Entrevistas

“A mulher é mais disciplinada e pensa mais na preservação do patrimônio”, diz fundadora do Women Invest

Maria Helena Valio conversou com o Bora Investir sobre o comportamento das mulheres investidoras

O número de mulheres investidoras vem crescendo no Brasil, mas elas ainda são minoria entre o total de investidores no País. De acordo com levantamento da Anbima, só um terça das mulheres declararam ter algum investimento em 2022. Além disso, quando elas investem, trazem alguns comportamentos diferentes dos homens. As mulheres buscam mais os gerentes, assessores e especialistas para decidir em quais produtos investir do que os homens.

Para Maria Helena Valio, fundadora da Women Invest, há ainda um componente cultural. Muitas vezes as mulheres delegam o cuidado com o dinheiro aos homens. E começam a se preocupar mais com as finanças perto dos 45 anos, quando querem se planejar para o futuro, que envolve cuidado com os filhos, com os pais e sua própria aposentadoria.

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Em entrevista ao Bora Investir, ela falou sobre o papel crescente das mulheres no mercado financeiro e como suas características têm transformado o setor. Valio destacou que, ao contrário do estereótipo de cautela excessiva, as mulheres tendem a ser mais disciplinadas e interessadas em aprender sobre os investimentos antes de tomar decisões. Ela também comentou sobre a importância de um modelo de assessoria transparente e o papel fundamental que as mulheres de 40 anos ou mais vêm desempenhando na construção de um legado financeiro.

Bora Investir: Na sua visão, como a maior presença das mulheres nos investimentos pode transformar o mercado financeiro? Quais características você vê que as mulheres trazem para a mesa?

Maria Helena Valio: É sempre importante lembrar que todos têm precisam cuidar do dinheiro, independentemente da profissão. O que percebemos é que, quando falamos de investimentos, as mulheres tendem a delegar essa tarefa aos homens, talvez por uma questão cultural, acreditando que isso é “coisa de homem”. Mas o cuidado com o seu dinheiro é responsabilidade sua. Isso é fundamental.

Nos últimos anos, temos observado que as mulheres se preocupam mais com o legado e com o futuro. Elas tendem a ser mais conservadoras e gostam de investir sabendo no que estão se envolvendo. Quando precisam resolver algo (não só no campo dos investimentos) elas vão e aprendem um pouco sobre aquilo. A mulher é mais disciplinada nesse sentido. Temos sentido uma demanda muito grande das mulheres para aprender sobre finanças básicas.

Além disso, o que notamos no Women Invest é que a maioria das mulheres que vêm ao nosso grupo têm mais de 45 anos. Isso ocorre porque, nesse momento da vida, começam a olhar para o futuro de uma maneira diferente, pensando: “Eu posso chegar aos 90 anos, então como eu vou garantir minha qualidade de vida? Como manter meu padrão, plano de saúde, cuidar dos meus pais, pensar no futuro dos meus filhos?”. A mulher investidora pensa mais na preservação do patrimônio, enquanto o homem muitas vezes está mais focado em ganhar e aumentar a renda.

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Bora Investir: Muitas vezes falam que as mulheres são mais conservadoras ao investir. Em paralelo, alguns estudos mostram que, no longo prazo, elas acabam tendo um desempenho melhor. O que você acha que explica isso?

Maria Helena Valio: O que acontece é que as mulheres tendem a ser mais equilibradas ao conciliar risco e retorno, o que pode resultar em um melhor desempenho. Elas avaliam melhor, querem entender o que é volatilidade, como funciona o investimento. Além disso, há uma humildade em reconhecer que, se algo é novo, é preciso aprender. E muitos homens acham que já sabem. Muitas vezes, nas palestras, as mulheres levantam a mão e perguntam: “Posso fazer uma pergunta boba?” Essa humildade leva a uma disposição maior para aprender, o que se traduz em melhores resultados.

