, itens que estão ali e facilmente podem ser substituídos e até eliminados. Seja claro e objetivo e então estabeleça uma meta do que quer fazer até o fim do ano – seja um passeio, a troca de um eletrodoméstico ou a realização de qualquer outro sonho.
Tenha clareza sobre o que quer e faça metas possíveis de medir e acompanhar. Coloque um nome no seu investimento, por exemplo, “viagem com a família”. Poupar tendo um objetivo em mente nos ajuda a ter mais compromisso.
Conscientização
Um dos seus objetivos pode ser “sair do vermelho”. Se você já está com dificuldades de pagar suas dívidas e gasta mais do que ganha, é preciso se conscientizar e agir. Mapeie as contas e priorize as que têm juros. Também avalie quais são mais fáceis de renegociar, garantindo mais tempo para quitá-las.
Em último caso, é possível buscar crédito, porém, é preciso ter muito cuidado, já que com ele sua dívida não desaparece, ela apenas passa para outro local e é parcelada. Ao escolher essa opção, observe se a taxa de juros é menor que a taxa das dívidas atuais.
Um bom exemplo disso é o de pessoas que usam o crédito pessoal para pagar o crédito rotativo do cartão ou o cheque especial, por exemplo, que costumam ter os juros mais altos em qualquer instituição financeira.
“Acima de tudo, não faça novas dívidas desnecessárias, lembre-se que é uma fase e você vai vencer. Considere fazer rendas extras se necessário ou vender alguma coisa que está ‘sobrando’ em casa. O ideal mesmo é ter uma reserva financeira para não passar por estes momentos de dificuldade”, diz Angioleti.
Tenho um parente idoso que está inadimplente
Se a pessoa inadimplente é seu pai, mãe ou algum parente próximo, também há maneiras de ajudar e a conversa é o primeiro passo, pontua o educador financeiro. Essa conversa, por sua vez, deve levar à auto consciência de que essa situação está de fato ocorrendo e que há sim alternativas para sair dela.
“Conversar e entender os objetivos dos próximos anos de vida dessa pessoa (seja viajar mais, aproveitar mais a vida, comprar bens, etc) deve estar desenhado e transparente aos seus familiares mais próximos de forma a encontrar uma maneira de alcançar isso com algum planejamento e não por impulso. Em casos extremos, ajuda profissional, seja de um planejador financeiro ou até mesmo de um psicólogo, podem ser úteis”, completa.
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