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BlackRock: não estar investindo pode ser mais arriscado do que estar

Diretora de uma das maiores gestoras de ativos do mundo acredita que é preciso mostrar para o investidor que há boas opções num cenário turbulento

Paula Salamonde diretora da BlackRock

Conseguir mostrar para o investidor iniciante as vantagens de aplicar parte de seus recursos em Renda Variável é um dos maiores desafios de qualquer gestor de ações no Brasil. O cenário é ainda mais complexo para quem trabalha com produtos menos conhecidos no País, como é o caso dos ETFs. Essas três letras remetem aos Fundos de Investimento que aportam recursos em algum índice da bolsa de valores, como o Ibovespa, o S&P 500 e o IBRX

Para Paula Salamonde, que há mais de um ano lidera a área de produtos ETFs iShares da BlackRock do Brasil, esse desconhecimento pune os investidores, em especial os mais novatos, pois tira deles a possibilidade de obtenção de ganhos e construção de uma carteira diversificada de longo prazo. 

Diretora de clientes institucionais da gestora, Paula acredita que só a educação financeira de qualidade é capaz de encorajar o investidor pessoa física a fazer a migração do seu dinheiro com segurança para produtos mais rentáveis, adequados ao perfil de risco, com prazos e objetivos estudados. “Não investir é mais arriscado do que estar investindo”, sentencia.

Em entrevista ao portal Bora Investir, ela deixou suas impressões sobre os desafios de expandir o conceito de ETFs no Brasil, os novos fundos de índice lastreados em megatendências e a diferença entre os investidores pessoa física no Brasil e nos Estados Unidos:

B3:  Como você vê o recente crescimento da base de investidores em Bolsa no Brasil?

Paula Salamonde: A sociedade viveu, durante a pandemia, um período em que as taxas de juros estavam muito baixas no mercado brasileiro. Nesse contexto, vimos uma grande quantidade de novos CPFs que abriram contas para começar a negociar na B3 e acessar esse mercado. O fato é que a maré virou novamente e, agora, estamos em um processo de mercados mais voláteis e com desafios macroeconômicos no mundo todo. O Brasil foi o primeiro a subir as taxas de juros e vemos agora uma tendência global de políticas mais restritivas. 

B3: Como o atual cenário, de altas de juros na maior parte do mundo, impacta Renda Variável?

Paula: Os juros altos levam o investidor a buscar mercados menos incertos, com exposição a produtos de menor volatilidade. O brasileiro prefere ainda mais esse caminho, dada a uma questão histórica, de uma Selic sempre elevada, evitando um mercado de incertezas. Em períodos como esse, a busca se dá pelos investimentos em Renda Fixa, como a caderneta de poupança, fundos ligados ao CDI ou produtos bancários como os CDBs.

B3: O que pode estimular esse investidor a diversificar suas aplicações?

Paula: O que falta é o investidor entender que existem outros tipos de instrumentos e investimentos que também são interessantes neste período de volatilidade. Eles podem complementar e diversificar o portfólio. Eu sempre falo que não estar investido pode ser mais arriscado do que estar. Para explicar o porquê dessa fala, trago um estudo que fizemos na BlackRock, que vale para todos os mercados. Se a pessoa deixar de ficar investido nos cinco maiores pregões ao longo de dez anos, ela perderá mais da metade da rentabilidade de seu portfólio. 

B3: De que forma os investidores profissionais podem orientar os mais novatos?

Paula: Nosso papel é de educar o mercado no Brasil. É trazer cada vez mais informação ao investidor para que ele tenha um instrumental mais amplo nas suas decisões. Por uma questão cultural, talvez ele esteja olhando um tipo de produto financeiro para uma solução pontual do seu investimento. Precisamos mostrar que há outras opções que funcionam também em momentos diferentes do mercado, desde que haja uma visão de futuro. 

B3: Qual o tamanho do mercado de ETFs hoje no Brasil?

Paula: Ainda é relativamente novo e muito pequeno. Ele representa apenas 0,5% da indústria total de fundo mútuo no país. É um segmento muito recente e, muitas vezes, os produtos de ETF não são nem sequer conhecidos pelo investidor final. Primeiro, temos de começar pela educação sobre o que é o produto e qual sua vantagem em vista de outros que o investidor tem acesso. Depois, lembrar que um produto complementa o outro. A gente precisa começar esse processo, de ensinar os investidores em geral.

B3: Como é possível fazer isso?

Paula: Mostrando que o ETF nada mais é do que o fundo de índice, uma cesta, uma estratégia que está seguindo um índice determinado – e que ele tem o acesso a essa cesta por meio de um produto negociado em bolsa. Então, ele terá toda a vantagem da liquidez do acesso, da transparência e do custo extremamente vantajoso. Os ETFs são muito mais baratos do que um fundo mútuo quando se trata de investimentos, o que os torna mais democráticos.

B3: Qual a importância do produto ETF para a BlackRock?

Paula: Somos a maior em ativos sob gerenciamento, com 9 trilhões de dólares em carteira. Cerca de 60% dos ativos estão ligados a produtos indexados. Entramos no mercado brasileiro em 2008. Não fomos o primeiro ETF, mas hoje somos detentores do maior e o mais conhecido fundo de índice no mercado, que é o BOVA11, referenciado no Ibovespa B3. Desde então, lançamos vários outros.

Enquanto o Brasil detém 0,5% da indústria, nos EUA, que é o maior mercado de ETF no mundo, os ETFs representam 26% dos investimentos.

