Equilíbrio fiscal: o que é e por que é tão importante para os seus investimentos
O Banco Central anunciou que a dívida bruta do setor público atingiu R$ 7,1 trilhões em julho, o que representa 77,6% do PIB. O resultado é melhor do que o de junho e isso sempre anima os investidores
O Banco Central (BC) anunciou nesta quarta-feira (31) que a dívida bruta do setor público atingiu R$ 7,1 trilhões em julho, o que representa 77,6% do PIB. O resultado é melhor do que o de junho – quando a dívida pública chegava a 78% de toda a riqueza produzida – e isso sempre anima os investidores.
Mas por que, afinal, os investidores profissionais ficam tão animados diante de uma queda na proporção da dívida em relação ao PIB?
Fique tranquilo, vamos explicar agora para você por que o Ibovespa B3 costuma subir quando o governo corta gastos e por que o mau humor se instala quando a relação dívida/PIB aumenta.
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Como é o balanço do setor público?
Bora começar entendendo o que é a dívida pública? No orçamento do governo, assim como no das empresas, há entradas de receita – via arrecadação de impostos, venda de empresas ou propriedades e concessões, por exemplo – e saídas – com pagamento de salários, custos de manutenção e investimentos, entre outros.
Todos os anos, o “balanço” do governo é discutido pelos poderes Executivo e Legislativo, tentando cumprir as exigências da Constituição – prover acesso a saúde, educação, transporte, etc para a população – e, ao mesmo tempo, respeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Estabelecida em 2000, após o Plano Real, a LRF estabelece limites de gastos dos governos federal, estaduais e municipais e exige, por exemplo, que o gestor público aponte de onde vai tirar o dinheiro para aplicar em um novo projeto.
Mas, se o próprio governo federal, por meio da Casa da Moeda, pode imprimir mais reais para pagar as contas, por que a preocupação com os gastos?
Em primeiro lugar, porque imprimir moeda geraria inflação, o que corroeria o poder de compra. Em segundo lugar porque pegar mais dinheiro emprestado aumenta o risco de um eventual calote. E, nesse caso, para continuar atraindo investidores dispostos a emprestar, o governo precisa pagar prêmios (ou juros) maiores. Com isso, o custo da dívida aumenta e mantê-la consome cada vez mais recursos do PIB – diminuindo a margem para investimentos importantes para o crescimento do país.
Essa relação entre o descontrole das contas e o aumento do custo da dívida leva os investidores a ficarem de olho no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e, mais recentemente, do chamado “teto de gastos”. Leia mais sobre essa regra abaixo.
Na lógica dos investidores, se a administração pública se compromete a gastar o que está estabelecido, maiores as chances de a taxa básica de juros se manter mais baixa.
Quanto menor essa taxa, mais barato é o crédito para empresas e para a população, e mais crédito é concedido, consequentemente aumentando a circulação de dinheiro e promovendo crescimento da economia. Se a economia vai bem, os ativos do país se valorizam – melhorando a carteira dos investidores.
Como medir a saúde financeira de um país?
Uma das formas para calcular a capacidade do governo de se endividar de forma saudável, gastando sem exageros e com plena capacidade de pagar o que deve, nos prazos estabelecidos, é o indicador que mede a relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB).
Dessa maneira é possível saber quanto do PIB (soma de todas as riquezas produzidas pelo país), em termos percentuais, o governo gasta anualmente.
Segundo dados divulgados nesta quarta-feira (31), a dívida bruta do setor público atingiu R$ 7,1 trilhões em julho. É um valor alto, que equivale a 77,6% do PIB. Mas como, em junho esse indicador estava em 78% do PIB, o número representa um certo alívio para quem torce para a recuperação da economia. Pelo menos, parou de piorar.
A dívida bruta é um indicador que compreende todos os compromissos financeiros assumidos pelo setor público, levando em conta os débitos existentes com os governos federal, estaduais, municipais e as empresas estatais, excluindo as do grupo Petrobras e Eletrobras.
O que é a macroeconomia e como ela afeta seus investimentos?
O que é superávit primário?
Além de acompanhar quanto o governo federal gasta e deve, outro número permanece no radar dos investidores que tomam decisões a partir do comportamento da economia, em geral, pela análise fundamentalista.
Para saber se a União tem despesas ou contrai dívidas condizentes com a saúde financeira do País, eles consideram outros dados divulgados pelo Banco Central, que você certamente já ouviu no noticiário econômico: superávit primário e déficit fiscal.
