Copom deve manter Selic em 13,75%; mercado projeta início de cortes no 2º semestre
Apesar do alívio na inflação, analistas esperam sinais mais contundentes de queda nos preços. Corte antecipado, por pressão do governo, poderia levar a descontrole inflacionário
Os sinais de alívio da inflação nos últimos meses ainda não devem levar o Comitê de Política Monetária (Copom) a reduzir a taxa básica de juros, Selic, que está em 13,75% ao ano. A resultado da reunião que vai decidir a política monetária nos próximos 45 dias será conhecido nesta quarta-feira, 03/05, após o fechamento do mercado.
O viés cauteloso na manutenção dos juros no atual patamar segue por conta de dois pontos: 1) o fôlego extra que a economia apresentou em fevereiro; 2) a contínua desancoragem das expectativas de inflação. Os dados abaixo vão ajudar a entender como o Banco Central analisa esses dois pontos, usados pelos membros do Copom para definir se os juros vão subir, cair ou ficar no mesmo valor.
1. Em fevereiro, o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) do Banco Central – considerado a prévia do Produto Interno Bruto (PIB) – teve forte expansão de 3,32%. Essa alta mostrou que a economia brasileira segue em expansão apesar da Selic estar no maior patamar em seis anos.
2. Em março, o núcleo de inflação (que retira choques temporários e aponta uma tendência dos preços), desacelerou para 7,78%, ante 8,44% no mês anterior. Apesar da perda de ritmo, o resultado está bem acima do teto da meta perseguida pelo Banco Central de 4,75%.
O analista da Toro Investimentos, Rodrigo Caetano, explica que para o Copom decidir por um corte na taxa básica de juros, é preciso ter sinais mais contundentes de arrefecimento da inflação na janela analisada pelo comitê. “O ponto de inflexão da inflação ocorrerá no momento em que as projeções para o indicador, para o período analisado pelo Comitê que é de seis trimestres, conflua para a meta, dando sinais mais claros de arrefecimento”.
No índice cheio do acumulado em 12 meses, a inflação chegou a 4,65% em março. É o menor valor para o período de um ano desde janeiro de 2021 (4,56%). Essa desaceleração levou o mercado financeiro a antecipar as projeções para o ciclo de queda dos juros entre agosto e setembro deste ano. Segundo o último boletim Focus, a Selic deve fechar o ano em 12,50%.
O estrategista chefe e sócio da Nomos explica que a inflação anual menor deriva de decisões extraordinárias do governo anterior para derrubar os preços de forma artificial. Um exemplo, foi a redução a zero dos impostos federais sobre os combustíveis. Para Rodrigo Correa, se não fossem essas medidas a inflação anualizada estaria na casa dos 8,64%.
“Considerar que o IPCA ficou ‘abaixo do teto da meta na última divulgação’ é simplesmente, no melhor dos casos, uma grande miopia. A inflexão [queda dos juros pelo BC] virá quando as expectativas futuras estiverem mais ancoradas e uma leitura do
passado esteja consistentemente dentro das bandas da meta, isso se depender de uma leitura técnica do BC. Se fosse apostar, imagino que no 2º semestre desse ano teremos esse início de baixa da Selic”.
Impacto das pautas fiscais nos juros
Diante de uma estabilidade da Selic no mesmo patamar, os economistas vão se voltar para o comunicado do Copom. Além da questão do que o colegiado espera da inflação e de alguma sinalização quanto a mudanças de rumo para os juros, os analistas aguardam novas sinalizações no campo fiscal.
Declarações recentes de diretores do Banco Central têm reconhecido os avanços fiscais adotados pelo governo federal, após a entrega ao Congresso do novo arcabouço fiscal. No entanto, a autoridade monetária tem enfatizado que não há ‘relação mecânica’ entre a apresentação do novo regime fiscal e as decisões de política monetária
O analista da Toro Investimentos afirma que se por um lado a apresentação da nova âncora fiscal pode beneficiar um movimento de corte de juros – visto que traz uma maior previsibilidade em relação a trajetória econômica – por outro levantou perguntas sobre como a proposta será efetivamente executada.
“A proposta trouxe avanços importantes para o mercado com uma visão de quais são as medidas estipuladas pelo governo para que tenhamos um controle de gastos e receitas. Porém, o texto levantou dúvidas de como serão executadas as propostas para a pretensão de minimizar/zerar o déficit público, com a expectativa de superávit a partir de 2025. Neste sentido, a busca pelo aumento da arrecadação nos valores entre R$ 100 bilhões e R$150 bilhões é um dos pontos do texto de maior atenção por parte do mercado”.
Pressão do governo e metas de inflação
Desde antes de assumir o governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem criticado o alto patamar da taxa básica de juros e a atuação de Roberto Campos Neto à frente do Banco Central. Em outra frente, Lula se disse favorável a um aumento da meta de inflação deste ano que é de 3%.
Na ata da última reunião, o Copom deixou nas entrelinhas uma preocupação com uma possível mudança. O próprio presidente da autoridade monetária já se posicionou contrário à ideia. O especialista da Toro Investimentos explica que a condução da política monetária é técnica e que o BC tem como obrigação seguir as metas de inflação.
“Acreditamos que essa condução deve permanecer, visto que uma redução antecipada do corte de juros por pressão política e não sinais de arrefecimento de inflação, podem levar a um descontrole inflacionário, conforme o movimento já observado em outras economias, como por exemplo na Turquia”, afirma Rodrigo Correa.
O estrategista chefe e sócio da Nomos vai além e explica que a diretoria do Banco Central tem autonomia legal para tomar quaisquer medidas – dentro da política monetária – para perseguir a meta de inflação imposta pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Ele também cita a situação da Turquia.
“A história e o legado de cada diretor estão em jogo e provavelmente eles não cederão a apelos políticos. Se os juros forem baixados antes do tempo, corremos o risco de ver o IPCA voltar a reacelerar – como aconteceu em 2015 no país e em 2022 na Turquia. Na época, a inflação no Brasil bateu os dois dígitos e na Turquia fechou com alta de 64%”.
Desfalque no Copom
A reunião de hoje vai acontecer com dois diretores do Banco Central a menos. A diretora de administração, Carolina Barros, não participa do encontro “por motivo de falecimento de familiar de primeiro grau”. O diretor de política monetária, Bruno Serra, deixou o cargo em 27 de fevereiro após o fim do seu mandato.
“Na minha visão não teremos impactos relevantes. O Comitê se apresenta bem conciso em suas decisões, conforme podemos observar em outras reuniões”, concluiu o analista da Toro Investimentos.
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