Bora Investir: Desde 2019, quando começou o Women Invest, o que mudou no comportamento das mulheres em relação aos investimentos?

Maria Helena Valio: As mulheres que começaram em 2019 no nosso grupo, em geral, ganharam mais segurança. Elas estão mais confiantes para avaliar quem está as atendendo, o que podem esperar, e já entendem a importância de não tomar decisões precipitadas. Nosso crescimento se deu muito por indicação, porque uma mulher começa a ver os resultados, gosta do que está aprendendo e acaba indicando para outra. É um processo de desmistificação, e muitas percebem que falar de finanças não é um bicho de sete cabeças, é algo que pode ser interessante.

Bora Investir: O mercado brasileiro tem discutido muito os modelos de assessoria de investimento. Você acha que o modelo “fee-based” pode fazer mais sentido e atrair mais mulheres para o mercado financeiro?

Maria Helena Valio: Sim, desde nosso primeiro encontro, em 2019, essa era uma grande questão. A partir do momento que você entende que você paga sim pelo serviço do assessor de alguma forma, a relação de transparência aumenta. E não estou nem falando que alguém está atendendo mal, mas você tem que entender. De novo, é essa coisa da mulher de querer entender o que está sendo feito.

Você tem que entender o papel de cada um, o que um assessor ou consultor pode oferecer. E como antes, havia a percepção de que o assessor “não cobrava nada”, você ficava menos propensa a trocar. Na hora que você consegue comparar “laranja com laranja”, faz diferença. Lembrando também que o consultor é o especialista no cliente, enquanto o assessor é o especialista nos produtos. O consultor vai entender o cliente e te ajudar a pensar em como a carteira tem que estar montada. O assessor vai te ajudar a encontrar esses produtos. Um não pode fazer o papel do outro. Essa transparência ajuda a investidora a ver quando está pagando por um serviço de qualidade.

Bora Investir: Como você vê a adesão das mulheres a novas classes de ativos, como as criptomoedas?

Maria Helena Valio: As mulheres têm muita curiosidade e perguntam sobre isso. Mas minha recomendação é sempre ter cautela. Converse com quem é credenciado, busque produtos aprovados por reguladores como a CVM e a Anbima. São classes novas e, como todo ativo novo, podem oferecer retornos altos, mas também apresentam riscos. E, infelizmente, também há muita fraude. Então, escolher quem está autorizado a operar é essencial.

Bora Investir: Quais estratégias você considera mais eficazes para atrair e capacitar mais mulheres no campo dos investimentos?

Maria Helena Valio: Primeiro, é importante conhecer o perfil da mulher investidora. Não é porque uma mulher está sendo atendida por outra mulher que ela está sendo bem atendida. Tem que haver uma compreensão das suas preocupações daquela mulher. As mulheres costumam demorar mais para desenvolver confiança, e o mercado precisa ser acolhedor para elas.

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Bora Investir: Você mencionou que as mulheres que participam do Women Invest têm, muitas vezes, mais de 40 anos. Quais pontos você considera mais importantes para as mulheres ao investir?

Maria Helena Valio: A vida traz essa necessidade, e por volta dos 40, 45 anos, as mulheres começam a pensar em cuidar do próprio dinheiro. Seja porque atingiram um ponto na carreira em que conseguiram acumular patrimônio, ou porque estão pensando em mudar de profissão, elas começam a planejar mais o futuro. Assim como acontece com a saúde, em algum momento você percebe que precisa se cuidar. O mesmo vale para o dinheiro.

No início, muitas mulheres confiam nos homens ao redor delas para cuidar do dinheiro. Não estou dizendo que isso está errado, mas elas precisam entender o que está sendo feito. Não é porque ele é homem que ele entende mais do assunto. E muitas mulheres gostam da renda fixa, que é uma boa escolha no Brasil, especialmente com os juros altos. Além disso, elas têm uma visão mais clara do planejamento futuro, o que é muito importante.

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