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Não faz sentido deixar de pagar a previdência pública, diz diretor de Instituto

Gleisson Rubin, matemático especialista em políticas públicas e gestão governamental, alerta para que trabalhadores por conta própria e MEI assumam a responsabilidade de contribuir para uma renda vitalícia no período de inatividade

INSS. Foto: Marcelo Casal Jr./Agência Brasil
O INSS é o Instituto Nacional do Seguro Social. Foto: Marcelo Casal Jr./Agência Brasil

As regras futuras da aposentadoria do Instituto Nacional de Previdência Social (INSS) são incertas. Especialistas são unânimes em dizer que provavelmente o benefício ficará cada vez mais difícil de ser acessado, conforme o avanço da expectativa de vida no país. Como já houve uma reforma da Previdência, virão outras. Contudo, isso não significa que os brasileiros devam parar de contribuir para a aposentadoria pública.

É o que aponta o diretor do Instituto de Longevidade Gleisson Rubin, matemático de formação e especialista em políticas públicas e gestão governamental. “O trabalhador com carteira assinada contribui com um percentual da sua renda (de 7,5% a 14%, conforme o salário) e o empregador contribui com o mesmo valor. Lá na frente, quando se aposentar, o retorno desse “investimento” será inteiramente seu, na forma de um rendimento mensal vitalício”.

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Por que continuar pagando a previdência pública?

A contribuição ao INSS dá ainda acesso a uma série de proteções, como auxílio-doença, pensão por morte, salário-maternidade e aposentadoria por invalidez. “Não faz sentido, racionalmente falando, renunciar à adesão a um regime de previdência, seja ele público ou privado”. Em geral, a diferença será de 1 salário pago para 4 recebidos. Mesmo que essa proporção diminua, ainda será muito alta”.

Ele cita dois exemplos. No primeiro, o valor do desconto do INSS no salário de uma segurada mulher é de R$ 665,92. Incluindo a contribuição patronal, que é feita no mesmo valor, a contribuição total para o INSS, por mês de trabalho, é de R$ 1.331,84. Em 35 anos, tempo necessário para que ela receba 100% do salário que teve ao longo da vida profissional, a contribuição total ao INSS terá sido de R$ 559.372,80, ou R$ 560 mil em valores arredondados. O que ela receberá de benefício durante 20 anos estimados de sobrevida corresponde a R$ 1,44 milhão.

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No exemplo 2, ele considera um segurado autônomo (onde não há a contribuição patronal) que decide contribuir para o INSS com um valor de R$ 380, que corresponde ao que é descontado de uma renda de 3 salários mínimos (hoje esse valor é de R$ 3.960). Ao contribuir por 15 anos ele faz jus a um benefício de 60% dos três salários mínimos. A contribuição total dele ao longo dos 15 anos será de R$ 68.400,00 e o que ele receberá de benefício em 20 anos será de R$ 570 mil.

“Ou seja, neste caso, ele receberá em torno de oito vezes mais o que depositou no sistema. Claro, isso se o beneficiário viver por 20 anos e essas regras sejam mantidas: é um seguro, e não um investimento”.

Caso a previdência pública não seja garantida, será necessário investir um valor ainda maior na previdência complementar, obrigatória especialmente para quem tem salário acima do teto do INSS, hoje de R$ 7 mil, e deseja manter seu estilo de vida na aposentadoria. É necessário lembrar que são poucos os planos de previdência que oferecem renda vitalícia e, os que existem, exigem valores altos de contribuição.

30% dos brasileiros não contribuem para o INSS

Ainda assim, de acordo com dados do IBGE coletados pelo Ministério da Previdência Social, 30% dos brasileiros (25 milhões) não contribuíam para o INSS em 2021.

Eram 11 milhões de trabalhadores por conta própria, 8 milhões de trabalhadores sem carteira assinada; 2,8 milhões de trabalhadores domésticos sem carteira assinada; 607,4 mil trabalhadores públicos sem carteira assinada; 699,1 mil empregadores e 683,9 mil trabalhadores familiar auxiliar.

Entre a população idosa, 44,1% (13,7 milhões) estava desprotegida. Do total de idosos desprotegidos, 1,1 milhão estavam inativos, 815 mil ocupados e 167,2 mil desocupados. Apenas entre os trabalhadores com carteira assinada, seja funcionário privado, trabalhador doméstico e funcionário público, não existem desprotegidos do INSS, bem como entre militares.

