Não estamos otimistas com commodities, diz Alfredo Menezes, da Armor Capital
Ao Bora Investir, CEO da gestora Armor diz que os preços das commodities devem acentuar quedas, especialmente o minério de ferro e o petróleo
Por Marília Almeida
O fundo multimercado Axe, da Armor Capital, começou a ser distribuído há três anos e navegou pela pandemia registrando bons resultados: desde o seu início, em outubro de 2019, sua rentabilidade é equivalente a 255% do CDI. Segundo o CEO da gestora, Alfredo Menezes, o perfil do fundo auxiliou em um cenário de choques.
“Nosso DNA consiste em realizar operações táticas e rápidas, que não estão relacionadas ao cenário de longo prazo e a macroeconomia. Por isso, o fundo tem uma baixa correlação com o restante da indústria”, aponta, em entrevista ao Bora Investir.
Com R$ 500 milhões de ativos sob gestão, recentemente o Axe diminuiu sua volatilidade para 8% e baixou pela metade a sua aplicação inicial, hoje R$ 5 mil. Segundo Menezes, a casa está pronta para receber clientes pessoas físicas depois de um período de aprendizado.
“Como tesoureiro eu tinha de acertar o cenário e falar apenas com os meus pares. Já o fundo tem cota diária transparente. O gestor pode acertar o cenário, mas se errar o timing da sua posição, a cota tem prejuízo e o fundo registra saques”.
A Armor é especializada em moedas, fruto da experiência de seus sócios, Menezes e Andrea Damico, na tesouraria do Bradesco. A gestora também opera juros e ações, especialmente de bancos. Menezes acumula experiência de 40 anos no mercado financeiro e acredita ter boa capacidade de análise do setor.
“Olhamos para a carteira de títulos mobiliários dos bancos. A maioria dos analistas não faz essa análise de quanto oscilaram as taxas no trimestre: olha apenas a parte bancária do resultado. Nós verificamos o quanto a carteira de títulos vai influenciar no resultado e no patrimônio líquido do banco”.
Veja abaixo a entrevista completa do gestor ao Bora Investir:
Bora Investir – O que explica o bom resultado do Axe durante a pandemia?
Alfredo Menezes – O coronavírus foi um susto para todo mundo e gerou um efeito em cauda. Mas na Armor nós temos uma regra de liquidez muito severa: eu tenho de aguentar um ajuste de mercado, parecido com o do Joesley Day, equivalente a uma vez e meia, para não ter de resgatar posições. Ou seja, eu tenho de ter caixa suficiente para pagar o ajuste e não ter de encerrar posições a qualquer preço por conta de liquidez.
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Quando ocorre um prejuízo gradual, não discutimos o encerramento de posições. Mas na pandemia nós reunimos o nosso comitê de investimentos e discutimos tudo para tomar uma decisão com calma. Se não houver liquidez você acaba tendo de encerrar operações e não dá nem tempo para raciocinar.
Tivemos um prejuízo enorme, mas aproveitamos oportunidades onde não tínhamos posições alavancadas, especialmente na taxa de juros. Isso fez com que a cota recuperasse logo e fosse até positiva.
Ter um controle foi essencial: deu para pensar com a cabeça fria. Não dá para dizer que a cabeça estava fria porque ninguém gosta de ter prejuízo, mas pelo menos não estávamos com uma espada na cabeça para resgatar tudo.
Bora Investir – A casa está otimista com a economia brasileira? E qual é a sua visão global?
Alfredo Menezes – O cenário externo está totalmente ligado ao nosso cenário interno. Esperamos que a China cresça de 4,5% a 5%, não mais do que isso, e que o crescimento mundial seja 1,8%. Quando olho a evolução da produtividade, tanto na parte de bens e serviços como das commodities, ela é superior ao crescimento médio mundial que vamos observar.
Portanto, eu não tenho uma visão otimista sobre as commodities. Acho que já entramos em um processo de baixa de preços que vai se acentuar mais. Os setores que mais irão sofrer são os ligados ao minério de ferro e o petróleo.
Além disso, a evolução da energia limpa está sendo muito rápida. O aumento da capacidade das novas baterias dos carros nos últimos cinco anos é surpreendente. Os preços de placas de energia caíram 25% no acumulado desse ano parte pelo câmbio, parte porque ficaram realmente mais baratas. Por conta disso, acreditamos que o preço do petróleo possa cair no médio prazo.
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Mas a nossa principal pauta de exportação, a soja, é 2,5 vezes maior que a do minério de ferro, que é a nossa segunda pauta mais relevante. Na nossa visão, os grãos e a proteína animal são menos elásticos ao nível de atividade da economia e esperamos que a carne e a soja sofram bem menos nesse cenário.
Portanto, o Brasil acaba sendo favorecido pelo cenário por conta da safra recorde de soja, que encara o problema de não ter silos disponíveis para armazenamento. Temos, portanto, um viés otimista em relação à balança comercial do Brasil, e vejo o setor de bens duráveis um pouco mais barato por conta da deflação das demais commodities.
Bora Investir – Esse pessimismo com o minério de ferro e o petróleo tem impacto no Ibovespa?
Alfredo Menezes – A minha visão é que não haverá melhora nos resultados de empresas dos setores de minério, siderurgia e petróleo. Como correspondem a grande parte da nossa bolsa, não consigo ficar comprado em um cenário só do índice: prefiro setores específicos.
Um exemplo são os bancos, que devem melhorar muito o resultado, principalmente por conta de suas carteiras de títulos. A ideia de que juros altos não são bons para os bancos é mentira. Em um cenário de juros baixos você consegue aumentar a carteira de crédito.