B3: Qual estratégia da BlackRock com a oferta de ETFs para o Brasil?

Paula: Começamos a trazer produtos ao investidor brasileiro, todos listados na B3, para ele poder se expor ao mercado internacional. Basta a pessoa ter uma conta em uma corretora para acessar esses investimentos. Hoje já temos BDRs de ETF, por exemplo. Começamos no final de 2020 e atualmente estamos com 100 produtos ligados a essa estratégia, que dá acesso a diferentes mercados, regiões, setores e temas que, até então, não estavam disponíveis no mercado local. Com esses produtos, é possível acessar ativos nas áreas de saúde com uma variedade maior que o número de empresas listadas na bolsa. Ou mesmo investir no setor de terminologia disruptiva, já que praticamente não existe nenhuma empresa de capital aberto com esse perfil no Brasil. Esse é o caso das megatendências. 

B3:  Megatendências?

Paula: São tendências que capturam temas que irão impactar a nossa forma de viver.  Em outras palavras, são megatendências que irão e já estão impactando nossa maneira de consumir, trabalhar e de se locomover e que vão moldar o futuro. Há cinco temas que usamos para nos referenciar: mudanças climáticas, transformações demográficas e sociais, mudanças de poder econômico, rápida urbanização e avanços tecnológicos. A primeira já é vista pela crise energética causada pela guerra entre a Ucrânia e a Rússia. Vemos como a dependência do gasoduto tem impactado negativamente a economia da Alemanha, o que traz luz à necessidade de haver formas de energia renovável, maior diversificação da malha energética. Detectamos, também, que as pessoas estão vivendo mais. O que implica a necessidade de mais saúde e de empresas com tecnologias ligadas ao envelhecimento, que nos permita viver melhor.

B3: Para aproveitar essas tendências, quais produtos a gestora já lançou? 

Paula: Lançamos BDRs de ETFs que seguem essas estratégias. Hoje nós disponibilizamos 9 produtos ao investidor local qualificado – para pessoa física ou jurídica que excedam R$ 1 milhão. No lançamento, foram 6 BDRs lastreados em ETFs iShares de renda variável listados em bolsas norte-americanas. As novidades são as megatendências em infraestrutura nos Estados Unidos (iShares U.S. InfrastructureETF) e tecnologia, como cibersegurança (iSharesCybersecurity and Tech ETF), robótica e inteligência artificial (iShares Robotics and Artificial IntelligenceMultisector ETF) e veículos autônomos (iSharesSelf-Driving EV and Tech ETF).

B3:  E há outras novidades e lançamentos a caminho?

Paula: Continuaremos a trazer mais produtos de exposição global. Neste ano, apresentamos uma classe nova de ETFs, na renda fixa global. Já temos 8 BDRs de ETFs de renda fixa, listados na B3, que dão acesso à taxa de juros do governo americano. Em breve essa família vai se estender com novas opções ao investidor. Nossa missão é continuar justamente diversificando e trazendo mais produtos inovadores para cá. Estamos sempre olhando para estratégias que permitam aos nossos clientes investir melhor, via BDRs de ETFs ou ETFs locais brasileiros. 

B3: A indústria de investimentos americana é extremamente sofisticada. Qual o apetite dos investidores de lá por ETFs? 

Paula: Enquanto o Brasil detém 0,5% da indústria, nos EUA, que é o maior mercado de ETF no mundo, os ETFs representam 26% dos investimentos. Lá, esses produtos crescem mais que o dobro da indústria de fundos mútuos. Historicamente, o investidor americano está mais acostumado a investir via bolsa em comparação com o Brasil. Por aqui, o investimento começou a ser feito por meio de produtos bancários, pela renda fixa, devido àquela questão histórica, das altas taxas de juros e inflação. Mas o cenário tem mudado e feito com que o investidor brasileiro se movimente. 

B3: É possível criar uma carteira com diversos ETFs?

Paula: A gente sempre pensa que os ETFs são passivos, mas não são. É plausível combinar vários fundos de índices no seu portfólio, tornando-se, assim, uma carteira ativa. O investidor pode decidir manter um ETF dos EUA ou da Europa na carteira, e isso é o exemplo de uma decisão ativa. Há, inclusive, muitos agentes autônomos americanos que usam esses produtos como forma de construir carteiras diversificadas para recomendar aos clientes. Foram esses fatores que aumentaram, e muito, o tamanho desse produto na indústria de investimentos norte-americana.

B3:  O ETF pode ser visto como uma porta de entrada para quem quer investir nos EUA? 

Paula: Absolutamente. Como o investidor iniciante ainda não tem uma visão dos ativos do país, ele pode comprar o fundo mútuo ou um ETF de exposição ampla ao mercado sem um viés específico, como é o caso do BDR de ETF do S&P500 local. Com ele, é possível comprar o mercado americano como um todo, sem necessariamente realizar um posicionamento de um setor ao outro. É uma boa iniciação ao mercado a um custo muito baixo. 

B3: Como vê o aumento da participação das mulheres no segmento de Finanças? 

Paula: Quando eu comecei no mercado, lá pelos meus 20 e poucos anos, era muito normal eu entrar em uma sala de reuniões onde só havia homens. Isso nunca me incomodou, para falar a verdade, pois nunca senti diferença no modo de as pessoas me tratarem. Sempre fui muito respeitada, aliás. Mas hoje, certamente, a gente vê mais mulheres na área, até mesmo na BlackRock, que é formada por um time onde mais da metade das profissionais são mulheres. Isso é muito bacana.

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