Entrevistas

Paratleta olímpico se consagra como fundador do 1º banco digital para PCDs

Hexacampeão brasileiro e tetracampeão sul-americano, Gelson Junior se dedica a ampliar o acesso a crédito para reabilitar cada vez mais PCDs ao mercado de trabalho

Da quadra de basquete em cadeira de rodas para a mesa dos negócios. O desafio do paratleta olímpico Gelson Junior mudou de ambiente, mas continua tão competitivo quanto antes. Sua competição, agora, é no mercado financeiro, local em que já teve contato antes de se aventurar no mundo esportivo. Ele se consagrou como fundador do primeiro banco digital para Pessoas com Deficiência (PCDs), o Parabank, que foi criado em 2022 para levar crédito àqueles que mais precisam de ajuda para custear o tratamento na reabilitação.

O mundo financeiro não é estranho a ele. Gelson já atuou nas principais instituições financeiras e foi onde ele percebeu uma “dor latente” em crescimento: a desbancarização dos PCDs. “O mercado precisava de um ecossistema para essas pessoas, com uma conta digital, linhas de crédito específicas, um canal de marketplace para os principais fornecedores e de capacitação com cursos”, conta.

Aos seis meses de vida, Gelson teve uma paralisia infantil rara chamada de poliomielite. Por isso, ele entende as necessidades dos outros PCDs que procuram por reabilitação e não conseguem devido às dificuldades de acessar o crédito.

Ao Bora Investir, ele conta os próximos passos do banco digital, inclusive sobre o novo cartão de crédito aos PCDs a ser lançado em breve. Confira.

Bora Investir: Pode relembrar como foi o começo do Parabank e por que decidiu criá-lo? 

Gelson: Eu sou do mercado financeiro e trabalhei nas principais instituições financeiras do País. Eu enxerguei uma dor latente que é a desbancarização das pessoas com deficiência. Estamos falando de um mercado com cerca de 20 milhões de PCDs e 1,5 milhão de pessoas com deficiência desbancarizados. Uma fila no SUS de aproximadamente 2 milhões que precisam de uma prótese ou cadeira de rodas. A ideia começou num formato de criar um cartão para usar nesses ambientes de clínicas. Depois evoluímos e vimos que o mercado precisava de um ecossistema para essas pessoas, com uma conta digital, linhas de crédito específicas, um canal de marketplace para os principais fornecedores e de capacitação com cursos. Ainda está embrionário e temos muitas melhorias. 

Bora: E a rotina como atleta paralímpico junto com a de empreendedor?

Gelson: Eu sou ex-atleta da seleção de basquete de cadeira de rodas e eu participei dos principais torneios internacionais, ParaPan mundial, sou tetra campeão do Sul Americano. Foram 16 anos na seleção brasileira. Eu participei na Paralimpíada de Pequim, em 2008, e o ápice para mim foi disputar em casa na Paralimpíada do Rio. Mas me aposentei da seleção em 2018, e hoje eu pratico alto rendimento mais por hobby por causa das demandas aqui no Parabank. Sou apaixonado por esporte, mas não consigo mais entregar toda aquela dedicação, que eram cerca de seis a oito horas. Eu não tinha como conciliar mais a empresa com o esporte. Já o Renato [diretor] está indo para a quinta paralimpíada dele. Um baita paratleta do vôlei. Ele está indo para Paris e acredito que seja a última, porque ele fez a promessa de se dedicar mais ao Parabank. Ele vai como jogador e eu só vou acompanhar.

Bora: Quantos clientes já atende?

Gelson: Temos uma carteira de cinco mil clientes. Demos uma segurada na abertura de novas contas e comunicação para novos clientes porque surgiu a parceria com a Visa, e precisamos reestruturar toda nossa tecnologia. Isso já tem seis a oito meses, mas continuamos crescendo em produtos e serviços visando essas campanhas que vem agora no meio do ano por causa da paralimpíada. Daqui duas semanas teremos um app novo, nova comunicação de marketing para paralimpíadas com um novo cartão do Parabank. Esperamos 25 mil clientes neste primeiro ano com uma campanha massiva.

Bora: Quando um PCD faz um cadastro com vocês e precisa do serviço do Parabank para custear as despesas com tratamento em clínicas, o que ele precisa fazer para ter esse acesso?

Gelson: Não somos mar aberto. Não é qualquer clínica que entra no nosso ecossistema. Então, sabemos bem quais são as clínicas que entregam qualidade e dão um serviço de reabilitação. Cerca de 90% das clínicas com qualidade fazem parte do nosso ecossistema. Dentro delas, a gente tem uma linha de crédito específica, obviamente seguindo todos os critérios do Banco Central, então o cliente tem que ter um score adequado e as pontuações. Hoje, nossa linha exclusiva está dentro das clínicas. O cliente passa na clínica e abre uma conta no Parabank, ou o contrário. Ele vai tentar passar nessa linha de crédito para ter os serviços de reabilitação. A gente deve ter um resultado bem expressivo em novembro, quando a gente fechar [o relatório] com todas as clínicas e ver quantos clientes realmente reabilitamos.

Bora: Além dos critérios do BC para conceder o crédito, o Parabank leva em conta algum outro critério que somente os PCDs têm? 

Gelson: Estamos sempre lutando pelos nossos clientes. A gente possui alguns fundos plugados dentro da plataforma. Alguns desses fundos não têm tanta autonomia por conta do cenário macroeconômico do País, então, o crédito não está fácil. Nós tentamos entender a situação do cliente e de que forma ele chegou na clínica. Buscamos ser mais assertivos. Mas a situação do País não é a melhor para crédito. Estamos falando de um público C, D e E, que geralmente, mesmo quando tem o score necessário, dificilmente consegue aprovação. Às vezes liberamos alguma coisa em caráter de exceção, mas levamos todos os critérios dos fundos e do BC muito a sério. A gente pretende melhorar a operação e esperamos que o cenário de crédito melhore, mas ainda está longe do ideal, principalmente para nosso público.

Bora: Como funcionam as linhas de crédito para o empreendedorismo?

Gelson: Começamos há dois anos e ainda temos muitos produtos para trazer. Esse é um deles. Ainda estamos indo atrás de parceiros que queiram realmente ajudar essas pessoas a crescerem e se tornarem novos Gelsons, novos Renatos, novos empreendedores com deficiência. A gente tem buscado estruturar esse produto. Viemos com foco na reabilitação porque um PCD bem reabilitado pode gerar oportunidades. Acho que o esporte e a reabilitação é o mais importante nesse primeiro momento. Ele pode ter o investimento que for, mas sem uma boa reabilitação ele não consegue se desenvolver.

Bora: Há cursos de educação financeira aos clientes PCDs?

Gelson: Nós temos uma parceria com a XP Educação. Indicamos para as pessoas alguns cursos. Com a entrada da Visa, vamos vir com muita comunicação de educação, principalmente na linha de crédito. Para ter uma conscientização do uso do crédito para não ficar tão endividado. Há um ano fundamos o Para Instituto, um braço do Parabank, e vamos lançar uma clínica de reabilitação. Vamos ter cursos para desenvolvedores de softwares. A gente pretende reabilitar e capacitar 100 jovens em vulnerabilidade social, junto com outros parceiros, como Itaú e Visa, e vamos integrá-los ao mercado de trabalho. Estamos buscando o tempo todo para principalmente reabilitar porque entendemos que é a melhor ferramenta para o PCD.

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