Entenda a discussão em torno de uma possível mudança da meta fiscal em 2024
Equipe econômica tenta convencer Lula a manter a meta de déficit zero no ano que vem. Ala do governo defende resultado negativo de até 1%. BC cobra perseguição da meta.
As discussões em torno de mudanças na meta de zerar o déficit das contas públicas em 2024 tem trazido ruídos dentro do governo, além de cautela entre os especialistas do impacto que essa alteração pode trazer nas expectativas econômicas.
No início da semana, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso aprovou o parecer preliminar da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024. No projeto, a meta de receitas e despesas no zero a zero foi mantida, o que deu mais tempo para a Fazenda.
Apesar de passar na CMO, a batalha não foi vencida, pois parece que tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quanto a ala do governo representada por Rui Costa (Casa Civil), querem desistir do objetivo de déficit zero.
Com a aprovação da LDO, a mudança na meta só pode ser feita com uma emenda apresentada por algum parlamentar até a próxima quinta-feira, 16/11. Nessa data será feito o relatório final, com votação prevista para o dia 22/11.
Segundo o relator da LDO, deputado Danilo Forte (União-CE), o ministro da Casa Civil, já sinalizou que essa emenda será enviada em breve. No entanto, o valor do déficit ainda depende de estudos elaborados pelo ministério da Fazenda.
“O governo está estudando possibilidade de apresentar uma emenda para a revisão da meta. Essa resposta depende do governo, é uma iniciativa deles, não nossa”, disse.
Nos bastidores, a Casa Civil estuda limitar o objetivo fiscal a um déficit primário de até 0,5% do PIB em 2024. Os parlamentares defendem um déficit maior, de 0,75% ou 1% do PIB.
Impactos no mercado
Os sinais controversos de que o governo não deve manter as contas públicas em equilíbrio no ano que vem, tem pressionado negativamente o mercado.
O economista-chefe Warren Rena, Felipe Salto, afirma que uma eventual mudança da meta fiscal seria péssimo sinal para os rumos da economia e dos ativos.
“Não se trata do valor, em si, mas da inconsistência lógica entre a permissão contida no arcabouço fiscal para romper a meta, desde que se promovam os acionamentos dos mecanismos de ajuste. Se a meta pode ser alterada ao menor sinal de pressões políticas, então o último que sair já poderá apagar a luz”.
Impactos na credibilidade e orçamento
Pelo lado da manutenção do objetivo de déficit zero em 2024, a equipe econômica vê esse movimento como uma forma de trazer credibilidade ao governo. Há também o entendimento que uma alteração prejudicaria o andamento das medidas para aumentar a arrecadação.
Já pelo lado do governo que defende alterar a meta, o receio é que o déficit zero implicaria em cortes relevantes no orçamento ao longo de 2024 – principalmente nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos do presidente Lula.
“Um centro para a meta de -0,5% – com banda de -0,25% do PIB, totalizando déficit máximo de -0,75% – não resolveria o desejo de não contingenciar ‘uma vírgula’ de gastos. Com -0,75%, seria preciso cortar R$ 40 bilhões da despesa não obrigatória. O risco, por óbvio, é pretenderem uma meta de -1% do PIB”, calculou Felipe Salto.
Recados do BC
Na ata da reunião do Comitê de Política Monetária, divulgada nesta semana, o Copom afirmou que o aumento das incertezas sobre as contas públicas vem pressionando as taxas de juros futuras.
Para o Comitê, um aumento de gastos pode pressionar a inflação. Portanto, o documento reiterou que as metas estabelecidas devem ser seguidas para ajudar no esforço de levar os preços à meta.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou ontem, 08/11, que mudar a meta fiscal nesse momento poderia levar o mercado a interpretar que o arcabouço fiscal foi “abandonado” pelo governo.
“A nossa visão é que a meta fiscal já tem muitas previsões para quando você não conseguir cumprir a meta. Portanto, alterar a meta neste momento geraria muita incerteza”, afirmou num evento nos Estados Unidos.
Medidas para aumentar a arrecadação
Para tentar evitar uma piora maior das contas públicas, o ministério da Fazenda tem atuado para aprovar medidas de aumento da arrecadação. Dentre elas estão:
- Fazer cumprir a decisão do STJ que obriga que os impostos abatidos pelas empresas sobre determinados incentivos fiscais dados por estados (subvenções) voltem a serem pagos. Para buscar os valores atrasados, o Congresso ainda precisa aprovar uma Medida Provisória, o que daria um incremento de R$ 90 bilhões na arrecadação.
- projeto para taxar fundos exclusivos e offshores, além de mudar regras dos mecanismo das empresas de juros sobre capital próprio.
Na segunda-feira, 07/11, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a busca por um melhor resultado fiscal não vem da “cabeça do ministro”.
Em meio a essas discussões, as contas do setor público consolidado (governo Federal, estados, municípios e estatais) registraram déficit primário de R$ 97 bilhões nos nove primeiros meses de 2023, segundo o Banco Central.
No mesmo período do ano passado, as contas públicas haviam registrado um superávit de R$ 126 bilhões. A piora no acumulado do ano é de R$ 223 bilhões. Esse saldo negativo representa o pior resultado para o período desde 2020, início da pandemia da Covid-19.
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