Como teve fechamento da taxa de juros de 30 de março até hoje, o resultado da carteira de títulos dos bancos vai melhorar muito. Todos os bancos têm muitas NTN-B, cujas taxas estavam em 6,20% e já chegaram a 5,40%. Em um prazo de oito anos, estamos falando de 9% de ganho nominal, que irá corrigir a carteira de NTN-B desses bancos.
Além disso, o carrego (quanto um ativo de renda fixa gera de rendimentos diariamente) da carteira dos bancos vai melhorar. Do passivo dos bancos no Brasil, 85% é indexado ao CDI. Se eles não têm hedge, é a margem do dinheiro que foi emprestado contra o custo real. Se o CDI cai, aumenta. Nos últimos trimestres o resultado da maioria dos bancos foi negativo, mas agora começarão a ficar positivos. Portanto, tenho um viés otimista com bancos.
Outro setor que será beneficiado pela queda dos juros é o das construtoras, pois você aumenta o crédito imobiliário com taxas de juros mais baixas. O setor de varejo também se beneficia, mas depois do caso da Americanas penso se não pode ter mais empresas com problemas.
Bora Investir – E qual é a sua visão sobre as bolsas americanas?
Alfredo Menezes – O cenário de queda do preço do petróleo é muito bom para a economia americana. O combustível come uma boa parte da renda média do cidadão de classe média. A queda do preço do petróleo, portanto, faz a atividade melhorar sem prejudicar a inflação. Ou seja, estamos comprados na bolsa americana, e temos um viés otimista.
Já a nossa visão para a Europa é muito pessimista. Há 20 anos houve no continente muitos governos de esquerda, e os sindicatos ganharam força. Isso faz com que a briga pela recomposição salarial na França, Espanha ou Alemanha, seja muito forte. Tenho a impressão de que a questão inflacionária na Europa pode ser mais forte do que a observada nos Estados Unidos por conta dessa questão trabalhista.
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Temos 10% de posição em bolsa no Brasil e 25% na bolsa dos Estados Unidos. Ou seja, estamos mais otimistas com Estados Unidos que Brasil no médio prazo.
Os indicadores recentes americanos foram muito bons e a economia americana está deflacionando sem desaquecer a atividade econômica. Acreditamos que há menos de 5% de chance de uma recessão acontecer. Vemos um pouso bem leve da economia, e o resultado das empresas por lá estão surpreendendo positivamente. As big techs são grandes geradoras de caixa. Antes elas tinham receita financeira próxima de zero, e hoje o número subiu para 5%, o que é um agregador para o resultado.
Bora Investir – Acredita que o ciclo de queda da Selic começa em agosto?
Alfredo Menezes – Acredito que o BC deva derrubar os juros já em agosto: a dúvida é se o corte será de 0,25 ou 0,50 ponto porcentual. Tem uma teoria de que todo banco central, quando faz a maldade de subir os juros, faz rápido, porque a taxa final tende a ser menor se aumenta a velocidade. Já quando o ciclo é de queda os juros têm de cair devagar, porque a taxa final também tende a ser mais baixa dessa forma.
Me parece que, pelo estilo do BC, a queda será de 0,25 ponto porcentual. Eu acho que deveria ser 0,50 ponto porcentual, porque o degrau deve ser em função do nível da taxa de juros. Quando a expectativa é de queda da taxa de juros a bolsa dá uma animada, mas quando efetivamente os juros caem a bolsa já antecipou boa parte do movimento.
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Estamos dados em juros prefixados curtos, mas eles correspondem a um pedaço pequeno do patrimônio líquido do fundo. Por outro lado, estamos tomados em títulos com vencimento em julho de 2025, apostando que a taxa de juros estará muito baixa.
Essa taxa estava em 8,96%, mas no Brasil a taxa de juros tem de ter um certo prêmio por conta do descasamento entre ativo e passivo. Uma taxa de 8,90% com 0,5% de prêmio sobra 8,40%. Tirando o 4% dos juros reais, equivale a uma inflação média de 4%, 3,80%. Portanto, não vejo mais potencial de fechamento da taxa de juros prefixada de longo prazo. Acho que já registrou um ajuste significativo.
Temos 32% do nosso patrimônio líquido alocado em IPCA mais juros com vencimento em 2032/35. Fica muito claro que os juros reais do país a 6% leva o país à recessão. Apesar do BC dizer que os juros de equilíbrio é 4,5%, acreditamos que ele está mais para 4%. Portanto, achamos que a NTN-B tem espaço para valorizar mais.
Bora Investir – Vocês são especializados em moedas. No que estão apostando agora?
Alfredo Menezes – Temos apenas operações táticas em moedas. Tenho uma operação cruzada de real e peso mexicano contra o dólar australiano. Por que?
A Austrália é uma grande produtora de minério de ferro. O dólar australiano, com a queda do minério, tende a sofrer mais que a nossa moeda, pois somos produtores de soja, e do que o peso mexicano, já que o país é um grande produtor de bens duráveis para os Estados Unidos. Temos 30% do patrimônio líquido do fundo nessa operação.
Bora Investir – Como estão olhando o ambiente político e o avanço das reformas? Como esse cenário influencia o preço dos ativos?
Alfredo Menezes – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, surpreendeu todo o mercado financeiro. Tínhamos um viés mais pessimista do que tem sido. A parte da reforma tributária já está precificada. O que precisamos discutir é o quanto vai ter de exceções a partir de agora na lei.
O IVA (Imposto sobre Valor Agregado) com alíquota de 25% ou 30% é muito exagerado. Nos Estados Unidos o tributo corresponde a 9% e, na Europa, a média é 18%. Quanto mais exceções abrir para os setores, maior será alíquota final.
Portanto, acredito que as boas notícias do lado fiscal já aconteceram. O cenário depende mais dos juros e do alívio internacional agora.
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