De acordo com o comunicado desta quarta, o setor público brasileiro fechou julho com as contas no azul, registrando um superávit de R$ 20,4 bilhões. Em termos comparativos, um ano antes, havia um déficit de R$ 10,2 bilhões.
Superávit ou déficit são resultados de uma conta bastante simples. Basta subtrair do total das receitas arrecadadas pelo governo o valor das despesas do País – e, para esse cálculo, vamos desconsiderar os gastos com o pagamento de juros da dívida.
Se o saldo for positivo, o governo está operando no azul, e tem, portanto, um superávit primário. Se for negativo, por outro lado, o País entrou no vermelho, pois registrou um déficit primário de suas contas.
Neste ponto, fica claro o objetivo de estabelecer um teto para os gastos públicos: garantir que o governo consiga alcançar superávits para pagar os juros da dívida pública e, ao mesmo tempo, acumular dinheiro suficiente, a fim reduzir o endividamento de médio e longo prazos.
Mas, antes de comemorar um saldo positivo, vale sempre olhar com lupa os resultados. Assim como você deve fazer ao analisar o balanço de uma empresa antes de comprar suas ações. Se as receitas estão aumentando de forma consistente, é bom sinal. Mas, se o resultado positivo veio de uma receita pontual – como a venda de uma estatal, no caso do governo –, o futuro não é tão positivo.
O que é a regra do teto de gastos?
Em 2016, quando o Brasil estava com as contas no vermelho, gerando déficits fiscais consecutivos, o governo entendeu que era preciso criar um mecanismo para frear esse movimento.
Naquele ano, o então presidente Michel Temer e o seu ministro da Fazenda Henrique Meirelles formularam uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que mais tarde foi aprovada pelo Congresso Nacional, para estabelecer um limite para os gastos federais, pelos próximos 20 anos.
A regra, que passou a valer a partir de 2017, prevê que os gastos do governo sejam os mesmos de 2016, só reajustados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Dessa forma, o orçamento de um ano está limitado ao reajuste da inflação do ano anterior.
Quais gastos do governo precisam respeitar o teto?
Entram no cálculo do teto dos gastos as despesas que o governo tem com a manutenção de sua estrutura, como, por exemplo, o pagamento de salários de funcionários públicos e pensões. Só esses gastos já equivalem a cerca de 90% do total.
Os investimentos, que entram na conta das despesas não obrigatórias, também estão sujeitos à regra do teto de gastos.
Apenas alguns itens bastante específicos e tidos como fundamentais à manutenção do Estado ficam de fora, como as transferências do governo federal para estados e municípios, os recursos aplicados em empresas estatais e o repasse para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), por exemplo.
O dinheiro usado para pagar os juros da dívida pública aos investidores que aplicaram seus recursos nesses títulos do governo também não entram no cálculo.
Quais os riscos se o governo furar o teto de gastos?
No auge da pandemia, o noticiário trouxe análises de que o governo federal iria “furar o teto” diante da necessidade de gastar recursos para conter os impactos da Covid-19 no País. Com muitas pessoas sem poder trabalhar por causa da pandemia, surgiu o auxílio emergencial.
Em 2022, já durante a queda no número de mortes causadas pelo vírus, o governo de Jair Bolsonaro buscou estender o estado de emergência e conceder novos benefícios, estouraram o teto de gastos – preocupando muitos analistas do mercado.
Para isso acontecer, a regra do teto de gastos foi modificada, assim como a legislação eleitoral, que não permite a criação de benefícios antes do pleito. O governo federal conseguiu a permissão do Congresso para gastar outros R$ 41,2 bilhões fora do teto para pagar programas sociais, como o Auxílio Brasil, e as bolsas taxista e caminhoneiro, na PEC que ganhou o apelido de “Kamikaze”.
Somadas, todas as alterações feitas na regra do teto desde 2019 já chegam a R$ 213 bilhões, de acordo com levantamento do Instituto Fiscal Independente (IFI), um órgão vinculado ao Senado que acompanha de perto as contas públicas.
Assim como os defensores do superávit, há os que acreditam que o Brasil precisa ampliar seus gastos sociais, ainda que as contas públicas entrem no vermelho. Para um lado ou outro, o importante é compreender o que cada movimento da economia significa para usar essas informações a serviço dos seus investimentos.