Em palestra na abertura da Semana de Educação Financeira ENEF), Narlon Gutierre Nogueira, diretor do Departamento de Políticas e Diretrizes e Previdência Complementar, demonstrou o reforço que os benefícios da previdência social proporcional. Segundo o diretor, caso não houvesse previdência social, o nível de pobreza média do país subiria de 32% para 45%, considerando um rendimento familiar de R$ 606, de acordo com dados de 2021. O aumento seria mais expressivo entre idosos, onde subiria de 10%, em média, para 60%.

A pobreza na fase da velhice tem efeito mais contundente, ressalta Rubin. “Não existe mais a possibilidade de obter recursos ou renda extra. É diferente da pobreza ativa, na qual ainda é possível buscar meios para garantir a sobrevivência”.

Situação dos desprotegidos pelo INSS é problemática

O diretor do Instituto de Longevidade aponta que a situação dos desprotegidos é “problemática” e decorre da mudança de formato dos empregos. “No pós-guerra, até os anos 80, o emprego estava associado a um vínculo formal. Hoje um trabalho está muito ligado a ser dono do próprio negócio. Figuras como o MEI (Microempreendedor Individual) se popularizaram”.

Para quem é assalariado, explica, a contribuição ao INSS é vista forma natural, pois é responsabilidade do empregador, não do empregado: ele não tem como escapar dela. “Empresas que não recolherem o INSS estão sujeitas a penas que variam entre 2 e 5 anos”.

Já no caso de trabalhadores autônomos ou no regime de MEI, as contribuições devem ser feitas pelo próprio trabalhador, diz Rubin. “Falta disciplina para realizar as contribuições, diz Rubin. “Os trabalhadores precisam assumir a responsabilidade”.

No MEI, é possível optar por um modelo simplificado de contribuição ao INSS, que dá direito a um benefício na aposentadoria equivalente a um salário mínimo, ou o plano normal, no qual o benefício será calculado sobre a média de sua remuneração ao longo da vida profissional.

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Pode parecer tentador contribuir a INSS com o valor de um salário mínimo, mas essa decisão irá gerar um histórico de salário que terá impacto sobre o valor do benefício no futuro, diz o diretor do Instituto de Longevidade.

“Esse impacto será maior quanto maior for a renda. O trabalhador pode viver 20 anos após sair do mercado de trabalho: é muito tempo para viver com um salário mínimo, sendo que poderia ter sido mais se cuidadoso e se preocupado mais com o futuro”.

Além de estar abrindo mão de uma renda vitalícia, ligada a diversos benefícios sociais, quem não contribui para a previdência hoje está afetando o pagamento de benefícios de idosos.

“As pessoas não levam em consideração que o modelo previdenciário brasileiro é solidário. Não é você que paga pelo seu benefício no futuro, mas existe um pacto entre gerações. Hoje os trabalhadores sustentam o beneficio de quem já se aposentou. E a próxima geração vai sustentar o de quem está se aposentando hoje”.

Pausa na contribuição afeta valor e tempo da aposentadoria

Em geral, trabalhadores que deixam de contribuir ao INSS por um determinado período retardam o tempo necessário para alcançar a aposentadoria por tempo de contribuição, que é atualmente de 40 anos para homens e 35 anos para mulheres.

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Abaixo desse prazo, o valor do benefício que será recebido vai se reduzindo, até chegar a 60% do valor, no caso de quem tenha contribuído apenas 15 anos para a previdência social, o tempo mínimo exigido.

Além disso, quando se aposentar, o trabalhador corre o risco de receber um benefício menor porque a previdência pública considera a quantidade média das contribuições.

Não contribuiu para o INSS. E agora?

Deixou de contribuir por um tempo da vida profissional? É possível começar a contribuir e ter como objetivo ao menos atingir o tempo mínimo, de 15 anos, em qualquer idade.

Neste caso, é importante verificar qual a renda que se deseja ter no período de inatividade. “O trabalhador terá, ao se aposentar, apenas 60% do benefício, balizado pelo salário mínimo. Se contribuiu com uma média de três salários mínimos (R$ 3960 reais), ou seja, R$ 380 por mês, receberá R$ 2376 pelo resto da vida”.

Atualmente, ressalta Rubin, chegar aos 70 anos não é uma sentença de morte. “As pessoas desejam continuar a usufruir da vida, viajar e consumir. Portanto, precisam se preparar para isso, começando pelas contribuições para a previdência pública”.

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