Juros em queda no Brasil e estáveis nos EUA. Como isso afeta o investidor?
Decisões sobre juros podem fortalecer dólar contra o real, mas outros fatores determinantes para o câmbio podem contrabalancear movimento
Há dias o mercado aguarda esta super quarta. Hoje (1º/11), os bancos centrais dos Estados Unidos e do Brasil anunciam suas decisões de política monetária. Os movimentos já são amplamente esperados pelos investidores: mais uma redução de 0,5 ponto porcentual para a Selic no Brasil, para 12,25%, e a manutenção do nível de juros nos Estados Unidos, na faixa entre 5,25% e 5,50%.
Com isso, o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos diminui mais uma vez. “A gente tem visto há quase um ano o diferencial de juros caindo, e a tendência deve se manter. No Brasil, vamos continuar cortando os juros, ao que tudo indica, e a trajetória do Fed ainda está incerta”, afirma André Cordeiro, economista-sênior do Inter.
Mas o que isso significa para a economia brasileira e para quem investe?
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Impacto no dólar
Esse movimento de aproximação das taxas de juros pode ter um efeito na cotação do dólar aqui no Brasil. Com os juros mais elevados nos Estados Unidos e menores aqui, muitos dos investidores preferem aplicar seu dinheiro na renda fixa norte-americana. Simplificando, isso significa mais dólares saindo do Brasil, o que desvaloriza o real. E qual o efeito disso? Um dólar mais valorizado pode pressionar a inflação para cima.
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“Esse diferencial encurtado, com juro em patamar bastante atrativo nos EUA comparado com o juro brasileiro, que por definição tem mais risco, pressiona o real. Isso pode se materializar em uma desvalorização”, explica André Cordeiro, do Inter.
Há, no entanto, outros fatores que jogam a favor da moeda brasileira, lembra Andrea Damico, economista da Armor Capital. “Um ponto que pode pesar a favor do real é a aprovação de mais medidas arrecadatórias, ou a aprovação da reforma tributária. Por outro lado, as indefinições sobre a meta fiscal do ano que vem pesam contra”, afirma ela.
Segundo ela, uma mudança na meta fiscal de 2024 “pode ser muito determinante para a moeda no curto e médio prazo. Podemos entrar num modo pior para câmbio e para preços de ativos brasileiros em geral”.
Outro ponto levantado por Damico que ajuda a contrabalancear o diferencial de juros é o desempenho da economia brasileira, apesar de sinais de desaceleração no terceiro trimestre deste ano. “As muitas surpresas recentes com os dados de atividade geraram uma discussão de que o PIB potencial brasileiro pode ser mais alto. E um PIB potencial mais alto também pode balancear um pouco o efeito negativo do diferencial de juros”, diz.
Exportações ajudam a sustentar o real
Um ponto positivo para a moeda brasileira tem sido o desempenho da balança comercial. Segundo o Banco Central, no comércio exterior, o saldo em 2023, até 20 de outubro, foi positivo em US$ 45,214 bilhões. Com o resultado, o Brasil registrou fluxo cambial positivo de US$ 24,035 bilhões neste ano até a data, contra uma entrada líquida de US$ 5,139 bilhões no mesmo período do ano passado.
“Muito provavelmente, estamos em um novo nível de exportações. Apesar de o nível de preço ter caído, a quantidade exportada aumentou razoavelmente. Isso gera melhora da nossa balança comercial e reduz o déficit em conta corrente”, diz Damico, da Armor.
Cordeiro, do Inter, aponta que isso tem contribuído para a sustentação do real. “Não temos visto uma desvalorização por causa de fundamentos positivos no Brasil. A balança comercial está com desempenho muito bom, e devemos fechar o ano com um balanço extremamente positivo, isso por si só garante o fluxo de dólar para o Brasil”, diz Cordeiro.
Capital financeiro estrangeiro para o Brasil cai
Outro impacto da perspectiva de juros elevados por mais tempo nos EUA é o fluxo de capital estrangeiro para a bolsa brasileira, que vem caindo. No acumulado do ano até 20 de outubro, o canal financeiro apresentou saídas líquidas de US$ 21,179 bilhões, segundo o Banco Central.
“Desde as eleições [no Brasil], estamos vendo um fluxo de investimentos para o exterior, principalmente para os EUA”, afirma Eduardo Grübler, gestor quantitativo da Warren. “A taxa de juros hoje nos Estados Unidos está muito boa [para o investidor], a gente nunca viu isso. E se não já parou de subir, está quase parando, provavelmente. No Brasil, a gente já teve inflexão, o BC parou de subir a Selic, e é consenso na curva de juros que os cortes devem continuar”, diz.
E agora, BC? Como a decisão do Fed afeta o Copom?
A perspectiva de que o Fed deverá manter os juros em patamar elevado por mais tempo pode tornar o ambiente mais difícil para o BC brasileiro.
“Os juros mais altos nos EUA vão afetar, principalmente, a velocidade dos cortes aqui. Em agosto, quando teve início o ciclo de cortes, imaginava-se que em dezembro já haveria espaço para aumentar o ritmo”, diz Cordeiro. “A autoridade monetária dificilmente irá intensificar o corte, e correr o risco de ter de voltar atrás depois, com o custo de credibilidade. Isso pode acabar forçando o BC a eventualmente pausar o ciclo de corte”, diz o economista do Inter.
“Já a taxa terminal depende mais de fatores estruturais da economia brasileira, e não deve ser afetada. O que muda é a velocidade para chegarmos à taxa terminal”, diz André Cordeiro, do Inter, que estima uma taxa de juros entre 9% e 9,5% no fim de 2024.
Andrea Damico, no entanto, lembra que Brasil e Estados Unidos estão em momentos diferentes em seus ciclos monetários. “Começamos a subir taxa de juros muito antes do Fed, então estamos muito mais avançados no ciclo. Também estamos mais avançados no processo de desinflação e na desaceleração da atividade”, diz.
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