Afinal, qual é o risco do crédito privado?
Falência de bancos pequenos e casos de empresas endividadas que têm títulos de renda fixa no mercado acendem alerta ao investidor
Por Marília Almeida
O cenário está desafiador para investimentos em crédito privado. A liquidação de duas financeiras pelo Banco Central (BRK e Portocred) na quarta-feira, 15/02, acontece após o caso de inconsistências contábeis na Americanas, uma potencial segunda recuperação judicial da Oi e a piora da dívida da transmissora de energia Light e da CVC, todas emissoras de títulos de renda fixa no mercado.
Portanto, é natural que o investidor de CDBs, LCIs, LCAs, CRIs, CRAs e debêntures se questionem sobre o risco do crédito privado, e quando vale a pena ganhar mais do que o CDI na renda fixa agora. Afinal, é sempre bom lembrar que quanto maior o rendimento, maior o risco – mesmo na renda fixa.
Faça uma boa análise de crédito para entender o risco do crédito privado
Para Marília Fontes, sócia da casa de análises Nord, nunca foi tão importante fazer uma boa análise de crédito da carteira de renda fixa. Sua dica é tentar separar o joio do trigo ao verificar qual empresa proporciona um retorno razoável, mas ao mesmo tempo tenha baixo endividamento e patrimônio suficiente para passar por um cenário de despesas e dívidas mais caras como o atual. Isso porque a taxa básica de juros, a Selic, está em um nível alto, e deve continuar assim neste ano.
No site Banco Data, por exemplo, é possível monitorar se o banco está registrando prejuízos ou seu índice de Basiléia está abaixo do recomendado. A financeira BRK, por exemplo, vinha registrando prejuízos desde 2017 e seu Índice de Basiléia (que mede a sua alavancagem) estava em 2,8%, bem abaixo do mínimo exigido pelo BC para evitar uma falência (11%).
O que também pode ajudar o investidor a escolher o investimento mais seguro são as garantias do FGC. Enquanto em CDBs, LCAs, LCIs, LC e LH o investidor tem todo o seu dinheiro de volta caso invista até R$ 250 mil, as debêntures, CRIs e CRAs não contam com essa proteção.
Mas há um lado bom para investidores em cenários de crise, aponta Fontes. “Nunca vimos papéis de boas empresas pagando um prêmio (retorno adicional comparado a uma aplicação segura) tão alto. Em momentos como este, o mercado não diferencia quem é bom de quem não vai conseguir pagar, e os prêmios sobem quase que de forma equivalente. Basta saber escolher”.
Fundos de investimento são mais seguros
O investidor iniciante pode ter dificuldades em realizar a análise caso a caso de títulos que não contam com a proteção do FGC. Para eles, é mais indicado optar pelo auxílio de um profissional ou preferir fundos de crédito privado, que têm um gestor profissional para fazer o trabalho de escolher e monitorar o risco dos títulos da carteira.
Além disso, um fundo costuma ser diversificado: uma empresa com problemas pode representar apenas 1% de sua carteira, o que acaba tendo um impacto reduzido sobre o investimento em caso de problemas. Quando existem grandes oscilações do valor da cota em fundos de crédito elas são mais por conta de diversos resgates feitos por investidores que temem perder dinheiro do que pelo problema em si. No longo prazo, passada a crise, o valor da cota tende a estabilizar, já que o mercado passa a entender que o título da empresa com problemas representava apenas uma fração do fundo.
Geralmente os fundos de crédito privado se dividem em fundos de companhias sólidas com boa classificação de crédito (os chamados high grade) e fundos com potenciais de retorno mais altos, que investem em empresas mais arriscadas (high yield). No Brasil, predominam os fundos high grade, o que torna o mercado mais seguro.
O fundo high grade é imune a problemas?
Mas é necessário ficar alerta: um fundo high grade não é imune a problemas, aponta Fabiana Moraes, sócia e CIO da gestora Dhama Capital. “As empresas podem ser boas, mas vulneráveis às condições políticas, econômicas e à má governança. O investidor acredita que o risco é baixo, mas na realidade são operações de renda fixa com risco de renda variável”.
Contudo, Willian Eid, professor do Centro de Estudos em Finanças da FGV (FGVCef), pondera que o risco de fundos de crédito sempre foram ‘pequenos’. “Os casos de calote em debêntures no Brasil são raríssimos. Fizemos um levantamento em 2017 e em 20 anos praticamente não havia nenhum caso, exceto uma empresa de cimento, que logo foi comprada e pagou seus investidores”.
Em 2008, em parceria com um banco estrangeiro, o professor da FGV incluiu 10 debêntures em um fundo de pensão, uma aplicação conservadora voltada para a aposentadoria dos funcionários de uma empresa. O resultado foi satisfatório: as aplicações foram resgatadas em 2019 com ganho. “É uma questão de selecionar bem”.
Mas Eid ressalta que confiar em um negócio terá sempre um risco embutido, ainda que ele seja baixo. “O brasileiro é mal acostumado com fundos DI, que têm risco praticamente zero, mas rendimento menor”.
Para saber ainda mais sobre investimentos e educação financeira, não deixe de visitar o Hub de Educação da B3.