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Peso cai 18% e juros sobem a 118%: crise da Argentina ganha novo capítulo

Vitória do ultradireitista Javier Milei nas eleições primárias também teve impacto na bolsa e provocou alta dos juros. Candidato promete dolarizar a economia e fechar o BC argentino

Javier Milei, candidato argentino. Foto/Reprodução: redes sociais Javier Milei
Javier Milei, candidato argentino. Foto/Reprodução: redes sociais Javier Milei

A crise econômica que a Argentina enfrenta há décadas ganhou mais um personagem nesta semana. A surpreendente votação registrada pelo candidato ultraliberal Javier Milei nas eleições primárias do país mexeu com os ânimos do mercado e com a cambaleante atividade econômica argentina.

O economista de extrema direita, que se autodeclara um “anarcocapitalista” e concorre às eleição presidencial de 22 de outubro, obteve 30,06% dos votos nas primárias. Milei ficou na frente da coalizão de centro-direita, capitaneada por Patricia Bullrich; e da coalização governista, que terá como candidato o atual ministro da Economia, Sergio Massa.

Inflação de 100%, disparada do dólar, dívida alta; entenda a grave crise na Argentina

Quem é Javier Milei e quais são suas polêmicas propostas?

Javier Milei ganhou notoriedade como celebridade da TV ao fazer fortes críticas à classe política. O vencedor das primárias argentinas tem falado diretamente com os eleitores mais jovens, cansados da inflação nas alturas e do aumento da pobreza.

Milei tem 52 anos, é economista e tem ideias mirabolantes para acabar com a crise na Argentina. Destacam-se a adoção do dólar como moeda oficial do país e o fechamento do Banco Central argentino. Atualmente, Milei é deputado, eleito há apenas dois anos.

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O candidato sempre promete “explodir” o status quo político. No discurso de vitória nas primárias, disse estar vendo “o fim do modelo de castas”. “Hoje demos o primeiro passo para a reconstrução da Argentina”.

Os títulos, ações e o câmbio argentino oscilaram de forma agressiva diante das ideias controversas do candidato para a área econômica.

Governo adota medidas para acalmar o mercado

O Banco Central da Argentina precisou atuar para estabilizar os mercados e evitar a fuga em massa dos investidores de ativos domésticos, o que deflagrou a disparada do dólar.

A primeira medida foi elevar a cotação da moeda americana em 22%, que levou a uma desvalorização de 18% do peso, ou seja, 350 pesos para um dólar. Em 12 meses, o peso já perdeu mais da metade de seu valor em relação à moeda americana.

A taxa de juros foi elevada em 21 pontos percentuais, de 97% para 118%. Isso numa economia onde a inflação já subiu para mais de 115%, quatro em cada dez argentinos vivem em situação de pobreza e as reservas cambiais estão baixíssimas.

A partir desta terça-feira, 15/08, as compras semanais de dólar ficam limitadas a 100 mil valores nominais (o equivalente a cerca de US$ 40 mil) para operações no mercado financeiro. A decisão foi da Comissão de Valores Mobiliários da Argentina.

Impactos no mercado financeiro

Em reação positiva à vitória de Javier Milei nas eleições primárias, o índice Merval, da bolsa de valores de Buenos Aires, fechou em alta de 3,30% ontem. Nesta terça-feira, o índice abriu em alta de 2,75%. Ou seja, nem mesmo a alta dos juros e a desvalorização cambial tiraram a força da bolsa argentina.

Na contramão do desempenho da bolsa, o dólar blue (negociado no mercado paralelo) avançou 15%, a 665 pesos. Antes, bateu seu recorde histórico ao atingir 695 pesos. No câmbio oficial, a moeda americana encerrou a sessão em alta de 2,73%, a 349 pesos. Na manhã de hoje, o dólar blue valia 705 pesos e o oficial 345 pesos.

Para o gerente de carteira de câmbio e dívida de mercados emergentes da Fidelity International, Paul Greer, o resultado da eleição primária foi um terremoto político. “Recebemos uma grande injeção de incerteza e o mercado remarcou preços para refletir isso.”

Acordo com o FMI

Importante pontuar que o bom resultado da bolsa argentina também foi puxado pelo sinal positivo do Fundo Monetário Internacional, que irá se reunir em 23 de agosto para aprovar o acordo com a Argentina. O FMI deve emprestar US$ 7,5 bilhões aos hermanos.

Segundo a Capital Economics, mesmo com o apoio do FMI, a economia argentina caminha para uma recessão ainda mais forte do que se desenhava antes das primárias. O movimento acontece diante da depreciação do peso, que pode elevar a inflação.

Ainda de acordo com a casa de análise, a dívida soberana do país latino-americano dificilmente vai entrar numa espiral sustentável. “A próxima reestruturação da dívida soberana da Argentina provavelmente está um passo mais perto”, avalia.

Proposta de Javier Milei de dolarizar a economia argentina pode ajudar?

Em entrevista ao jornal El Clarín, Milei afirmou “não deixem que me culpem pelo problema do dólar”. O candidato disse ainda que sua proposta de dolarização é feita para pessoas que entendem de teoria monetária e “não para burros”.

Para especialistas, a ideia de dolarizar a economia traz benefícios rápidos para a economia do país, como a queda da inflação e o fim do câmbio paralelo.

Entretanto, os rumos da economia da Argentina passariam a ficar vinculados às decisões do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos.

O que esperar das eleições argentinas?

Diante do resultado das primárias, os analistas da Wells Fargo já esperam uma vitória de Milei em outubro.

Se confirmada, os analistas do banco americano acreditam que “os mercados financeiros locais devem permanecer sob pressão e outra considerável desvalorização do peso se materializaria, apesar de ser improvável que a plataforma de Milei seja totalmente implementada”.

* Com informações da Bloomberg e agência Estado

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