Fundos de Investimento

Fundos de crédito privado em alta: qual o motivo e qual a perspectiva?

Justificativas para cenário dos fundos de crédito privado passam por momento macroeconômico até mudanças de legislação em outros ativos

Os fundos de crédito privado são cestas de investimentos que direcionam mais de 50% de seus recursos para títulos de dívida emitidos por empresas privadas. A categoria predominantemente de renda fixa tem ganhado destaque com o avanço no último ano.

Em levantamento feito pela Quantum Finance pode-se ver que o total do patrimônio líquido dos fundos de crédito privado saltou de R$ 772 bilhões em janeiro de 2023, para R$ 1,015 trilhão em março de 2024. Confira!

Confira o aumento do patrimônio líquido dos fundos de crédito privado

PeríodoCaptação MensalPatrimônio Líquido 
Jan-2023-R$ 8.066.839.931,31R$ 772.620.790.798,60
Fev- 2023-R$ 17.786.993.463,46R$ 759.700.764.714,82
Mar-2023-R$ 24.745.661.322,29R$ 750.082.913.316,85
Abr-2023-R$ 20.009.241.325,19R$ 740.944.041.705,06
Mai-2023-R$ 9.690.021.613,80R$ 750.101.957.001,97
Jun-2023R$ 6.047.847.256,55R$ 775.755.323.886,36
Jul-2023R$ 2.828.378.242,54R$ 782.601.134.035,29
Ago-2023R$ 20.806.638.700,32R$ 812.323.751.205,68
Set-2023R$ 10.010.792.430,07R$ 831.366.607.054,92
Out-2023R$ 27.688.646.725,22R$ 857.133.279.402,94
Nov-2023R$ 20.367.654.001,95R$ 854.966.242.966,34
Dez-2023R$ 13.576.996.738,90R$ 923.633.355.516,53
Jan-2024R$ 9.478.134.149,49R$ 944.125.354.757,83
Fev-2024R$ 23.843.441.067,32R$ 976.463.629.484,23
Mar-2024R$ 32.363.415.272,65R$ 1.015.592.385.100,07
Fonte: Quantum Finance

O que explica a alta na captação dos fundos de crédito privado?

Segundo especialistas, diversos fatores colaboram atualmente para a alta procura e aporte em fundos de crédito privado. Esses motivos variam desde cenários macroeconômicos até mudanças legislativas de outros ativos.

Melhora da economia local

Segundo Carla Beni, professora de MBAs da FGV, a melhora geral dos índices macroeconômicos no país estimula melhores resultados e a busca por investimento das empresas privadas.

“Se tem observado uma melhora de uma forma geral em todos os índices da economia em relação ao ano passado. Por exemplo, se pegar todos os dados econômicos do fim de 2023, você repara que nós fechamos com a inflação menor do que era esperado, o crescimento do PIB muito melhor do que foi projetado, o desemprego muito menor do que nos anos anteriores e uma projeção melhor em todos os dados econômicos”, destaca.

Beni reforça que esse cenário somado a uma melhora também no crédito das empresas e a trajetória de queda da Selic faz com que as companhias projetem melhores retornos sobre os investimentos, e isso vai ser sinalizado na questão dos fundos.

“Isso acontece porque a base de raciocínio do título de crédito privado é que você consiga receber. Então, se você tem uma melhora do cenário econômico, as empresas pretendem investir, e por fim uma redução do risco de inadimplência. Com isso, quanto maior for a chance de você receber esse título, existe uma tendência maior de captação para esse fundo”, ressalta a economista.

Investimento público e privado

Carla Beni também cita a ligação entre setor público e o privado para o aumento das oportunidades em títulos de crédito. Segundo ela, por exemplo, se o Governo lança projetos que incentivam determinada área, o setor privado também avança.

“Por exemplo, se você pegar o PAC 3, que tem investimento no setor imobiliário, você vai dinamizar esse segmento. O setor privado caminha junto do setor público, eles não são excludentes”.

Vácuo de outros ativos e disseminação do setor

Outro ponto que foi levantado como motivo do crescimento dos fundos de crédito privado foi a oportunidade de ocupar um vácuo que surgiu de outros ativos, que surgiu por mudanças recentes em legislações sobre impostos e emissões de outros ativos de renda fixa. 

