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Copom mantém tom sobre incertezas fiscais e juros altos; Haddad fala em comunicado preocupante

Apesar da pressão do governo, Selic segue em 13,75%. Comunicado duro do Comitê derruba expectativas do mercado para cortes na taxa de juros nas próximas reuniões do BC

Nem as pressões do governo sobre o Banco Central e muito menos as projeções de redução no déficit primário do governo – de R$ 230 bilhões para R$ 107,6 bilhões em 2023 – mudaram o tom do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre os caminhos para a Selic, a taxa básica de juros.

Em um comunicado considerado duro pelos analistas do mercado, o Copom voltou a sinalizar que “os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados”. Afirmou ainda que “não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, ou seja, ainda não há espaço – pelo menos por enquanto – para uma flexibilização dos juros.

O economista-chefe da Messem Investimentos, Gustavo Bertotti, afirma que mais uma vez o Copom optou pela cautela – diante do cenário econômico mundial ainda incerto – e apesar das declarações do governo pela queda dos juros. “O cenário macroeconômico vem se deteriorando, as questões fiscais e políticas, somado ao cenário externo, pesaram na decisão do BC”.

A Selic foi mantida em 13,75% ao ano pelo quinto encontro consecutivo, apesar das repetidas críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aliados ao efeito dos juros sobre a atividade econômica. A votação, unânime entre todos os oito diretores, também teve voto favorável do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. A decisão mantém a taxa no maior patamar desde 2016.

Para a economista-chefe do banco Inter, Rafaela Vitoria, o comunicado não abriu nenhum espaço para a discussão de queda nos juros. “O que mais pesou no comunicado foi o fato das expectativas de inflação ainda estarem subindo. Sem âncora fiscal, cenário de queda de juros será mais difícil”.

Haddad fala em comunicado “muito preocupante”

Pouco depois da divulgação do Copom, ainda na noite de quarta-feira, 22/03, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, considerou o comunicado “muito preocupante”. Ele citou o relatório de receitas e despesas do orçamento – publicado poucas horas antes – que apontou uma melhora nas projeções das contas públicas em janeiro.

“Em um momento em que a economia está retraindo e que o credito está com problema, o Copom chega a sinalizar até a possibilidade de uma subida da taxa de juros que é a mais alta do mundo. (…) A depender das futuras decisões nós podemos inclusive comprometer o resultado fiscal”.

O ministro afirmou ainda que vai fazer chegar ao Banco Central as projeções da equipe econômica e que espera para a semana que vem uma ata mais branda – como aconteceu na reunião anterior.

“O primeiro comunicado também veio muito duro e a ata atenuou. Nós esperamos que isso aconteça de novo. (…) Vamos fazer chegar ao Banco Central a nossa análise do que é mais recomendável para economia brasileira encontrar o equilíbrio de trajetória da dívida, da inflação, das contas públicas e do atendimento às demandas sociais”, concluiu.

Sobre a relação entre o governo e a autoridade monetária, Haddad disse que tem uma “relação institucional” com o presidente do BC que “nunca se perdeu e nunca se perderá”. Ele lembrou que os técnicos da Fazenda e do BC “têm reuniões o tempo todo” e completou dizendo que o governo deve “mandar para a Casa Civil um conjunto de medidas para melhorar ambiente de crédito”.

Nesta quinta-feira, 23/03, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, avaliou que a decisão do Copom foi apertada, mas espera que ata da reunião seja ‘imparcial’ e ‘justa com o Brasil”.

“Não houve surpresa em relação à manutenção da taxa em 13,75%. Já esperávamos isso. Ainda que não quiséssemos isso, mas já esperávamos. Então vamos aguardar a ata. Assim como da outra vez, o comunicado saiu muito mais apertado do prevíamos. Vamos aguardar a ata. Que essa ata venha de forma imparcial e justa com o Brasil”, declarou.

Por que o Copom não cortou os juros?

A análise do cenário externo turbulento abriu o comunicado do Comitê de Política Monetária sobre a justificativa para manter a Selic no patamar de 13,75% ao ano. Segundo o Copom, os episódios envolvendo os bancos nos EUA e na Europa elevaram a incerteza e se somaram ao já apertado cenário de inflação e juros nas economias.

Em relação ao cenário doméstico, a inflação ao consumidor ainda elevada para o cumprimento da meta corrobora para juros altos. Segundo as projeções do Comitê, a inflação neste ano deve ficar em 5,8% – acima do teto da meta de 4,75%. Para 2024, o cenário é um pouco melhor – com IPCA de 3,6% – ainda assim acima da meta de 3% estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

O BC admitiu que a reoneração dos combustíveis “reduziu a incerteza dos resultados fiscais de curto prazo”. Mas avalia que a “a incerteza no arcabouço fiscal” mantém a dúvida sobre a trajetória da dívida e sobre a ancoragem da inflação.

Para os economistas o BTG Pactual, o Copom tinha pouco a fazer diante da deterioração das expectativas de inflação e do adiamento da divulgação da nova regra fiscal pelo governo.

 “Dado que o governo ainda não apresentou publicamente o novo arcabouço fiscal, vale dizer que a comunicação ainda sim buscou alguma sinalização positiva da política fiscal ao citar a reoneração dos combustíveis e afirmar que ela reduz as incertezas fiscais de curto prazo”, afirmaram em comunicado.

Diante deste cenário, o Copom entendeu que a decisão de manter os juros é “compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante – que inclui os anos de 2023 e, em grau maior, de 2024”.

Para Gustavo Bertotti, diante de todos os fatores sinalizados pelo Banco Central, um cenário de queda de juros se avizinha apenas no segundo semestre.

“O risco político vem aumentando e afetando as expectativas econômicas para os próximos anos. Trabalhamos com um cenário em que juros continuarão altos por mais tempo, talvez com queda apenas no segundo semestre e em menor magnitude”, afirma o economista-chefe da Messem Investimentos.

“Entendemos que a atuação mais dura no curto prazo, a apresentação de um arcabouço fiscal crível e uma deterioração mais intensa das condições de crédito possam auxiliar em alguma acomodação da política monetária no segundo semestre”, completa os analistas do BTG.

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