Apenas 11% das empresas abertas têm pessoas negras na diretoria e conselho
Pela primeira vez, estudo que mapeia a participação feminina na diretoria e conselhos de administração de 343 companhias listadas analisa dados sobre cor e raça
Dentre 343 empresas listadas na bolsa no Brasil, a proporção de companhias com ao menos uma pessoa negra (preta ou parda) na diretoria ou conselho de administração não passa de 11%.
Esses dados estão pela primeira vez no estudo “Mulheres em Ações”, feito pela B3 a partir de informações prestadas pelas companhias em documentos públicos.
+ Dia da Mulher Negra: elas contam suas trajetórias no mundo das finanças
A terceira edição do mapeamento foi divulgada nesta terça-feira, 8/8, e é baseada em dados de 343 empresas listadas que entregaram seus Formulários de Referência até o último dia 20 de junho. O documento é divulgado anualmente pelas empresas.
Sobre gênero, de cada 100 empresas, 55 não têm mulheres em cargos de diretoria, e 36 não têm participação feminina entre os conselheiros de administração.
Cor e raça na alta liderança
Das 343 companhias analisadas no levantamento, 305 (88,9%) declararam não ter nenhuma pessoa parda na diretoria estatuária, e 311 (90,7%) não têm nenhuma pessoa parda no conselho. Apenas quatro empresas (1,1%) disseram contar com três ou mais pessoas pardas na diretoria estatuária, mesmo número registrado nos conselhos de administração.
A participação de pessoas pretas na alta liderança é ainda menor:
- elas não ocupam cargos de diretoria estatutária em 337 (98,2%) das 343 companhias;
- não estão nos conselhos de administração de 328 empresas (95,6%);
- nenhuma empresa tem duas ou mais pessoas pretas na diretoria estatutária;
- seis (1,7%) têm apenas uma pessoa autodeclarada preta nesse órgão;
- 13 companhias contam com uma única pessoa preta em seu conselho (3,8%)
- 1 empresa tem dois e uma tem três ou mais conselheiros de administração pretos
Em relação à presença de pessoas brancas, acontece o inverso: 254 companhias (74%) têm três ou mais pessoas brancas em suas diretorias estatutárias, e 41 afirmaram contar com dois brancos nesses cargos (11,9%). O estudo mostra ainda que são 283 empresas com três ou mais pessoas brancas em seu conselho de administração (82,5%) e 14 com duas delas (4,1%).
Chama a atenção o fato de que 44 companhias disseram não ter nenhuma pessoa branca na diretoria estatutária e 45 disseram não ter pessoas brancas no conselho de administração. Todas essas empresas, no entanto, preencheram o quadro correspondente a essa informação no Formulário de Referência selecionando as opções “outros” ou “prefere não responder”.
Mulheres na diretoria e nos conselhos
Apesar de ainda mostrar um longo caminho a percorrer quando se trata de desigualdade de gênero, o estudo mostra avanços entre um ano e outro tanto na diretoria como nos conselhos:
- o porcentual de companhias que não têm mulheres entre seus diretores estatutários passou de 61% em 2022 para 55% em 2023;
- o porcentual de empresas listadas que não têm mulheres no conselho de administração passou de 37% em 2022 para 36% em 2023;
- o número de companhias com apenas uma mulher na diretoria estatuária passou de 26% em 2022 para 29% em 2023;
- o número de empresas com uma mulher entre conselheiros de administração passou de 38% para 39% no período;
- companhias com três ou mais mulheres entre os diretores estatutários passaram de 6% em 2022 para 7% em 2023;
- apenas o número de empresas com três ou mais mulheres como conselheiras de administração caiu: passou de 8% em 2022 para 7% em 2023
Diversidade por segmento de listagem
Como nas duas edições anteriores, o novo mapeamento incluiu a análise de quatro segmentos de listagem: Básico, Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado. Mas uma mudança na forma de reporte pelas empresas no Formulário de Referência, implantada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 2023, pode ter influenciado os resultados comparativos. Veja abaixo os principais resultados:
- Entre as companhias do segmento Básico analisadas, 48% têm ao menos uma mulher no conselho –em 2022 eram 47%.
- Já no Nível 1, esse índice recuou de 80% para 71%;
- No Nível 2, subiu de 71% para 89%;
- No Novo Mercado, empresas com participação de mulheres na composição do conselho passaram de 74% para 70%
A partir da entrega do novo formulário de referência da CVM, em maio deste ano, as companhias passaram a declarar o gênero dos integrantes dos órgãos da administração entre as opções “masculino”, “feminino”, “não binário”, “outros” e “prefere não responder”, apresentadas para seleção no momento do preenchimento do formulário.
“Até 2022, não tínhamos esse dado, e intuíamos o gênero a partir dos nomes apresentados e até pesquisa na mídia, em alguns casos. Agora as pessoas trazem a autodeclaração, mas também há a possibilidade de declarar “prefere não responder” ou “outros”. E talvez isso explique, ao menos em parte, as altas e quedas verificadas no comparativo ano a ano de alguns segmentos”, diz Flavia Mouta, diretora de Emissores da B3.
+ Brasil está engatinhando em governança, diz Werner Roger, da Trígono
No Novo Mercado, por exemplo, 6,9% das companhias declararam possuir pelo menos um integrante do conselho de administração que selecionou as opções “prefere não responder” ou “outros” – um dado que influencia o decréscimo de 74% para 70% no número de empresas com participação de mulheres em conselhos nesse segmento.
“Então, valerá a pena acompanhar um pouco mais a evolução do quadro nesse novo modo de informar para, em alguns anos, com uma base mais estabilizada, conseguirmos apontar com precisão que rumo tomamos em termos de equidade em companhias abertas”, aponta Flavia.
Clique aqui para fazer o download do estudo “Mulheres em Ações”
Aprovação do Anexo ASG
Em julho de 2023, a CVM aprovou o Anexo ASG, documento com medidas propostas pela B3 para estimular a diversidade de gênero e a presença de grupos sub-representados em cargos de alta liderança e ampliar o reporte de boas práticas ambientais, sociais e de governança pelas companhias listadas.
As companhias brasileiras listadas em bolsa devem eleger ao menos uma mulher e um integrante de comunidade sub-representada (pessoas pretas, pardas ou indígenas, integrantes da comunidade LGBTQIA+ ou pessoas com deficiência) para seu conselho de administração ou diretoria estatutária entre 2025 e 2026.
+ ESG não é fácil, mas é obrigação, diz Caito Maia, da Chilli Beans
A aplicação se dará pelo mecanismo conhecido como “pratique ou explique”, no qual as companhias precisam dar transparência ao mercado sobre as ações adotadas para o atendimento das medidas ou explicar os motivos da sua não adoção. Essas evidências precisarão ser incluídas no Formulário de Referência.
As companhias que já estão listadas na bolsa, na data de início da vigência das novas regras, terão até 2025 para comprovar a eleição do primeiro membro diverso para a alta liderança – ou apresentar justificativas para a não adoção da prática – e 2026 para o segundo membro.