O Conselho Monetário Nacional (CMN) anunciou restrições nos lastros elegíveis para os títulos isentos como LCIs, LCAs, CRIs e CRAs. Antes, como não havia regras claras sobre o que poderia servir como lastro, muitas emissões tinham pouca relação com os setores imobiliário e do agronegócio. A nova regra busca corrigir essa distorção.

Para Jessica Mota, Diretora de Operações na Bloxs, historicamente, esse tipo de estrutura era direcionada ao público de varejo. Assim, com a restrição, a tendência é que caia a oferta desses papéis, aumentado a busca dos investidores por outras alternativas, como fundos de crédito privado.

Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos, aponta que o crescimento tem vindo em linha direta com o processo de desbancarização do crédito às empresas no Brasil. “O crédito através desses fundos tem sido muito mais vantajoso e simples do que pelas instituições tradicionais, bem como por taxas mais atrativas”, explica.

Pelo lado do investidor, ele diz que esses recursos têm chegado em busca de melhores alternativas e de diversificação de investimento, além de uma atratividade maior se comparada a outros títulos de renda fixa.

Mudanças na projeção da Selic podem afetar os fundos?

Destacado como um dos motivos da boa campanha dos fundos de crédito privado no último ano, o cenário de queda de juros foi colocado em xeque nos últimos dias. O mercado aguarda com expectativa os próximos passos do Banco Central em relação à taxa Selic. Nessa semana, o relatório Focus, que antes previa a taxa básica de juros em 9% ao fim do ciclo, agora já prevê a Selic de 9,50% no final do ano.

De acordo com a professora da FGV, há dois fatores que devem ser avaliados: a trajetória de queda da Selic e a troca da presidência do BC até o fim do ano. 

Para ela, nenhum desses fatores mostra uma mudança de rota do Banco Central. Ela também espera que a suavização do ritmo de baixa da taxa de juros não interferiria tão drasticamente no desempenho dos fundos de crédito privado.

“Isso só aconteceria se o Banco Central voltar a subir a taxa de juros ou diminuir muito a queda. Com isso volta a dificultar o setor produtivo e a captação desses fundos começa a diminuir”, aponta.

Caso Americanas ainda impacta o setor de crédito?

No início de 2023, a Americanas, que se descobriu um rombo bilionário em seu balanço, abalou a confiança do mercado e dificultou o crédito no País. Esse fator pode ser visto claramente na tabela de captação. Nos 5 primeiros meses de 2023, houve uma saída de capital dos fundos de crédito privado.

Jessica Mota destaca que com o susto, “o mercado precisou parar e olhar para dentro de casa, tanto para revisar suas operações em andamento, quanto para reestruturar os processos internos de controle de riscos e gestão dessas operações, a fim de evitar surpresas e assumir uma postura muito mais ativa”., 

Com isso, conseguiram se antecipar aos problemas de seus tomadores, seguindo o caminho de renegociação das dívidas e, com isso, mitigar o risco de defaults. Então, o momento atual é, sem sombra de dúvidas, de retomada.

Contudo, o analista da Ouro Preto vê menos influência do caso nos bons desempenhos atuais. “Acredito não ter uma relação direta com a percepção sobre esses fundos atualmente. O crescimento está muito mais alinhado ao novo momento das empresas e investidores, além da expansão ao acesso desse tipo de crédito”.

Ele afirma que essa retomada tem sido impulsionada pela busca de oportunidades, diversificação e pela necessidade das empresas se reestruturarem e captarem recursos para crescimento e operação.

+ Os riscos e as vantagens para quem busca investir em crédito privado

Perspectivas para fundos de crédito privado em 2024

Sidney Lima aponta que para o restante de 2024 se espera que esse tipo de fundo continue em considerável expansão, como já vem demonstrando ano a ano. Ele também espera boas performances, apoiadas na gestão especializada e na demanda sustentada por títulos com boas classificações de crédito. 

A diretora de Operações na Bloxs ainda completa que, apesar das incertezas no cenário mundial, o doméstico é bastante promissor. 

“Alcançamos a estabilidade da política monetária, mudanças nas diretrizes tributárias, definição da âncora fiscal, queda dos juros, controle inflacionário, entre outros fatores, que fazem com que os empresários se sintam seguros para tomar crédito e pensar na expansão de seus negócios e os investidores, por outro lado, busquem diversificação de suas carteiras e alternativas que proporcionem uma maior rentabilidade”, enfatiza.

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