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Sobe e desce: o que explica as movimentações das expectativas no Focus em 2023

Ao longo do ano, as projeções dos analistas variaram bastante. Entenda as razões e confira os gráficos

Linhas de um gráfico emaranhadas sobre fundo de uma tela azul
Há um componente emocional que faz investidores venderem e comprarem mais. Foto: Adobe Stock

O dia era 2 de janeiro de 2023. Na ressaca do ano novo, o relatório Focus, para quem estivesse acordado para ver, anunciava qual a expectativa do mercado para o IPCA, o índice oficial de inflação do País, para o fim do ano. A mediana ficava em 5,31%. No mais recente relatório Focus, divulgado na última segunda-feira, o mercado esperava uma variação de 4,55%. Em janeiro, a projeção era encerrar o ano com a Selic a 12,25%. Hoje, o consenso fica em 11,75%. Quem olha as duas fotografias corre o risco de pensar que pouco mudou ao longo do ano.

O filme, no entanto, foi mais emocionante do que isso. Confira como foi o sobe e desce do ano.

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Inflação

De janeiro até maio, as projeções para o índice oficial de inflação do país, o IPCA, praticamente só subiram. Mas uma série de surpresas positivas fez com que os analistas começassem a reduzir as perspectivas para o indicador.

A primeira delas, lembra Andréa Angelo, estrategista de Inflação da Warren Investimentos, foi a deflação dos preços dos alimentos. “Começamos o ano com uma inflação de alimentos acima de 4%, mas entramos em uma deflação, que perdurou e puxou o índice”, diz ela.

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“Na esteira do PIB do agronegócio muito forte no primeiro trimestre, houve um choque de oferta positivo para muitos insumos alimentares importantes”, o que aumentou a demanda e derrubou os preços, diz Lucas Farina, analista de Economia da Genial Investimentos.

Na parte da energia, os preços internacionais do petróleo também contribuíram para o IPCA menor, diz Farina. Aliado a isso, os reservatórios de hidrelétricas passaram o ano sem problemas de abastecimento. Isso fez com que a bandeira verde nas tarifas de energia se mantivesse ao longo de todo 2023.

Em segundo lugar, os bens duráveis, que englobam eletrônicos, eletrodomésticos e automóveis, também tiveram trajetória positiva ao longo dos primeiros meses do ano. Dois fatores contribuíram para isso: um movimento mais benéfico do câmbio, já que a moeda brasileira não se depreciou como analistas esperavam, e a normalização das cadeias globais de suprimentos desses bens. “Com isso, vimos o IPP, que mede a inflação aos produtores, em deflação praticamente o ano todo. Isso chega ao consumidor”, diz Andréa.

Medido pelo IBGE, o Índice de Preços ao Produtor (IPP) acumula deflação de 7,92% nos 12 meses até setembro. Desde o início do ano, a deflação é de 5,43%, a menor taxa acumulada em um ano até setembro desde o início da série histórica, em 2014.

Por fim, um terceiro ponto foi a desaceleração dos preços de serviços. “Essa dinâmica foi uma surpresa, tanto para o Banco Central para os analistas, porque o desempenho da economia está super favorável, o desemprego está caindo o ano inteiro e temos visto aumento da renda real”, diz Andréa. Todos esses fatores, na teoria, poderiam pressionar para cima os preços  dos serviços, mas não foi o que aconteceu.

E por que a inflação não subiu? Há duas razões, segundo Andréa. Uma delas é exatamente a redução dos preços dos bens duráveis. “No caso dos automóveis, por exemplo, os preços subiram muito nos últimos anos, e de repente caíram. Isso se reflete em vários serviços, como IPVA, seguro e estacionamento, cujos preços estão relacionados ao preço do bem”, diz ela.

Além disso, a inflação inercial se mostrou menor. Depois de meses seguidos com a inflação correndo acima de dois dígitos, o índice de preços caiu rapidamente, a partir do ano passado. Essa inércia menor ajudou na desinflação dos serviços.

PIB

No PIB, houve uma variação maior nas expectativas. Depois de um início do ano com perspectiva de crescimento de 0,8%, hoje o mercado espera um avanço em torno de 2,85%.

“Tudo começou quando o PIB do primeiro trimestre trouxe uma grande surpresa altista do lado da oferta, com o agro”, lembra Farina. De janeiro a março, a agropecuária registrou uma alta de 21,6% na comparação com os três meses anteriores, a maior alta para o setor desde o quarto trimestre de 1996.

O segundo trimestre, apesar de não tão positivo, trouxe também algumas surpresas aos analistas, que voltaram a revisar para cima as perspectivas de atividade.

“Nesse meio tempo, na Genial nós voltamos a estimar o PIB potencial da economia, e calculamos que estava em 2,2%, maior do que antes”, conta Farina. Segundo ele, essa melhora foi fruto de um efeito cumulativo de medidas tomadas de 2016 até hoje, desde as reformas trabalhista e da previdência, os marcos regulatórios da cabotagem e das ferrovias, e a autonomia do Banco Central, diz ele.

Para o terceiro e quatro trimestre, entretanto, os números disponíveis hoje indicam uma possível recessão técnica, lembra Andréa. Isso explica por que as estimativas se estabilizaram a partir de setembro.

Selic

O Brasil iniciou o ano com a Selic a 13,75% ao ano, taxa que vinha estável desde agosto de 2022. Em janeiro, no entanto, os analistas viam espaço para cortes da taxa para 12,75%. O cenário, no entanto, foi se alterando ao longo dos meses, e os analistas passaram a ver menos espaço para um afrouxamento da política monetária.

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A partir do meio do ano, assim como as expectativas para a inflação, as projeções começaram a ser revisadas para baixo. “Tivemos ruídos sobre uma possível mudança da meta de inflação, e só foi batido o martelo de que seria mantida em 3% até 2026 em junho”, lembra Farina.

“Além da melhora do quadro inflacionário corrente, isso trouxe uma maior ancoragem para as expectativas de inflação no longo prazo”, diz.

Além disso, a inflação de serviços mais baixa contribuiu com o processo de relaxamento monetário, diz Andréa. “Junto com a queda das expectativas longas de inflação para em torno de 3,5%, isso ajudou o BC a ter confiança em iniciar o ciclo que relaxamento”, afirma.

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